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sábado, 30 de agosto de 2014

SOBRE OS SONETOS E OS POEMAS DE SHAKESPEARE: O AMOR É UMA LOUCURA

 - minha resposta alongada a um comentário gentil sobre as traduções do soneto 116 que publiquei aqui - e uma amenidade com carinho aos amigos e amigas

Todos os sonetos de Shakespeare tem algo maravilhoso e genial. Eu fico encantado com tudo neles, com a rima, a métrica, a escolha das palavras pelo autor e pelo autores das traduções as expressões coloquiais e as invencionices e analogias, ironias e finesses dos ataques ao coração do leitor e da leitora por parte de Shakespeare. Me emociono mesmo lendo eles e para ser mais rigoroso recitando eles que é como eu creio que toda poesia deve ser lida de modo a lidar com a musicalidade e a sua grande magia.

Já falei neste blog da minha descoberta e experiência mágica com os Sonetos numa certa temporada de verão no inicio dos anos 90 em Florianópolis, na casa de minha amiga Suzi Biazus me dei lá ao trabalho de começar a ler um exemplar bilíngüe deles e cabei por ficar brincando entre amigos - e em meio a feitura de um memorável carreteiro -  com a tradução e a partir daquela data até hoje sempre dou uma espiadinha  aqui e  ali e não resisto a uma obra dele na estante de qualquer livraria. Procuro até hoje aquela edição  da Ediouro de bolso, mas não achei ainda.

Não escuto ou leio, porém, muita gente falando dos sonetos de Shakespeare e creio que com eles – encobertos pelas peças teatrais - acontece algo semelhante às crônicas de Machado de Assis que são encobertas pelas suas demais obras de fôlego.

  Na semana antepassada, para ser mais exato a dez dias – em 19 de agosto - adquiri Vênus e Adônis numa edição luxuosa da Leya, tradução por Alípio Correia de Franca Neto e me surpreendi também pela qualidade de mais isso que me cativa. O cara era genial e fiz a experiência de recitar três sextilhas para dois alunos interessados em sala de aula no noturno e o impacto foi preciso. Assisti os olhos espantados dos alunos ouvindo aquilo e se admirando de um professor de filosofia que ama a poesia com mesma paixão que ama a verdade e a busca da sabedoria e da felicidade.

Depois da postagem aqui e do comentário sobre o 116 fiquei pensando nele e em Homero. Queria também dizer que este soneto é uma espécie de leitmotiv para o meu texto no meu blog - cheio de imperfeições, mas para debate - sobre Atração Física e Mental. E confessar que sou um filósofo que olha para o amor como uma grande desafio à reflexão.  Vejam duas sextilhas (349-355):

“Quando ele senta, eis que ela já é vinda
E como amante humilde cai de joelhos;
Com a bela mão o boné agora o eleva (guinda)
A outra acarinha meiga o rosto dele, e o
        Seu rosto a aceita, se imprimindo fraca
        Tão fácil quanto a neve caindo, a marca.
Oh, como os olhos deles travam duelos,
Os dela aos dele suplicando forte,
Os dele os vendo como que sem vê-los;
Os dela em corte, os deles frios à corte;
        E atos de um drama mudo aclaram o choro
        Que os olhos dela chovem como um coro” (pp.85-87)


Chovem como um coro deve ser algo muito afinado e um amor assim não pode ser desprezado.

Vou terminar com uma linha de comentário do tradutor de Vênus e Adônis (Leya Editores). A Deusa Vênus tenta com todas as suas forças conquistar o belo Adônis que resiste bravamente e o poema que nos aponta como este jogo de resistência e indiferença é um tema desafio à pena do autor e ao mesmo tempo uma lição a um tema de nossa vida.  O Gênio de Shakespeare "não faz menos do que sondar a loucura dos que amam e a loucura ainda maior do que se recusam a fazê-lo". Tá né, agora só o que falta é isso para pensar na loucura da recusa ao amor. No caso de Adônis levou ao azar...e não vou dar spoiler aqui.

Para fechar me comentário vou frasear um pouco sobre isto, para pensar mais depois e além de hoje. 

Fiquei pensando no que seria de mim se tivesse uma expressão como esta para cada um dos amores conquistados e recusados da minha adolescência e conclui que isso sim seria sim uma grande loucura. Considerei esta chave uma espécie de arma secreta que deve ser bem guardada para evitar seu mau uso e aplicação indevida. Afinal, não se deve seduzir quem não se ama, nem conquistar alguém para quem não queremos dar nosso pleno amor, mas somente se oferece e se dão migalhas de nosso carinho, atenção e afetos. Pois veja bem, ser capaz de encurralar minha amada e minha conquista em tal encruzilhada e dilema: ama loucamente ou enlouquece sozinha, seria uma imperdoável perversidade.

Mas que há talvez, enfim, um pequeno caso ou um único caos em que isso é perdoável e compreensível, isto é, aquele em que se ama de forma tão reveladora que não se consegue fugir, negacear ou arengar. E aqui cabe meu modelo de atração completa de uma alma por outra – com todo erro categorial que alguém queira atribuir – e tal paixão que move o corpo e o espírito é irresistível e definitivamente inesquecível.


E devo confessar – com uma gota última de tinta, sem nenhuma lágrima - que creio que uma loucura compartilhada, como já dizia John Lennon em relação à um sonho compartilhado - Sonho que se sonha junto é realidade - ganha realidade e, portanto, deixa de ser loucura. Mas ninguém há de saber o que perdeu nem o que seria, apesar de alguns considerarem muita fortuna o que perderam e grande virtude resistir às flechas do arqueiro. 

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