- minha resposta alongada a um comentário
gentil sobre as traduções do soneto 116 que publiquei aqui - e uma amenidade
com carinho aos amigos e amigas
Todos os sonetos de Shakespeare
tem algo maravilhoso e genial. Eu fico encantado com tudo neles, com a rima, a
métrica, a escolha das palavras pelo autor e pelo autores das traduções as
expressões coloquiais e as invencionices e analogias, ironias e finesses dos
ataques ao coração do leitor e da leitora por parte de Shakespeare. Me emociono
mesmo lendo eles e para ser mais rigoroso recitando eles que é como eu creio
que toda poesia deve ser lida de modo a lidar com a musicalidade e a sua grande
magia.
Já falei neste blog da minha descoberta
e experiência mágica com os Sonetos numa certa temporada de verão no inicio dos
anos 90 em Florianópolis, na casa de minha amiga Suzi Biazus me dei lá ao
trabalho de começar a ler um exemplar bilíngüe deles e cabei por ficar
brincando entre amigos - e em meio a feitura de um memorável carreteiro - com a tradução e a partir daquela data até
hoje sempre dou uma espiadinha aqui e ali e não resisto a uma obra dele na estante
de qualquer livraria. Procuro até hoje aquela edição da Ediouro de bolso, mas não achei ainda.
Não escuto ou leio, porém, muita
gente falando dos sonetos de Shakespeare e creio que com eles – encobertos pelas
peças teatrais - acontece algo semelhante às crônicas de Machado de Assis que
são encobertas pelas suas demais obras de fôlego.
Na semana
antepassada, para ser mais exato a dez dias – em 19 de agosto - adquiri Vênus e
Adônis numa edição luxuosa da Leya, tradução por Alípio Correia de Franca Neto e
me surpreendi também pela qualidade de mais isso que me cativa. O cara era
genial e fiz a experiência de recitar três sextilhas para dois alunos
interessados em sala de aula no noturno e o impacto foi preciso. Assisti os
olhos espantados dos alunos ouvindo aquilo e se admirando de um professor de
filosofia que ama a poesia com mesma paixão que ama a verdade e a busca da sabedoria
e da felicidade.
Depois da postagem aqui e do comentário
sobre o 116 fiquei pensando nele e em Homero. Queria também dizer que este
soneto é uma espécie de leitmotiv para o meu texto no meu blog - cheio de
imperfeições, mas para debate - sobre Atração Física e Mental. E confessar que
sou um filósofo que olha para o amor como uma grande desafio à reflexão. Vejam duas sextilhas (349-355):
“Quando ele senta, eis que ela já
é vinda
E como amante humilde cai de
joelhos;
Com a bela mão o boné agora o eleva
(guinda)
A outra acarinha meiga o rosto
dele, e o
Seu
rosto a aceita, se imprimindo fraca
Tão
fácil quanto a neve caindo, a marca.
Oh, como os olhos deles travam
duelos,
Os dela aos dele suplicando
forte,
Os dele os vendo como que sem
vê-los;
Os dela em corte, os deles frios à
corte;
E
atos de um drama mudo aclaram o choro
Que
os olhos dela chovem como um coro” (pp.85-87)
Chovem como um coro deve ser algo
muito afinado e um amor assim não pode ser desprezado.
Vou terminar com uma linha de
comentário do tradutor de Vênus e Adônis (Leya Editores). A Deusa Vênus tenta com
todas as suas forças conquistar o belo Adônis que resiste bravamente e o poema que
nos aponta como este jogo de resistência e indiferença é um tema desafio à pena
do autor e ao mesmo tempo uma lição a um tema de nossa vida. O Gênio de Shakespeare "não faz menos do
que sondar a loucura dos que amam e a loucura ainda maior do que se recusam a
fazê-lo". Tá né, agora só o que falta é isso para pensar na loucura da
recusa ao amor. No caso de Adônis levou ao azar...e não vou dar spoiler aqui.
Para fechar me comentário vou
frasear um pouco sobre isto, para pensar mais depois e além de hoje.
Fiquei pensando no que seria de mim se tivesse
uma expressão como esta para cada um dos amores conquistados e recusados da minha
adolescência e conclui que isso sim seria sim uma grande loucura. Considerei
esta chave uma espécie de arma secreta que deve ser bem guardada para evitar
seu mau uso e aplicação indevida. Afinal, não se deve seduzir quem não se ama,
nem conquistar alguém para quem não queremos dar nosso pleno amor, mas somente se
oferece e se dão migalhas de nosso carinho, atenção e afetos. Pois veja bem,
ser capaz de encurralar minha amada e minha conquista em tal encruzilhada e
dilema: ama loucamente ou enlouquece sozinha, seria uma imperdoável perversidade.
Mas que há talvez, enfim, um
pequeno caso ou um único caos em que isso é perdoável e compreensível, isto é,
aquele em que se ama de forma tão reveladora que não se consegue fugir,
negacear ou arengar. E aqui cabe meu modelo de atração completa de uma alma por
outra – com todo erro categorial que alguém queira atribuir – e tal paixão que
move o corpo e o espírito é irresistível e definitivamente inesquecível.
E devo confessar – com uma gota
última de tinta, sem nenhuma lágrima - que creio que uma loucura compartilhada,
como já dizia John Lennon em relação à um sonho compartilhado - Sonho que se sonha junto é realidade - ganha realidade e,
portanto, deixa de ser loucura. Mas ninguém há de saber o que perdeu nem o que
seria, apesar de alguns considerarem muita fortuna o que perderam e grande
virtude resistir às flechas do arqueiro.
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