O TRACTATUS E A RÉS COGITANS
Toda a filosofia da consciência de Descartes repousa num só princípio. Segundo Descartes “Penso, logo existo” ou “Penso, logo sou” é este princípio e a sua proposição é certa e indubitável todas as vezes que eu a conceber em meu espírito. Tem sido discutida por LANDIM a possibilidade de refutar o Cogito. A solução imanente disso parece que foi bem apresentada por LANDIM.
Por outro lado, tem sido apresentada a refutação de Wittgenstein ao Cogito a partir das suas obras de maturidade. Como se sabe, essas apresentações acabam ou começam por tratar do argumento de Wittgenstein contra a possibilidade de uma linguagem privada. Não vou entrar no mérito de nenhuma destas interpretações, e isso quer dizer que não vou tratar desse princípio de Descartes a partir das obras pós-tractarianas. Posso apenas indicar que tudo que sei sobre essa perspectiva é que já no Blue Book Wittgenstein apresenta um argumento muito fino sobre essa matéria. Quem quiser tratar disso que esteja à vontade.
Pretendo aqui apresentar somente um approach, talvez muito forçado, da possibilidade de refutar este grande princípio cartesiano e alguns dos seus corolários, g.r., a cognoscibilidade e a discernibilidade da res cogitans em relação a res extensa, a partir de uma certa compreensão de algumas doutrinas do Tractatus de Wittgenstein. O interesse e o sentido disso não é meramente destrutivo ou polêmico, mas sim construtivo, pois da perspectiva adotada aqui a tese de Descartes é um exelente contraponto à doutrina da proposição de Wittgenstein e, isto quer dizer, é possível elucidar adequadamente as duas posições filosóficas a partir do seu confronto nesse cenário e com essas duas personagens principais a saber, o Cogito e a Proposição.
Se não me falha a memória isso já foi feito, e bem feito, por outros, mas no que me toca estou interessado em ver como posso fazer o mesmo ao meu modo. Assim, a única idéia clara que tenho sobre a relevância disso é que talvez eu esteja “fazendo algumas recordações com uma finalidade determinada”, a saber, com a finalidade de curar em mim mais uma vez um tanto de cartesianismo que restou para contar uma história..
Eu gostaria de poder começar isso por uma descrição, ainda que parcial, da gênese da linguagem na espécie humana, mas isso não está ao meu alcance. Provavelmente o maior milagre da natureza sobre a terra é exibido no homem através do uso que ele faz da linguagem. Não podemos encarar mais a verdade mesma sobre o início disso, mas a linguagem certamente constituiu e acompanhou o processo de mudança da forma de vida humana pré-histórica nas formas de vida atuais. Podemos dizer que ouve até um progresso nesse tempo, pois se ab initio a linguagem limitava-se a operar no interesse imediato, por fim vemos a linguagem ocupar o mundo e descrevê-lo através de proposições. Na pré-história a linguagem tinha funções que hoje desconhecemos, mas as formas da linguagem atual preenchem o mesmo espaço lógico. É plausível pensar assim que nos atos de linguagem são expressos pelo homem pretensões de sentido e significado. Talvez seja de interesse, portanto, adotar aqui uma perspectiva finitista e examinar, então, o espaço que essas pretensões ocupam no mundo.
Aristóteles compreendia isso através da definição de homem, a saber um animal racional, um animal entre outros que, porém, é provido de logos e com o logos realiza a sua finalidade. É também de Aristóteles que é herdada uma perspectiva realista sobre o que há no mundo, a saber, o que há no mundo são substâncias e acidentes.
Em Descartes esse mesmo logos encontra a sua expressão minimal, isto é, a extensão total daquilo que era compreendido pelo logos é reduzida, através do método da dúvida hiperbólica, ao mínimo “eu penso”, e conferindo este à existência de uma res cogitans mais certeza que a qualquer outra coisa. Essa curta história resume a situação em um cenário bem definido, o sujeito que pensa tem certeza que existe a cada momento que concebe ou profere a seguinte expressão “Eu Penso” e isso é mais indubitável que todas as antigas opiniões a que até então dava-se crédito. E Descartes pôs, assim, o sujeito no cenário do pensamento humano. A relevância filosófica disso pode ser melhor examinada a partir de uma certa abordagem desse eu que pensa como princípio. Descartes não limita-se a tentar provar que o eu que pensa tem discernibilidade maior em relação aquilo que é pensado. Mas também sugere que este eu que pensa é um princípio a partir do qual se descobrem os princípios a partir dos quais este eu que pensa conhece todas as outras coisas. Estes princípios são clareza e distinção.
work in progress 19/07/97 inacabada
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