Ontem no meu ensaio sobre
LIBERDADE E INDETERMINAÇÃO: CONFRONTO DE ESCOLHAS, tratei nele sobre o Tarot apenas de
passagem. Este ensaio de ontem, primeiro, responde de forma liminar e superficial,
desorganizada e pouco analítica e profunda, à certas interrogações que ando
fazendo. Em segundo lugar ele foi provocado pela conjunção na minha tela de
pensamento de idéias sobre um Filme (Onde os fracos não tem vez, 2007, dos
irmãos Coen), um Texto (a crônica Pedras que Rolam, do Menalton Braff), outro Texto (a crônica O FIM,
do Luis Fernando Veríssimo) e, ainda, entrou no samba final uma postagem e
discussão sobre Tarot (do perfil do Renato Janine Ribeiro). Entrou nele também os
meus recorrentes estudos de filosofia grega (Platão, Aristóteles, Tales de
Mileto e Sócrates), onde ando entabulando, revisitando e refletindo sobre
diversas coisas que incluem o surgimento da filosofia, o tema da liberdade e do
destino, da indeterminação e dos acidentes na vida.
Além disso, também o tema da escolha das cartas no Tarot, como uma escolha às cegas, me lembra que em boa parte das artes divinatórias se faz do começo ao fim, escolhas nos búzios, nas cartas, no I Ching e mesmo na astrologia em que o desenho do mapa é posto ao nascer e sofre certa evolução determinada, cuja única variação possível na vida da pessoa é com quem ela se relaciona e onde se relaciona, mas que na astrologia quando é feita uma escolha das palavras e das ênfases de significados por parte do astrólogo também há escolhas que envolvem desde a formação, concepção e metodologia própria do astrólogo até outras escolhas que incidem na interpretação.
Comparei e comparo tudo isto com as nossas escolhas na vida que, como bem disse o professor Renato, são arriscadas também, ao meu ver, porque expressam e realizam nossa liberdade em confronto com o indeterminado.
Além disso, também o tema da escolha das cartas no Tarot, como uma escolha às cegas, me lembra que em boa parte das artes divinatórias se faz do começo ao fim, escolhas nos búzios, nas cartas, no I Ching e mesmo na astrologia em que o desenho do mapa é posto ao nascer e sofre certa evolução determinada, cuja única variação possível na vida da pessoa é com quem ela se relaciona e onde se relaciona, mas que na astrologia quando é feita uma escolha das palavras e das ênfases de significados por parte do astrólogo também há escolhas que envolvem desde a formação, concepção e metodologia própria do astrólogo até outras escolhas que incidem na interpretação.
Comparei e comparo tudo isto com as nossas escolhas na vida que, como bem disse o professor Renato, são arriscadas também, ao meu ver, porque expressam e realizam nossa liberdade em confronto com o indeterminado.
A gente sabe bem porque são
arriscadas. Ora a vida é feita de escolhas e tem sido recorrente até os usos
publicitários disto para atrair estas escolhas de nós, mas algumas escolhas não
são nossas, nem dependem somente de nós. A maioria das escolhas que nos definem
em muito em nossas vidas aliás provém também de elementos externos à nós. Isso
não significa que não escolhemos. Significa que tem mais gente escolhendo e que
tem escolhas que ninguém escolheu, digamos assim.
Assim, nossas escolhas sofrem um
fator indeterminado. Basicamente porque sofrem de efeitos que como muitas
coisas que escapam às ciências exatas ou físicas e às previsibilidades bem e
razoavelmente estabelecidas, se sucedem mesmo assim no mundo. De tal modo que não
há garantia alguma do que vai ser, nem do modo como vai ser e é a vida um tipo
de obra que depende do projeto, mas cujo segredo ou o mistério, o insondável e
o inexplicável, o imponderável e o imprevisível rondam à nossa existência e de
nossas escolhas.
Em resumo, tem uma parte que
depende de nós e tem uma parte que depende dos outros, mas também há uma parte
que parece não depender de ninguém ou que não é deteminável. Chamei isso que
não é deteminável de indeterminado. E
esta última parte da equação do que acontece com a gente nos provoca a pensar
no místico, no divino ou no que fica superior, para além do nosso alcance e que
é tributado como sobrenatural.
Vou me repetir aqui. Então isso
nos mostra que não depende somente de nós, de nossa prudência, maestria,
virtude ou sabedoria, as condições do desfecho ou do que vai ocorrer. E nos
vemos assim com duas dimensões efetivamente decisivas e indecisas. De um lado o
que está ao nosso alcance o que está ao alcance de nossa compreensão (o que
inclui algumas escolhas dos outros) e, do outro lado, o imponderável, o sobrenatural
de Almeida, o que é misterioso e espantoso e que nos surpreende ao longo da
vida (que também pode ser resultado das escolhas dos outros. Nosso mundo de
possibilidades passa a ser cindido por aquilo que podemos fazer e compreender e
aquilo que não depende de nós e que também não conseguimos compreender. E as
vezes aquilo que não depende de nós nos joga em um trecho pelo qual devemos
passar compreendendo com muito esforço. E tal esforço pode nos levar a desistir
de tentar explicar.
Como dizem e reproduzem já a
exaustão por ai: somos responsáveis pelos afetos que conquistamos, somos livres
para escolher, mas depois de escolhermos não escapam as conseqüências, todas elas nos advém à medida exata do seu
tempo e da afinação dos demais instrumentos e personagens da vida. Porém, não
somos tão livres assim como julgamos.
O Tarot entrou nesta conversa por
conta da constatação do filósofo e amigo Renato – e tomo a liberdade de chamar
alguém de amigo não quando o conheço, mas quando guardo certa estima e
admiração por ele e, neste caso, seja pelas epístolas, seja pelas posições, que
na maioria das situações compartilho; ele
percebeu que havia algo interessante no Tarot: a escolha do consulente.
Ele sempre pensou que dependesse da mão do oraculista como os búzios, e que
então surpreendido com o fato de que as
cartas são escolhidas pelo consulente e que somente a interpretação é do
tarólogo ou taróloga.
Excluindo a idéia de uma vidência
ou do sobrenatural resta apenas o indeterminado. Porém ai há no elemento
fortuito e indeterminado, um elemento para o qual nossa tendência é atribuir a
alguma força sobrenatural ou mística, ou a uma vontade divina, o que ocorre,
mas eu não sei não. Não sei nada sobre isto e não tenho como saber. E o exemplo
do jogo de Tarot é um bom caso para percebermos isto, haja visto que ele
depende de uma escolha e de um indeterminação também. Porém, a escolha é, também, indeterminada na contraface
e na ocultação da face das cartas escolhidas, pois esta escolha de cartas é
feita por alguém que não sabe, enfim, qual carta está a escolher na
aleatoriedade do que foi embaralhado e disposto à mesa. É uma escolha no escuro como muitas outras em
nossa vida, com o risco para o bem e para o mal disto. (O filósofo Michael Dummett talvez tenha algo
mais a nos dizer sobre o Tarot. Vamos ver isso mais de perto uma hora destas.)
Fiquei feliz ao saber que o papo
dele, no Encontro da Nova Consciência em Campina Grande, sobre isto foi com a
minha grande amiga Giane Portal, que é publicitária, taróloga, gatóloga,
astróloga e fotógrafa. Então resolvi estender a prosa para além do que disse
acima e contemplando algumas coisas que as demais tarólogas dizem sobre isto.
Eu disse a ela que tinha um texto
maior sobre destino na minha página e que ofereci também como a ele e que é um
começo de algo maior sobre isto que estou tratando às voltas com o
livre-arbítrio, e o tema do amor, e ainda o tema geral da liberdade, o que me
referia acima no confronto com a indeterminação, e que eu considerava tudo isto
numa espécie de grande confronto de possibilidades na nossa vida. (Para os
astrólogos sugiro pensarem bem no quadrado Plutão (Capricórnio) Urano (Áries)
que para mim, na semântica astrológica é justamente o confronto entre a máxima
indeterminação e a máxima liberdade, ou o máximo poder e o impulso máximo pela
liberdade – nossa geração que tem isso em virgo deve toda ter boa experiência
disto em alguma área de sua vida, já no meu caso vai para a análise.)
Anoto aqui que alguns vão
estranhar esta minha postagem a mais não poder, tanto por seu conteúdo como
pelos elementos que ela traz, mas vou tentar ser claro porque eu sei bem que há
um quê ou risco de loucura nisto tudo e eu penso e digo que é bem possível mesmo.
Estamos aqui nos limites máximos, na minha
opinião, da sensatez,
razoabilidade, racionalidade e cientificidade.
E eu sei que tanto a filosofia
quanto o esoterismo atraem os gênios e os loucos sendo que uns viram os outros
de vez enquando. E uns são tomados pelos outros na maior parte das vezes. Fui
também reler agora as postagens lá e a primeira que encontrei me pareceu ser portadora
de uma tendência dogmática, mas que vai se desfazendo ao longo do debate. É
importante dizer aqui que isto tem ocorrido desde os idos de 2005 e 2006 também
no Orkut nos debates nas comunidades de Astrologia e de esoterismo ou artes divinatórias.
Debates estes que nos levaram a conquistar e conhecer muitos amigos e amigas que hoje se reencontram no Facebook e
que criam outras redes e relações alternativas. Curiosamente a reprodução desta
tendência é tanto para um lado como para o outro. Ou seja, há uma tendência dogmática
na defesa da cientificidade e há uma tendência dogmática na defesa da mística.
Mas oq eu eu posso fazer com isso? Quase nada...
A idéia de que há um ÓRACULO
presente – que é uma entidade outra que o consulente e o tarólogo é bem clássica
e acompanha toda a tradição de leitura do futuro. Haveria uma receira
personagem ali que indicaria ou inspiraria como que numa possessão ou mesmo ao
ombro ou guinado a mão e a fala do intérprete sobre a leitura. Não é esta uma
idéia ou argumento refutável, simplesmente porque ela também faz parte do
conjunto de crenças adotadas nesta ou em outra formação de tarólogo. Mas cabe
registrar que já existem tarólogos que tentam trabalhar mais em uma dimensão
técnica, ou seja, procuram atuar abrindo mão desta dimensão mística.
A idéia maravilhosa de CURA DA
ANGUSTIA PELA PALAVRA me lembra muito Freud.
O senão aí é que nem sempre rola esta cura e que às vezes fica só a
palavra e a doença ali se reproduzindo e se reapresentando e mesmo Freud
percebeu isso em suas lidas com a hipnose. Percebe-se, então, o limite da cura
na fala porque falta uma outra coisa nesta relação que não é somente presencial
ou confessional. O nome disso em qualquer hipótese deveria ser Tratamento, ou
seja, deveria - para efetuar a cura - haver a prescrição de uma conduta, porque
aquele nó, aquela dor ou sofrimento, aquele rolo ou embaraço não se desfaz
apenas em pensamento ou palavras. Ainda
que alguns gostem da idéia de uma cura instantânea, e se sentiriam muito
privilegiados caso se desse uma iluminação ali.
Mas concordo com a opinião de
muitos que mesmo assim o Tarot não é uma ciência, aliás o Tarot muitas outras
atividades semelhantes, porque entendo que não é o tipo de atividade que
precisa ser comprovada como tal. Assim, a atividade é ela mesma uma Arte e a sua
relação com uma religião é possível ou facultativa em qualquer caso...Deste
modo, não é ser ou não místico que transforma o Tarot em ciência...mesmo não
sendo místico continuará sendo uma arte.
A tendência que também aparece –
que às vezes me parece uma força de atração muito poderosa quando se enfrenta o
tema do imponderável ou inexplicável – é a presença constante deste lado
místico, que às vezes me parece não ser um lado, mas o todo. E vem junto dela o
famigerado e temível, fatal e impressionante DESTINO. Eu tendo a tratar deste
tema abrindo mão mesmo do destino e atribuindo a este conjunto de
possibilidades um caráter aberto e indeterminado. Ou seja, para mim não está
escrito em lugar algum, vai se realizar se você e outros tomarem a iniciativa e
fizerem a escolha para isto. Fiquei pensando na palavra dosimetria aqui, porque
ela poderia entrar neste jogo para a gente tentar entender porque alguns
destinos brilhantes não se realizam. Ou
porque alguns se realizam na mínima, na média ou na máxima acepção da palavra.
Há que ter trabalho ou algo mais ai que explique. E o fator sorte, fortuito ou
o acaso também entra no jogo. Assim, a tiragem de cartas, e a sua calibração
depende da própria dosimetria do individuo ou consulente para se realizar e da
sua exposição a estes ou aqueles elementos que fortuitamente podem beneficiar
ou prejudicar o seu andamento.
Vou usar um elemento incrível
aqui. O do pianista Keith Jarret. Um virtuose do piano cuja gravação mais
importante e mais evocativa se deu justamente com um pi8ano ruim, com um
defeito na afinação de uma das cordas o que lhe obrigava a arranjar mentalmente
um acorde no entorno desta corda. O Koln Concert, junto com Kind of Blue de
Miles Davis é considerado um dos maiores discos de Jazz, mas é um disco solo
meu amigo e é simplesmente o mais vendido da história do Jazz. Eu tenho
predileção absoluta por este disco. Mas o que aconteceu ali? O piano que ele usou era de ensaio e estava
em mau estado e exigiu antes do concerto várias horas de afinação e ajuste para
torná-lo usável. O instrumento era metálico e fino nos registros superiores e
fraco nos registros dos baixos, e os pedais não funcionavam corretamente. Como o Concerto
tinha sido organizado por uma menina de 17 anos (Vera Brandes), boa parte do
planejamento prévio e de certos detalhes parece que foi dispensado. No entanto,
ele foi perfeitamente gravado e registrado e se tornou neste disco memorável.
Em virtude destas dificuldades Jarrett usou muitos obstinatos e rolavaos dedos rapidamente do lado esquerdo do teclado com figuras
rítmicas durante sua performance com o objetivo de dar o efeito de notas graves
e mais fortes, e concentrou-se na porção média do teclado. O produtor da ECM Records Manfred Eicher disse mais tarde:
"Provavelmente, Keith Jarrett fez tudo assim, porque o piano não era bom. Porque
ele não cairia de amores com o som dele, ele encontrou então uma outra maneira
de obter o máximo proveito disso.” (Usei aqui parte do texto do verbete da
Wikipedia em inglês sobre o Koln Concert
com alguns acréscimos e alterações minhas). E isso basta para demonstrar o que quero
mostrar aqui que nem sempre as melhores condições levam ao melhor resultado e
que às vezes algumas condições ruins podem levar ao melhor resultado.
Substitua-se as condições ai por cartas ou pela interpretação ou pela leitura
do consulente e está bem formado o quadro que eu gostaria de atingir sobre o
êxito ou não de uma leitura, da sorte fortuita e das escolhas e seus limites.
Ainda creio que seja algo
opcional ou facultativo este elemento místico ou divinizante na leitura seja
dos búzios, seja das cartas, seja de um mapa astral ou no lançamento do I Ching.
Creio que todas estas artes preservam algo de místico e indeterminado quando
seus leitores falam não mais em divindade ou deuses, ma sim em intuição. A
intuição aí não é nem temporal nem espacial, sua acepção é a mesma de Insight e
tudo se passa como se viesse ou sobreviesse repentinamente uma luz ao intérprete
que lhe guiaria a leitura. Aqui eu encontro algo tão inefável ou místico e
inexplicável como a tão desejada epifânia que James Joyce almeja em seu Retrato
do Artista Quando Jovem. Porém, vamos às
palavras e às palavras velhas sobre isto. Trata-se ai deste fluxo ou discurso silencioso
da alma como dizia Platão que chamamos de pensamento e que muitas vezes nos
aparece como que do nada e deslinda a questão, o problema ao dá a ordem das idéias
que precisamos para interpretar o mundo ou o que ts posto diante de nós. Isso
acontece muitas vezes após intensa e contínua reflexão, e outars vezes num
repente ou estalo e muitas vezes não acontece de bate-pronto ou instantâneo como
alguns gostariam, mas acontece. E neste tema eu me pergunto: como isto é
possível? (e aqui esta pergunta se lança sobre a própria filosofia, em como é
possível pensar-se diferente de toda a tradição que nos circunda, o que é mais
ou menos o que acontece com a boa filosofia.) Com certeza houve uma escolha
nossa aí que deve começar com nossa atenção ao tema e prosseguir com nossa
reflexão até que a ideia irrompe e deslinda ou desvenda a questão.
É uma escolha da preferência de
quem lê e mesmo que quem leia as cartas seja cético, pode ocorrer que o
consulente tenha sua própria crença e construa os significados a partir disso.
Ou seja, como o consulente tem sua própria crença e Le pode construir um
significado próprio sobre aquilo que o tarólogo diz. O consulente que pode ter
sua crença também vive um fluxo reflexivo
e também vai atribuir significado ao que vê e escuta, ao que sente e imagina
neste contexto de leitura das cartas.
A questão, então, não é se
funciona bem ou mal para o místico, a questão é se você acredita e como você
acredita e atribui significado ali neste contexto, o que seria ai funcionar vai
depender da sua crença e da construção de sentido que você faz sobre o que é
lido e que te é compreendido ou traduzido em sua linguagem de crenças próprias.
Senão o que seria mesmo funcionar ai? Dar certo? Ora essa, a gente sabe que pode
dar tudo errado na vida e nas cartas e a gente continuar achando que está certo,
que era isso mesmo. E mesmo assim o resultado pode ser ótimo. (Recomendaria
aqui o estudo sobre Teoria do Auto-Engano.)
Julguei aqui e considerei aqui
que é muito importante clarificar as opções de idéias e não defender esta ou aquela
dogmaticamente e tentei me dedicar, em especial, um pouco a isto porque sei que
muitas escolhas na vida passam por processos como estes. Nossa compreensão de
possibilidades não pode se fechar e talvez seja melhor perceber as aberturas e
não tanto ter as definições finais do tema. E, assim, devolvo o baralho a mesa
para que outra sorte seja lançada e outras escolhas possam ser feitas.
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