"Julgo que, enfim, nos
ajudam a entender algo daquilo que nos dói nesta vida e algo perante o qual
erguemos grandes frustrações, mas o que realmente importa é que a gente entenda
isto como uma forma de vida e de dar sentido a vida, dentro de determinada
circunstância muito particular de ambos."
Estou falando ali em sentido da
vida, a partir de uma leitura minha sobre os dois filmes ON THE ROAD & INTO
THE WILD, eles ali são Jack Kerouac e Cristopher Maccandless, mas aquilo ali
vale para muitas outras personagens e pessoas que conheço. O que me impressiona
é também isso. Que há uma forma de vida que é determinada pelo conjunto de
crenças que as pessoas adotam.
Já não basta ao Bukowski ser
visto como estar dando uma de otimista...Não dá para pensar assim. Olha só...deves
ler de novo, porque o Buck na real está mandando a merda os covardes como
sempre faz.
Mas ele também é um covarde no
final. Porque sempre ficou escondido na toca dele. Apesar de encarar a vida
dele com a bravura conhecida e a ousadia e auto-ironia também conhecidas. Ele
ficou só na dele, só isso. E viveu bem mais do que muitos que se julgavam
expertos e fez sempre o que quis e teve um razoável sucesso como escritor ao
meu ver. Talvez a única exceção de falta relativa de liberdade para ele tenha
sido aquele período como carteiro em que tinha que ir para cá e para lá e tal.
Mas isso durou pouco.
Claro esta que ele é corajoso em
assumir um papel de maluco, selvagem ou rebelde em meio aquela “sociedade
normal” americana dos anos 50 e 60...Depois dos anos 70 eles passaram por uma
guinada tão grande que ele passou a ser visto com certa naturalidade e a ser mais uma figura
CULT, como outros.
Sobre o humor dele e teu sentimento de “mas ele é muito deprê” fico pensando em quem não seria com aquilo tudoem volta. Veja bem, imagina que o Kerouac morreu de cirrose aos 47
anos e o Bukovski é só um rabugento e alcoólatra que escrevia bem as vezes e
muito bem em outras vezes. É uma espécie de filósofo marginal, fora do
mainframe filosófico e tal.
Sobre o humor dele e teu sentimento de “mas ele é muito deprê” fico pensando em quem não seria com aquilo tudo
E como, aliás, todo alcoólatra é
rabugento isto se derrama para os textos dele e a vida dele.
Alguns julgam que Bukowski é o máximo
porque ele é meio que contrário ao sentido da vida. Ele, assim, não estaria nem
ai para vida, mas isso é um engano.
Ele não viveu só esperando a
morte.
Enquanto tinha tiradas de gênio,
porque tinha um gênio dentro daquela cachola ele vivia e fazia o que tava afim
de fazer.
Parece que ele só transou à
vontade e tal, mas isso também é parte de uma fantasia, ele fez a média de todo
e qualquer homem. Só que narrou parte de suas aventuras disso.
Bebeu à vontade e escreveu o que
quis e como quis e viveu durante um bom tempo muito bem disso. Assim, quando um
cara qualquer julga o Bukovski de forma leviana eu mando se enxergar. Pois a
pergunta é: quem é tu?
Alguém pode e deve ter notado que
sempre posto algo dele por aqui e ali e que compartilho coisas dele. Uma vez eu entrei
numa vibe e li tudo dele que encontrei pela frente. Nesse sentido, algumas
pessoas se enganam comigo e muito. Nunca fui careta, só sou sério, porque de
palhaço o mundo já tá cheio, como ele mesmo diria aliás.
Muito carinha metido à malandro
nem era nascido ainda. Nem as tintas das tatuagens que eles usam já haviam sido fabricadas...e a gente tava por ai....
Me vejo na real bem diferente de
Bukovski em certas e determinadas coisas, apesar de ter tido uma fase bem próxima dele através de seus livros.
Por exemplo, só para começar e
marcar bem esta minha diferença em relação a alguns junkies e drunkies, eu levo
bem mais à sério a sociedade e o mundo e ele, Bukovski, e outros são apenas uns
trânsfugas. Quer dizer, são caras que tão naquela linha de decreto absoluto de
que o mundo é isso e aquilo e daí não assumem mais nenhum compromisso com essa
coisa toda.
Parecem aqueles homenzinhos ou
mulherzinhas que tomaram um tufo e que decretam que não vão mais dar chance para
o mundo ou a mina ou o carinha. E a pior parte desta historinha é que a grande maioria destes caras não tomou, na
real, tufo nenhum. Olhando mais de perto vemos apenas pessoas mimadas ou super
obsessivas que ficam o tempo todo exigindo perfeição dos outros e etc. É uma
espécie de idealismo ingênuo, que na primeira frustração – mesmo que seja ela
toda culpa sua – decreta, então, que a humanidade toda está perdida,
exceptuando-se eles próprios, e que o amor é, por exemplo, impossível e ficam
prá titios ou outras opções que quiseres pensar...
Geralmente a gente lê muito
daquilo que ele escreve e se identifica, porque julga que ele é um desgraçado
como nós em certos aspectos. Gostaríamos todos que as coisas fossem melhores,
mas elas não são absolutamente muito melhores. E isso pode te levar a pensar de
forma errada, é claro, sobre esta vida. Pode te levar a julgar ela com muita
negatividade ou a registrar somente a dimensão negativa da vida, desta
experiência ou de algum tipo de vivencia qualquer.
Nós deveríamos ler de tudo, na
real, mas também temos nossa dimensão egoísta e intolerante que nos bitola a
olhar para o mundo com somente uma ou duas perspectivas. Eu penso que isso pode
ser chamada de uma espécie de preguiça de reflexão.
Não só do que nos vemos, ou de que alcançamos com
esta reflexão preguiçosa deveríamos julgar as coisas, mas eu vejo que muitas
pessoas não fazem muita questão de julgar e de refletir com mais profundidade
sobre isto.
Bukovski não era um aluscinado como outros de sua
época.
Quando eu li ele com mais tempo e
foi praticamente uma temporada inteira da minha vida de overdoses de Bukovski,
me dei conta de algo bem básico: o pai dele bateu tanto nele por causa daquele
maldito jardim e por causa daquele maldito humor dele, que ele nunca conseguiu
lidar direito com autoridade em qualquer forma ou modalidade que lhe aparecesse
pela frente.
Tinha que ter um porque dele ser
assim e tem e ele sabia disso. Mas se acomodou nisto e mandou o resto...
...por isto bebia...a bebida é um
sintoma intermediário nele entre isso e aquilo
Eu penso, no fundo, que nem um psicólogo
ou psiquiatra salvava aquela alma deste tipo de sofrimento continuo e de
tortura existencial derivada disto. Isso, para mim explica muita coisa do que
ele escreve e da forma como ele vivia. Pode não justificar uma gota para as
mentes saudáveis e bem protegidas do mundo atual, mas é como eu vejo a forma de
vida dele determinada por aquilo, aquele desprazer. E olha que lendo bem, ele
até acabaria concordando comigo. Por isto ele não teve filhos, pensando em não
colocar mais ninguém neste vale de lágrimas que é o mundo.
Ele, por fim, amava as mulheres,
mas tratava as mulheres como objetos e introjetou uma forma violenta e selvagem
do pai.
O SÉCULO XX É O SÉCULO DA MORTE
DO PAI
Não porque não houvessem pais
morrendo antes. Isso é parte do que o Freud sacou e por isto que a gente fica
tendo que lidar com homens frágeis, com alienação parental e etc. O pai e o
homem é um sujeito que ou vira herói e morre, ou vira covarde e foge, ou então
fica bem na dele nos seu cantinho para escapar desta sina.
Só por isto houve – para mim – e
foi possível a relativa emancipação das mulheres em meio e após esta gigantesca
série de guerras em escala global que fizeram as mulheres assumirem de vez
muitos lares, filhos e ter que se virar, procurando e selecionando, escolhendo
e forjando novos homens. ASSIM MESMO: O VELHO TEVE QUE MORRER para a MINA SURGIR.
A LIBERTAÇÃO E O APRISIONAMENTO
TAMBÉM é uma trama filosófica.
Vejo por cima só isso hoje em dia
e é por isto que eu tento dizer sempre para não te encantar tanto com as
teorias e os shows em sala de aula não. Quer dizer, como disse ontem, não
construa uma outra caverna no lugar daquela da qual você julga que saiu.
É o que eu tento dizer sobre
Frankl, quer dizer, a dor e a superação da dor pode não significar a cura, pode
só gerar uma ilusão de cura e uma outra dor.
Bukowski dá algo mais cru agora: MERDA
É MERDA, EM QUALQUER
LUGAR.. .
Penso mesmo que a parte mais
importante do Buck é te dar o direito de dizer as coisas pelo verdadeiro nome
delas. Ao contrário de outros que ficam inventando conceitos para falar disso.
Isso não quer dizer que resolvem mas eu penso que ajuda
Mas não adianta ficar também
escancarando. Aquele velho safado não vai sair da cova e por pão na tua boca se
tu ficar desempregado ou cair em desgraça perante a moral dominante. E a moral
dominante e seus mecanismos de repressão e regressão tem verdadeira aversão a quem prega a
parte crua da vida na parede das igrejinhas ou dos templos das finesses e das delicatessens.
Te dá conta de uma só coisa: ele
conseguiu sobreviver fazendo isso.
E quem não sabe nada sobre ele
deve achar ele um baita bobalhão que fica dizendo merda.
Mas ele sofreu bastante para isto.
Ele teve muita sorte. Como quando conseguiu publicar o que tinha onde publicar
e tinha quem o lesse. Fica imaginando
que ele dava palestras, enquanto o Jack Kerouac estava se matando de
alcoolismo, e ele viu a obra dele ser filmada cara. Só isso já é um baita lance
para um selvagem e outsider na vida.
Por exemplo, tudo que ele
escreveu é sobre a vida dele cara esta é a sacada destes caras BEATS E da CONTRACULTURA,
aceitar que eles são personagens ou que podem ser personagens que o homem real
e vivo que faz a suas coisas é um personagem. Eu penso que esta é a maior
contribuição do cinema americano. E ontem quando vi E o Vento Levou, me dei
conta disto de novo.
Bukowski pode ser lido pro prazer
mas também pode ser estudado em meio a algumas filosofias. Na minha faculdade eu
lia ele por uma necessidade de pensar mais na vida do que na filosofia. Eu era
um miserável que morava numa casa do estudante e que não tinha grana ou que
morava num quarto de empregada para fazer faculdade e vivi meio que num
submundo ou num circuito underground de Porto Alegre. Assim, a minha experiência
na real foi bem pesada e bem próxima de Bukovski ou de um Kerouac e outras
vibes dos anos 80. Mas não vou contar isso tudo não. Um dia se der eu contaria
ou numa biografia ou em um romance na real. Mas nem sei se vale a pena mesmo.
Eu sempre digo, calma baby,
porque tudo tem seu tempo e sua graça própria.
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