"Não é só inspiração: você
precisa ter uma visão lógica da música e depurar aquilo até que fique muito
claro. Quem gostar vai entender quase como uma flecha, vai ver que tem uma
ambição de composição, de canção, de arranjo."
Marina Lima – em entrevista
Isso começou na hora da
maçã....que desde as 10:00 está vigente...e seguiu até depois do almoço...entre
a MONTANHA DA VIDA e CHOVE NA IDADE MODERNA...
Trato agora de uma coisa que me
provocava muito precocemente quando lia certos autores, certos ensaios, certos
artigos, traduções diferentes em textos. Observava as pequenas variações e
diferenças, nuances e detalhes e via algo como que bem amplo como pano de fundo
de tudo.
Mas que também se apresentou para
mim na música, em que as diferentes versões da mesma canção, a mesma sinfonia
regida por este ou aquele maestro, executada por esta ou aquela orquestra,
aqueles ensaios do coral e as apresentações e a diferença entre algumas
apresentações e outras.
E também aquilo que parece a
mágica na arte, na fotografia, na pintura, em que a linguagem ou a tábua de
construção é a mesma (o mesmo toolbar amplo e maravilhoso que a natureza e
nossas habilidades nos oferecem somados agora às diversas tecnologias e
técnicas disponíveis) em que a mesma imagem pode ser vista, retratada, pintada
ou totalmente construída e reconstruída de forma diferente.
Walter Benjamim chamou de AURA ao
efeito próprio de uma obra de arte que é preservado na sua singularidade.
Hoje eu creio que a AURA se
deslocou do objeto e está ingressando diretamente em nossa sensibilidade. E,
também, penso na minha reincidente analogia aos jogos de linguagem de
Wittgenstein para dar sentido à certas coisas. Mas uso aqui os jogos de
linguagem pensando em múltiplos jogos que conseguem ter relação entre eles,
assim como as canções e as versões de canções entre elas, assim como as
múltiplas imagens e fotografias. Também vejo ai um uso possível da forma lógica
como uma espécie de estrutura invisível que agente imaginariamente pode
observar nos elementos que compõe estes objetos
E está aqui junto comigo, até
hoje, aquela imagem ou metáfora do Pistão ou Trumpete, que o Paulo Faria usava
para a nossa linguagem como um trumpete que precisa ter uma certa folga no
embolo para tirar esta ou aquela nota e para andar mais rápido nas diferentes
variações e escalas. E assim eu entendo o Jazz (e uma parte do Rock e de toda a
música) com aquela aparente loucura ou corrida maluca, pelas notas e aquelas
escalas diferentes misturadas e sub tons em uma mesma canção, nas dissonâncias
da bossa nova. Assim, não tenho conseguido mais pensar filosoficamente sem
pensar musicalmente, literariamente e poeticamente, porque há uma aproximação
estrutural entre elas, numa espécie de base que eu tenho usado para tratar do
tema do aprisionamento ou libertação.
Dizer a mesma coisa de formas
diferentes não é um pecado ou defeito é somente uma forma de abrir a rede de
significado e de sentido o mais amplamente possível...e reduzir a diferença e a
distancia entre o centro e as pontas do meu pensamento e do seu...a primeira
vez que pensei nisso imaginava que estava ensaiando ou só me repetindo...
Quem escuta mal ou quem não tem
ou desenvolver certo gosto musical ou que não cultiva a audição é que não percebe
que dizer as vezes é como o Jazz e que existem "milhares" de
variações possíveis sobre o mesmo tema...e quem toca um instrumento fica sempre
procurando a melhor nota, o melhor ritmo e todas as demais combinações
possíveis entre elas e outros instrumentos....
Então, ao abrir a rede de
significado estamos aprendendo a chegar também em mais pessoas e em mais
sensibilidades e entendimentos...parece haver uma certa tridimensionalidade ou
multidimensionalidade do sentido e eu olho agora na minha imaginação para
muitas escalas musicais ao mesmo tempo e imagino elas relacionadas em paralelas
e em arranjos...assim como quando estou muito bem e quando escrevo subo e desço
numa espécie de dicionário mental ou enciclopédia escolhendo as palavras e as
constelações de sentido (com afigura astrológica aqui e anti-astrológica aqui
de Adorno).
Fui estudar INSENSATEZ ontem. E
eu gosto muito desta canção porque ela tem na minha percepção musical de
aprendiz diversas aberturas para outras harmonias e improvisações. E fazem uns
dois anos vi uma apresentação do Gelson Oliveira - figuraça - em que eu fiquei
mentalmente e as vezes balbuciando vozes e sons paralelos aqueles que saiam do
violão e da voz dele e me dei conta de que eu estava começando a pensar mais
musicalmente após uns seis meses de canto coral, com Lúcia Passos, Agnes
Schmelling no Coral Municipal.
Ao estudar esta canção ontem com
violão e voz, e escutando mais arranjos, me aconteceu o que sempre me acontece
ultimamente e o que só é possível porque estas tecnologias permitem fazer tudo
isso em um único dia: pesquisar, encontrar, ouvir, executar, gravar se quiser e
ensaiar Assim tive o prazer de ver as Cifras por Tom Jobim (tom F, primeiro
acorde Am7), João Gilberto (tom G, primeiro acorde Bm7), Toquinho e Vinicius (
tom Am7, primeiro acorde Bm), Fernamda Takai ( tom F, primeiro acorde Am7) e
constatar que de fato há um diálogo interno entre os diferentes arranjos e uma
espécie de analogia nos intervalos das notas, mas uma ênfase aqui ou ali nas
notas básicas em sétimas, menores, maiores que vão dando variações para a
canção e que é muito legal fazer o que eu fiz, porque hoje pela manhã acordei
com as diferentes versões rodando na cabeça e ficou visível a forma lógica da
canção digamos assim.
A Marina Lima deve estar falando
na epigrafe que usei aqui nisto também, ainda que possa ter uma concepção de
lógica ali que parece mais técnica fazendo certo contraste com a inspiração.
Coisa esta que Picasso dizia também, que sem 90% de trabalho e 10% de
inspiração não há obra de arte, mas a gente olha para os vídeos dele pintando e
se dá conta que os materiais podem ser os mesmos, mas que permanece a mágica da
mão própria dele e do olhar próprio dele para as coisas. E quando você estuda
uma coleção de esboços dele se dá conta de que as variações que ele apresenta
ainda são inferiores aquilo tudo que ele devia imaginar na cachola dele. E a
depuração da qual Marina fala é o resultado destes exercícios de busca, destes
esboços e das diversas formas de dizer a mesma coisa. Mas, devo dizer que não
penso que haveria a forma perfeita dadas as variações possíveis e as mãos,
cabeças e vozes que podem se jogar afazer isto.
Você que me lê esperando uma
solução racional ou uma interpretação que feche tudo isso, provavelmente
gostaria muito que eu reduzisse isso à lógica, ou que eu fechasse com uma
estrutura elegante de apresentação de todos estes elementos e analogias. Mas eu
preciso ir além, para preservar o que realmente importa aqui nesta experiência
e aprendizagem. Preciso tocar não somente na tua cabeça, preciso muito chegar
no teu coração e te fazer viver melhor e ser mais feliz....e o meu motivo para
isso não precisa ser revelado ou justificado, nem mais julgado....
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