Hoje pela manhã no conselho de
classe da minha escola surgiu de novo um debate recorrente sobre o desinteresse
e a indiferença dos alunos. Em certo ponto das avaliações das turmas de alunos,
seus desempenhos, envolvimentos e, a partir de um debate sobre o desinteresse e
a indiferença dos alunos e alunas, em relação à escola e às propostas de ensino
e atividades dos professores, ousei afirmar que pensava que a gente estava vivendo
em uma espécie de momento de transição. Queria dizer com isso que isso explicava
a nossa expectativa frustrada em relação aos alunos e também o nosso espanto e
um caráter de insuficiência e incapacidade nossa em corresponder, trocar e
afetar os alunos.
De que os jovens estavam mudando,
que eles não eram mais os mesmos e que vinham sinais diferentes destas gerações
nos últimos três a quatro anos era já uma suspeita compartilhada por nós
professores. Notávamos que os jovens tinham aparentemente outros projetos de
vida, do que aqueles que nós estávamos acostumados e ver. Percebemos através de
entrevistas e levantamentos, sondagens e diagnósticos e, também, a partir de
uma pesquisa realizada na escola pela professora Wanda que a visão que os
jovens tinham da escola havia mudado. Descobriu-se que o motivo para a evasão
não era muitas vezes a escola, mas sim o mundo do trabalho, uma espécie de
energia de atração do mundo do trabalho fazia os jovens saírem da escola.
Energia esta que era de certa forma reforçada pela expectativa deles de
ganharem autonomia econômica em alguns casos e também de apoiarem a renda
familiar e aproveitarem este surto de emprego
renda que o Brasil vivia.
E também afirmei que a própria
educação e a pedagogia estava mudando e que isto ia para muito além de novos
projetos ou dispositivos pedagógicos. Queria dizer com isto que a mudança é
muito profunda e que talvez a mudança seja mesmo no papel da escola na
sociedade. Ou seja, uma mudança no espaço e na forma como a escola aparece para
a sociedade. E também que esta mudança estava ocorrendo em virtude das mudanças
demográficas (de perfil etário, e de
aspectos econômicos, políticos e
culturais), que o Brasil estava vivendo e, também, não consigo mesmo deixar de
fora este aspecto ou de destacá-lo separadamente das mudanças tecnológicas que
são incidentes sobre o mundo do trabalho, o mundo do lazer, a vida em família e
as relações sociais, sobre o acesso a informação, formação de opinião, o acesso
ao conhecimento e á aquisição de conhecimento, bem como, todas as novas formas
e dinâmicas de comunicação hoje existentes e que intensificam seu impacto em
nossas vidas, e mais ainda na vida dos jovens que parecem ser hoje os primeiros
receptores destas mudanças. (Depois ao longo do dia fiquei pensando muito sobre
isto e me surgiu a suspeita de que talvez a escola se transforme em um espaço
mais parecido com um espaço de lazer e recreação do que propriamente
pedagógico, mas que também o papel da escola no cuidado à saúde dos alunos – em
especial à saúde mental e às relações sociais saudáveis parecia aumentar
também.)
A minha expressão tinha um
caráter de certa forma apaziguador e, ao mesmo tempo, desafiador para pensarmos
mais sobre isto. Disse que isso era algo sobre o que tenho pensado, em
decorrência do meu enfoque no conhecimento dos alunos e na percepção do que me
parece que anda acontecendo à nossa volta nos últimos anos.
Afirmei que talvez a gente
devesse começar a pensar mais nas mudanças que andam acontecendo nos últimos
tempos. Não cheguei a falar muito mais sobre isto, mas depois conversando com
um colega disse que eu sentia já um impacto muito forte de novas tecnologias e
novas relações sociais no ambiente escolar. Para mim isto envolve pelo menos o
meu ciclo atual de 16 anos em escola pública estadual e ouso somar a isto minha
memória da escola de ensino médio dos anos 80, como aluno, da minha formação
universitária no inicio dos anos 90 e depois minha curta passagem de dois anos
e meio pela Escola Técnica do Comércio da UFRGS.
Estamos em um momento de
transição em que a educação e a pedagogia sofrem mudanças que são, inclusive,
independentes das propostas de gestão ou dos dispositivos de gestão atuais e
também os jovens estão sofrendo uma mudança significativa em suas formas de
ser, valores, hábitos, interesses e na visão que eles tem da escola. Não penso
que isto se deva tanto a um atraso da escola, me parece que é toda uma dinâmica
que está se alterando, que envolve noções de tempo, movimento, conceitos e
também eixos e áreas de interesse. Assim, penso que talvez devêssemos pensar de
forma mais compreensiva e menos resistente em relação a isto fazendo mais uso
da nossa sensibilidade e também de um senso maior de equilíbrio na relaçõa com
os alunos e a escola, é um momento que nos exige mais calma, menos automatismo
e mais reflexão sobre o que anda ocorrendo.
Estão mudanças envolvem as novas
interfaces, conexões, envolve uma espécie de priorização do mundo do trabalho e
da renda em relação aos aspectos formativos, mas também envolvem ao meu ver uma
mudança de sensibilidade e uma mudança
de linguagem. Estes dias cheguei a dizer por aqui que eu julgava que os jovens
hoje tinham uma espécie de dilatação da noção de tempo, que as urgências deles
estavam se alterando. E, depois, fiquei pensando em que isto tinha relação com
aquela velha hipótese que me tocava lá nos anos 90 de que estávamos vivendo um
mundo de cultura das imagens. Pois tendo a desconfiar que já era. Que ao
contrário do que parece ocorrer e do que se assiste na mídia a banalização da
violência e a sexualização precoce – com aquelas programações e com uma
tonelada de provocações agressivas, apelativas em música, dança e etc. – estávamos a
viver uma espécie de renascimento das ciências humanas, que toda esta
tecnologia acabaria por levar para a dimensão oposta ao tecnicismo.
Cheguei a dizer, como exemplo,
para um colega que a facilidade de acesso acabaria por levar os jovens dos
poemas singelos de Mário Quintana – o que não é tirar qualidade dele - aos
Sonetos de Shakespeare. Valeria dizer aqui, que toda esta tecnologia terá o
efeito de ampliar a visão humana e a sensibilidade das novas gerações,
inclusive com uma abertura maior para a história e a artes, sem falar em
sociologia ou filosofia.
Por fim, admito que sou otimista
e que penso, portanto, que cabe a nós dar conteúdo e contribuir na elevação da
qualidade dos conteúdos oferecidos aos alunos e alunas nas escolas e aos jovens
em geral.
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