Entrevista – Estágio 1
Fábio
Cezimbra Rubo
Lionara
Fusari Professora-tutora externa
Centro
Universitário Leonardo Da Vinci – UNIASSELVI
Licenciatura
em Filosofia (Curso FILO033)
Entrevistado: Professor Daniel Adams Boeira
Entrevistador: Fábio Cezimbra Rubo
1-
Ao
lecionar, quais as principais distinções entre as turmas diurnas e noturnas que
o Sr. Professor observa?
Observo que os alunos e turmas do diurno tem
comportamentos mais infantis, porém tem mais capacidade de concentração e
registram melhor os conteúdos, e que os alunos do noturno estão mais cansados, tem
dificuldade de concentração e tem mais dificuldade para registrar os conteúdos,
que, assim, o tempo de hora aula no noturno é mais reduzido, mas que a
maturidade dos alunos do noturno não é suficiente para compensar este tempo
mais reduzido. Também é importante observar que no noturno alguns alunos
encontram-se em defasagem idade série e que outros ficaram algum tempo
afastados da escola. Porém no noturno também temos alunos/alunas adultos e que
dão muita importância ao resultado escolar e ao avanço nos estudos para suas
vidas, sobrevivência, empregabilidade e renda. Porém, ainda existem alunos que
procuram o noturno, não porque trabalham ou precisam, mas porque acreditam que
será mais fácil estudar e as exigências serão menores, o que não é o caso. Por
fim, devo dizer que algumas destas distinções vão se dissolvendo ao longo de
três anos com os alunos, ocorrendo no ensino médio na maior parte dos casos um
maior amadurecimento, uma socialização maior e também a superação destas
dificuldades com apoio dos professores e disposição e boa vontade dos
alunos/alunas.
2-
As
aulas do turno noturno têm preparação e dinâmica diferenciadas do turno diurno?
O que eu faço de diferenciado no noturno é
ser um pouco menos expositivo e resumir mais o conteúdo. Minhas dinâmicas
seguem ainda um mesmo padrão procurando acentuar uma base conceitual, uma
explicação temática com exposição e problematização do conteúdo e abrindo links
da matéria com a realidade atual ou conteúdos de outras disciplinas. Tento
amparar as aulas nos dois casos com leitura e interpretação de textos
didáticos. E cuido muito para inserir cada aula no plano de estudos estabelecendo
as relações do conteúdo especifico com o plano geral e explicitando os
objetivos.
3-
O
que a aprendizagem de Filosofia pode trazer de significativo aos alunos para o
aprendizado das demais disciplinas do currículo escolar?
O que é siginificativo para mim é aquilo que
pode ser parte de um mesmo universo de linguagem e de uma determinada prática
social. Tenho evoluído, ao longo do tempo em que leciono desde 1995, de uma
interpretação e avaliação deste aspecto mais externalista que considera a
disciplina de filosofia como mais um conteúdo ou capital cultural separado, para
uma abordagem mais internalista que a considera altamente vinculada e conectada
com as demais disciplinas. Hoje creio que a filosofia deve ser ensinada como
uma espécie de subterrâneo ou paralelo conectado com a história e o
desenvolvimento dos demais ramos do conhecimento, da ciência, da cultura e das
práticas sociais. Tendo a ensinar filosofia no tempo e e no seu contexto de
produção. Por conta disto leciono com um fio condutor histórico e conectado com
as demais disciplinas de ciências humanas com temas comuns sob enfoques
próprios. Sem querer extrapolar ou supervalorizar nossa disciplina, mas cada
dia me convenço mais de que ela pode auxiliar a organizar, problematizar e
gerar entendimento da história das ciências e da história humana, cumprindo um
papel complementar e integrador de oferecer certo estoque e acervo especifico
para os demais ramos do conhecimento ou áreas em diálogo com as questões atuais
e do cotidiano atual.
4-
O
que a aprendizagem de Filosofia influencia em geral no cotidiano prático dos
alunos?
Em cada alunos esta influencia deve ser
diferenciada dado seu acervo cultural e suas condições existenciais atuais, mas
imagino que deva contribuir para a aquisição e aplicação de determinadas
distinções conceituais, gerar reflexão crítica sobre a existência, o trabalho e
suas relações com os demais seres humanos, sendo estas de compromisso ou
circunstanciais, e que também deve gerar uma certa compreensão ou
esclarecimento sobre as diferenças e os desafios sociais, materiais, econômicos
e políticos de cada aluno em suas comunidades e na sociedade. Eu resumiria
todos os ganhos possíveis em três palavras: compreensão, reflexão e crítica. E
que isto se aplica aos desafios e à busca de soluções a eles na vida cotidiana
e prática dos alunos.
5-
O
Sr. Professor poderia nos dar um exemplo prático desta influência contando o
caso de algum aluno específico seu? (sem citar nomes)
Eu te diria que os exemplos são abundantes,
porque tenho alunos/alunas e ex-alunos/alunas que cumprem diversos papéis
sociais diferenciados. E creio que parte de minha influencia mais forte sobre
eles esteja ligada muito ao estimulo ao seu engajamento sério e comprometido em
questões sociais e em cumprir algum papel social. Em alguns casos isso envolve
luta social e disputa em debates em outros envolve exercer alguma capacidade de
organização e reflexão em sociedade. Muitos ex-alunos/alunas meus e de meus
colegas são profissionais bem sucedidos, comprometidos, disciplinados e
responsáveis criticamente em suas atividades pessoais, profissionais e cidadãs.
Tenho ex-alunos/alunas que são também professores hoje e que me orgulham muito
e também uma expressiva parcela deles tenho reencontrado com muita gratidão e
reciprocidade. Observo na maior parte dos que reecontro um espírito muito humano,
justo e compreensivo que se destaca na forma em que eles se conduzem e tratam
os próximos e também as situações da vida. Porém, devo dizer que tributo isto a
um resultado coletivo do nosso trabalho coletivo de professores e portanto de
outras disciplinas na escola que reforçam estas dimensões e aspectos nos
alunos/alunas durante sua formação. Assim, vejo hoje com muita clareza meu
papel de formador compartilhado com os demais professores, equipe diretiva,
equipe de apoio e servidores dos setores na escola que contribuem para
isto.
6- Quais as principais transformações o Sr.
Professor poderia elencar das suas primeiras aulas como recém formando para as suas
aulas ministradas nos dias de hoje?
Eu tinha uma metodologia de ensino
conteudista e muito planejada e voltada para ensino de conteúdo e que
supervalorizava a importância da disciplina no currículo e avaliava com
excessivo rigor os alunos. Hoje tendo a ser mais relacional e cognitivo em
relação aos alunos e a relativizar com tranquilidade a importância da minha
disciplina e entendo também com tranquilidade a hierarquia diversa ou adversa
de prioridades e disciplinas na aprendizagem dos alunos e suas dificuldades de
apreensão e compreensão. Tento também abrir meu conteúdo para temas mais típicos
da adolescência como escolhas profissionais e de vida, questões sobre
afetividade e relações humanas, compreensão de diferenças culturais, religiosas
e políticas e, também, sobre os desafios de aprendermos a mudar nossas formas
de lidar com sofrimento psíquico e social.
7-
A
escola apresenta um peculiar sistema onde os professores têm salas fixas e os
alunos encaminham-se para as mesmas a cada troca de período. Por que razão este
sistema foi adotado? E quais os resultados observados desta nova dinâmica?
Esta dinâmica de Salas Temáticas foi proposta
para promover certa movimentação física nos alunos, se deslocando e se
movimentando de uma sala para outra e combatendo assim o sedentarismo e dando
espaço para que os alunos mais inquietos se movimentem no ambiente escolar e
também para promover um espaço e um ambiente próprio e singularizado para as
disciplinas primeiramente e ultimamente as áreas. Eu creio que os resultados
são ótimos porque também promoveram integração maior entre os alunos/alunas e,
ao mesmo, tempo a qualificação e maior apropriação dos espaços escolares pelos
educadores promovendo organizações próprias das classes em sala de aula e a
inclusão elementos equipamentos próprios as disciplinas nestas salas. Para mim,
em especial, acabou gerando um cuidado maior e um zelo maior com limpeza e organização do meu espaço de
trabalho, dando também certa ênfase às questões e condições físicas e materiais
do ensino e do meu trabalho.
8-
O
que a Filosofia representa na sua vida prática e quanto disso o Sr. Professor
tenta passar para seus alunos?
Na minha vida prática ela representa uma
espécie de ordem de reflexão e compreensão sobre a vida que expresso em
palavras e que vou elaborando ao longo de vivencias e experiências de todo
tipo. E praticamente transmito isto sistemática e organizadamente aos alunos.
Ao longo da minha carreira ocorreu uma espécie de implicação entre vida
teórica, cognitiva e cultural e vida prática, sensível e social. Então ocorre
que muitas vezes minhas vivências subjetivas e de investigação e reflexão
filosófica se relacionam diretamente com minhas experiências, ocorrendo uma
alimentação reciproca do um universo pessoal com meu aparente universo
profissional. De certa forma não há uma fronteira entre minha vida pessoal e
profissional no sentido que sou a mesma pessoa nos dois ambientes e que há
conexões profundas entre ambos. Adoto um tom confessional e pessoalizado,
contando a minha história de vida e do meu encontro com a filosofia e as
questões filosóficas ou outras mostrando este desenvolvimento ligado a uma vida
real.
9-
Nesses
bons anos de magistério, quais valiosas lições o Sr. Professor obteve de seus
alunos?
Parte fundamental do trabalho de um professor
é conhecer a si mesmo, a outra parte é conhecer os alunos e é a partir deste
esforço consciente, paciente e reflexivo que se consegue trabalhar com algum
tipo de conhecimento e produzir alguma forma de aprendizagem e reflexão
filosófica e histórica com eles. Educar é um processo, nunca estamos prontos, sempre
podemos aprender mais e isso depende de nossa boa vontade e de nossa
disposição. Quando os tempos são favoráveis isto acontece quase ao natural, mas
quando as coisas estão difíceis isso é uma exigência indispensável. E não há
problema que não possa ser resolvido ou reduzido com tranquilidade, disposição
e dedicação. Vamos enfrentar dificuldades, podemos errar e ver outros errarem,
mas não podemos desistir. Um dia, (num texto meu cujo título é Como vai a vida
professor? Esta o resultado disto), após diversas tribulações e dificuldades e
em diálogo com meus colegas e alunos/alunas conclui que era muito mais saudável
encarar certas coisas de certa forma. E, então, muito por força das interações
com eles, conclui que a roda de Sísifo do professor é desistir de desistir
todos os dias e a todo momento que algo não sai ou não está como preferiríamos,
desejamos ou gostaríamos e que assim nos tornamos os professores que os alunos
querem e precisam. Isto tem sido reforçado em mim a cada dia que passa...
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