Comprei aquele livro amaldiçoado por alguns e querido por outros chamado VONTADE DE PODER. A curiosidade e a coleção de perguntas era imensa em relação ao seu conteúdo crítico. Aliás, leio Nietzsche antes mesmo de ter sido alfabetizado em filosofia e aprendi a ler ele com um quê de suspeita e de distanciamento porque percebi muito cedo que ele era pesado, denso e que possuía ideias tão extremas que poderiam estar me levando a me perder de mim mesmo.
Quer dizer nunca li Nietzsche me deixando guiar por seu pensamento, sempre tentei pensar de forma autônoma em relação ao que lia. É muito engraçado dizer isto, mas confesso que ao ler aquele volume dos pensadores aos 17 anos pensei tantas coisas e me coloquei tão intensamente em questão que aprendi a dizer para mim mesmo: PÁRA! NÃO PIRA CARA! E assim, a partir daquela experiência que me colocava em tentações e extremos que hoje observo com graça e muito humor, me dei ao trabalho de nunca mais ler, ouvir ou debater nada sem desconfiança e sem me perguntar sempre em meu íntimo: mas afinal onde é que esse cara ou esta criatura quer chegar ou nos levar? Até discursos escuto com este espírito desconfiado.
E, bem, sobre o Vontade de Poder estava comentando com meus alunos, em mais uma etapa do debate interminável sobre Nietzsche e sua periculosidade e suas maravilhas também, que é uma obra que não tem nenhuma obrigação de ter uma coerência, consistência ou organicidade interna porque foi montada pela irmã de Nietzsche e pelo amigo Peter Gast. E que, portanto, não é uma obra concluída e acabada por seu autor. Mas além disto eu entendia que como todas as outras obras de Nietzsche parecem possuir uma tensão interna, uma tensão essencial entre suas expressões e posições e uma tensão entre o que ele pensava e o que a tradição pensava, então não haveria de ser necessária uma busca de coerência interna na obra, pois deveríamos considerar, inclusive para efeitos de interpretação, que também ali dentro daquela obra como de outras obras de Nietzsche havia um choque interno de ideias, disposições e confrontos titânicos entre impulsos de poder, força e de destruição.
Sim, porque na primeira vez que li a expressão Filosofia de Martelo ou que se deve fazer filosofia às marteladas fiquei pensando mesmo no que corresponde aos dedos em uma filosofia de tal natureza e conclui que os dedos somos nós mesmos e que mais uma vez encontrava em Nietzsche um certo risco. Hoje não atribuo mais exclusivamente à Nietzsche estes riscos não e inclusive vejo em pensadores mais suaves e macios - para usar certa analogia graciosa - situações tão enganadoras, perdições tão bem disfarçadas quanto num Nietzsche em que é muito e as vezes exagerado e evidente os intensos riscos que corremos ao pensar criticamente e efetivamente contra a maré do senso comum, este espírito covarde de manada, e esta última moda em que negar compromissos parece a solução para quem nãos e arrisca em tentar fazer aquilo que parece tão difícil de ser feito.
Mas, bem recomendo uma olhadinha e uma passadinha em VONTADE DE PODER que como todas as obras de Nietzsche sacode a cabeça da gente de montão....e que isso talvez nos ajude a colocar fora ideias e concepções que não sobrevivem ao fogo do cadinho ou às marteladas e choques críticos de Nietzsche impõe ao pensamento da tradição e ao seu próprio pensamento.
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