...Por que, na primeira vez,
Zaratustra fica zangado e tem um pesadelo tão terrível, quando o anão diz que
"toda verdade é curva, o próprio tempo é um círculo"? Ele explicará
isto mais tarde, interpretando seu pesadelo ele teme que o eterno retorno
signifique o retorno do Todo, do Mesmo e do Semelhante, nele compreendido o
anão, nele compreendido o menor dos homens....DIFERENÇA E REPETIÇÃO DE DELLEUZE
DA PEQUENA DIFERENÇA - Um dos
livros que mais me atraiam nos tempos de formação. Minha primeira visão dele
foi tão nebulosa que eu julgava que ia me perder em suas páginas. Passados 27
anos daquele volume em Francês da PUF que me assustava também já na capa e no
índice, tomo ele nas mãos feliz com sua síntese. Hoje não tenho mais nenhum
medo do desconhecido, não creio mais que sei se a síntese será negativa ou
positiva a priori, não me vejo mais como precisando ser detentor de todos os
conceitos para poder pensar, julgar, interpretar e decidir a minha vida. Já
aposto bem mais na diferença e me distancio cada vez mais da repetição
neurótica ou paranóica do mesmo conceito ou da mesma lógica. Os fantasmas não
voltam mais comigo perto e nem as sombras ficam sem a luz que as supera. O que
é vazio de um sentido superior e o que é por sua própria natureza não
interpretada, sem significado não me preocupam mais. Não tenho mais medo do
escuro, não tenho mais medo dos riscos do pensar corajoso. Não escrevo e nem
penso mais com raiva, ódio, aflição ou angústia. Ainda que vejo o outro como
existente, ainda desconfio de que nele só há representação. Fico olhando sem
acreditar em sua existência, nem em suas razões que anulam seu ser. Olho para o
rosto em pânico e com medo e percebo que a insegurança quase atávica faz tudo
se repetir e o anão retornar porque lhe dá abrigo uma consciência insegura,
temerária e que só resolve pela via negativa seus dilemas., Toda vez que se v~e
confuso foge de si e do seu desejo. Quebra a cara mais por medo e por uma
fantasia dolorosa e perniciosa do que por alguma fatalidade. E vai assim para
continuar seguindo no resto da vida sem nenhuma síntese positiva possível. Toda
dialética sucumbe justamente nisto: na representação, na diferença entre o
representado e a representação. Você não tem acesso ao outro, não compreende o
outro e sua singularidade te desafia. E você não consegue aceitar a tal coisa
em si determinada completamente por outra vontade. Sim já senti tudo isto. E
interpretar o mundo não poderá ser jamais projetar a mesma imagem que já se viu
antes num novo quadro. As cópias, as máscaras, as dissimulações e semelhanças
nos afastam da verdade, operam com o fugas e totens da perda e o que é singular
deixa de ser compreendido com justiça porque o tomamos como mais um exemplo de
um conceito ultrapassado e que não tem mais uso. Se não se pode ser feliz
sozinho, também não se pode ser feliz junto, porque ser feliz é uma decisão
singular com a qual só podemos nos encontrar se já a aceitamos em nós mesmos. A
diferença não aparece na repetição, porque se repete não será diferente. O amor
não é um espelho no qual olhamos para nós mesmos mais uma vez de novo. O amor é
a afirmação incontestável de um outro por isto ele se aproxima tanto de uma
negação. O reflexo que contraria a expectativa apresenta a indomável diferença.
A primeira vista ela parece menor, mas vista mais de perto ela começa a nos
assombrar, espantar e surpreender. Sim, é bem difícil suportar isto...pois o
que é complexo não aceita redução ou uma análise definitiva. E gostamos muito
de poder manter sobre controle, interpretar e delimitar tudo aquilo que temos à
nossa frente. Mas nos escapa...e isso traz a pequena diferença, ao detalhe sua
extrema grandiosidade.
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