"A exigência que Auschwitz
não se repita é a primeira de todas para a educação. De tal modo ela precede
quaisquer outras que creio não ser possível nem necessário justificá-la. Não
consigo entender como até hoje mereceu tão pouca atenção. Justificá-la teria
algo de monstruoso em vista de toda monstruosidade ocorrida. Mas a pouca
consciência existente em relação a essa exigência e as questões que ela levanta
provam que a monstruosidade não calou fundo nas pessoas, sintoma da
persistência da possibilidade de que se repita no que depender do estado de
consciência e de inconsciência das pessoas. Qualquer debate acerca de metas
educacionais carece de significado e importância frente a essa meta: que
Auschwitz não se repita.”
Theodor Wiesegrund Adorno
Eu fiquei prestando muita atenção
ao seu tom de polemista que desanca aqui o futuro Ministro, a Esquerda e a
Educação Brasileira. Prestei atenção aos seus debates e discursos anteriores e em
suas postagens aqui, aos argumentos que usas, aos seus golpes e arroubos contra
a esquerda e tudo que vem de sua lavra posto aqui hoje neste prosaico e afetivo
convite para a posse de Ministro de Renato Janine Ribeiro, criado por seus
amigos e admiradores. Tentei entender de onde vinha esta verve sem querer
menosprezar suas razões e a razões deste autor. É um bom caso de estudo este e creio
que é também um bom exercício.
Porém, suspeito que nenhum
argumento por melhor que seja vai te convencer ou te fazer pensar o contrário ou
sequer te sensibilizar de alguma forma a aceitar outra perspectiva que não seja
a sua própria e pelo visto de sua seita ou grés. Mas mesmo assim, creio ser bem
importante encarar teu ataque e respondê-lo, senão em nome do futuro ministro nem
em nome da esquerda brasileira, pelo menos em nome da razoabilidade, reflexão e
respeito às diferenças e para que certas coisas não se repitam. Dei, então, uma
lida aqui e ali de novo sobre os temas postos, contestados, mas observei,
enfim, com razoável facilidade que nenhuma das duas mil citações que ergues
aqui para sustentar tua autoridade e importância e suas posições devem ser por
artigos políticos ou relacionados à educação brasileira.
Então, com certeza o Sr. é um
notório cientista nos assuntos nos quais és especializado, foi orientado e orienta
pesquisas sobre isso, em Bioquímica dos radicais livres e etc. E a Bioquímica é
uma ciência maravilhosa mesmo e bem importante, mas não torna seus doutores em
especialistas em política, pedagogia e história. Non sequitur, simpliciter.
E mesmo o maior doutor – o doutor
universalis - que puderem encontrar ou que foi capaz de sistematizar todo o
conhecimento num único sistema lógico e metodológico - o que realmente não é
mais possível mesmo - não poderá tirar de sua cartola ou à sua vontade em uma
democracia e em gestão pública, o direito da maioria ou dos mais notáveis, ou
dos mais experientes ou dos mais sensatos e dos mais respeitados em
determinados assuntos de determinarem em um bom debate qual o rumo a tomar. E
isso é uma questão plural e coletiva e não individual. É uma questão cognitiva
e política bem respeitável e uma limitação que cada um de nós deve aprender a
enfrentar com tranqüilidade porque não sabemos tudo mesmo e também não podemos
tudo. É, então, uma questão de respeito ao conhecimento e não de retórica toda
esta discussão aqui posta.
E eu creio que o Renato tem todos
os atributos acima, ao lado e abaixo apresentados e que ele é apoiado por
muitos que compartilham não de suas posições nestas ou em outras questões, mas,
basicamente, por aqueles que tem alguma estima sobre a democracia e que tipo de
debate deveria ser mais promovido neste país, sobre a sua forma e qualidade
também, seja para aumentar a cultura política do povo brasileiro, seja para
promover melhores políticas públicas neste pais, o que inclui uma ciência, uma
educação e uma cultura progressista e não regressiva ou agressiva.
Vou dizendo que sou um modesto
professor de filosofia do ensino médio, mas que nem por isso, me considero
incapaz de compreender perfeitamente o tipo de raciocínio passional, suas
causas deslocadas e seu método enviezado, cujo objetivo e finalidade aqui
manifesto em diversas expressões não é o melhor para a ciência, nem para a
educação e sequer toca em alguma proposta que possa ser apreciada.
Pensei mesmo em não contestá-lo,
mas o amor à verdade e à justiça, não me permitiu ficar calado frente à tamanha
barbárie dos seus ataques e ao sentido profundo deles: quem não acredita no
conteúdo e no conhecimento das disciplinas que lhe são alheias é o Sr., posto
que pressupõe saber mais do que seus pares em assuntos aos quais não se dedica
profissionalmente. A ciência brasileira e a educação brasileira e a própria democracia
neste país depende muito de tranquilidade e de honestidade intelectual para
avançar.
Nós temos sim que te ouvir, Sr.
Marcelo, mas você também precisa aprender a ouvir e a dar assentimento ou não
com tranqüilidade, sem ofensas e a manifestar contrariedade com mais respeito
pelos outros e por seus trabalhos, vidas e poucos dias neste mundo. Agradeço
muito tuas manifestações e aleivosias, porque também nos ajudam a mostrar o que
realmente está em questão quando um cientista fala de democracia e quando um
professor fala de democracia e de educação e o que não está mesmo em questão
aqui com a posse do novo ministro.
É verdade sim que fazem já trinta
anos – para mim apenas 25 com a primeira eleição direta para presidente – que a
ditadura acabou no Brasil, porém também é verdade que mesmo com as
investigações e o Relatório Final da Comissão da Verdade – que pelo visto não
te serve – ainda que não tenha um paper sobre isso com duas mil citações - , ainda
temos uma enorme herança ditatorial e autoritária na sociedade brasileira, um
passivo imoral e corrupto a ser desvelado, e no delicado e muito importante tema
que apontei na minha observação sobre o fato do futuro ministro ser filósofo, e
acima sobre os expurgos e prejuízos à ciência brasileira no período ditatorial,
nenhum colaboracionista ou canalha pagou sequer pelos danos que causou à vida
de milhares de pessoas, jovens estudantes, professores, filhos e ao patrimônio cultural,
artístico e científico brasileiro.
Então, assim como alguns de nós não esquecemos
o Sacrifício de Jesus Cristo, assim como outros não esquecem as perseguições da
inquisição ou do Santo Ofício, assim como muitos não esquecem o que passou
Galileu Galilei, Nicolau Copérnico, Johannes Kepler, Descartes e muitos outros,
assim como muitos outros não esquecem as Câmaras de Gás de Auschwitz, assim
como não esquecemos as Bombas Atômicas, nem os Massacres de Canudos, Araguaia e
muitos outros, não esquecemos a escravidão e sopesamos sim seus danos, assim
como não esquecemos mesmo o entulho autoritário, seus sucessores e herdeiros,
beneficiários e apaniguados e vamos
continuar lembrando sim, para que não se repita e para que aqueles que
simpatizam com isso não ousem nos tomar por ingênuos, nem brincar com nossas
histórias e nossas vidas.
Um abraço e passar bem. Hasta La vista!!!
Nenhum comentário:
Postar um comentário