Sócrates foi condenado pelos atenienses em segunda
votação e por ampla maioria, a qual foi aumentada, após suas argumentações e esclarecimentos aos seus algozes em sua própria defesa. Platão deixou estes argumentos relatados na Apologia de Sócrates. Condenado a ingerir
cicuta e morrer por acusações de impiedade, ele reagiu muito bem até o final, com altivez, não se deixou quebrantar pelos adversários e acusadores, e teve completo desassombro perante a morte e as ameaças de seus inimigos durante toda a sua vida. Ao contrário de outros,
em sua defesa não pediu nada, praticamente não se defendeu, pis a coisa mais próximade um pedido foi sugerir que sua pena fosse uma indenização de 30 Dracmas - uma mixaria em moedas da época, Ele passou a atacar a falta
de escrúpulos e os absurdos de seus acusadores de uma forma até impressionante para qualquer advogado que zela por argumentos convincentes e convenientes. Provavelmente já sabia que a causa era perdida e pensava simplesmente em deixar claras as coisas, Assim, não pedia qualquer regalia e reagia com
muita coragem. Enfrentou argumentando serenamente até o final seus algozes, sem
nenhum temor ou tremor, nem pela morte, nem por qualquer outra pena. Seus discípulos
sofriam e ele os acalentava lembrando a longa vida que tinha vivido. 71 anos, afinal, era bastante tempo. Defendeu a
obrigação de refletir sempre e de agir de forma reta nesta vida, defendendo a
verdade acima de tudo. Dizia que uma vida sem reflexão não valia a pena ser vivida. Não temia
a morte porque julgava que nada pior poderia lhe sobrevir depois de tudo que havia vivido.
Corria o ano de 399 a. C. e segundo
alguns dos autores, era o mês que corresponde ao nosso mês de janeiro. Naquela
época, por mais diversas que fossem as coisas, me parece razoável supor que
poderíamos dividir a audiência do julgamento entre dois grupos: aqueles que
compreendiam tudo que Sócrates dizia e que ou bem não aceitavam ou bem
aceitavam seus argumentos e aqueles que não entendiam nada do que ele dizia. Ainda
que possamos julgar aquele julgamento como revestido de um grande teor de
retaliação, vingança e perseguição política, o que deveria ser um elemento que
fechava os ouvidos a argumentos sensatos e impedia qualquer possibilidade de
entendimento, há que se imaginar que deveria ser uma ato de muita audácia matar
aquele homem. E que somente um poder superior a razão era capaz de fazê-lo e
foi o que se deu. Suponho que o juízo condenatório se afastava tanto do logos
que ninguém foi capaz de escrever um diálogo sequer louvando tal racionalidade,
tal acribia argumentativa. A história se fez diferente neste e em outros casos,
sabemos mais das qualidades do réu, das qualidades da vítima e não há uma legenda
decente sequer para os seus algozes, carrascos, acusadores e inimigos.
Me parece inviável realizar ou
fazer um censo dos analfabetos funcionais ou dos seres efetivamente raciocinantes gregos
daquele período, para determinar qual o perfil dos votantes que o julgaram e condenaram,
mas a gente pode supor sim que ele foi morto em especial por aqueles que entendiam
perfeitamente o que ele dizia e pensava, mas não concordavam com ele e que estes
votos foram somados aos sufrágios daqueles que não o compreendiam mesmo sendo
aqueles que o compreendiam e que constituíam uma pequena minoria resistente e
principalmente constituída por seus discípulos e homens comuns de sua jaez.
Entretanto, a votação não foi
algo tão notável assim. Votaram no julgamento 501 cidadãos atenienses, destes
281 votaram pela condenação em 220 foram contrários. Ou seja, 56% dos cidadãos atenienses
julgaram Sócrates culpado das acusações e aceitaram a pena proposta pelo
acusador. É algo para se pensar ai...que cada um pense mais em justiça, em democracia
e na força das opiniões e na força dos hábitos. Talvez as profundas convicções de
alguns sejam somente mais uma injustiça entre tantas da história deste mundo.
Enquanto for possível pensar diferente, nós vamos argumentar...
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