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terça-feira, 19 de maio de 2020

DA LUTA ENTRE A EDUCAÇÃO E A IGNORÂNCIA


DA LUTA ENTRE A EDUCAÇÃO E A IGNORÂNCIA

Essa crise da Pandemia tem agravado um conflito que já era latente e exposto entre os educadores e cientistas e uma parte da Sociedade que tem pretendido negar a ciência e a educação e limitar aquilo que a ciência e a educação apontam para a sociedade.

Isso já aparecia entre os professores e professoras nas escolas, com o projeto escola sem partido e também já aparecia no conflito estimulado por algumas seitas e concepções religiosas com as suas diversas versões de doutrinas criacionistas e as teorias darwinistas. Para ser honesto esse tipo de concepção não esclarecida ou irracional também povoa, para nossa infelicidade, as mentes de alguns educadores.

Também aparecia no espaço escolar nos temas da educação moral e do ensino de história, sociologia, filosofia, geografia e outras disciplinas. Os professores e professoras foram muitas vezes afrontados de que aquilo que eles lecionavam era matéria de opinião e não de conhecimento. Tem também os eventos de boicotes a vacinação promovidos por algumas concepções religiosas ou mistificadoras. O terraplanismo também tem figurado no espaço escolar.

Não custa lembrar que o homem não pisou na lua, segundo algumas opiniões corriqueiramente apresentadas nas escolas. O negacionista avança também em bloco contra o holocausto judeu e europeu. Bem, tem uma tonelada de temas que os negacionistas e suas defesas da ignorância voluntária, e que eles fazem questão de defender como questões de liberdade de opinião ou de uma espécie de direito que não pode ser contestado em ter opiniões, pensamentos e juízos distintos dos que são correntemente aceitos e reconhecidos nos meios científicos e divulgados nos livros e nas lições escolares .

E essas defesas são feitas de um modo cada vez mais audaz. Isso, em parte, é produto de uma educação democrática, mas por certa coincidência vem acompanhado também de desejos autoritários e de disposições a impor censura e constrangimento aos educadores. Em alguns casos marcantes atendem nesses ataques ao lado de acusações de ideologia ou educação ideológica que deva ser enfrentada. É curiosa essa simplificação grosseira e essa generalização leviana em relação às lições dos educadores.

Estou pensando muito nisso agora também em meio a Pandemia de Coronavirus. Já tinha observado no processo político o impacto desse negacionismo e percebido a aproximação dele com o irracionalismo e uma modalidade de absolutismo que versa dogmaticamente de que se uma questão não possa responder uma resposta ou solução absoluta, então ela deve ser desconsiderada ou simplificada simplesmente para o rol das questões cuja solução deve ser a mais radical possível.

É um raciocínio bipolar e simplório que sempre vem carregado de uma base no tudo ou nada e que também traz junto uma espécie de má fé subjacente de que se eu não consigo compreender o que você diz ou afirma então nada disso pode ser verdadeiro. Como se tudo que não é compreendido por um determinado acervo de conhecimento limitado ou ligeiramente adquirido não pudesse ser verdadeiro mesmo.

O tema de fundo aí é o conflito básico entre conhecimento e Ignorância e toda essa fumaceira ideológica em volta apenas aumenta o abismo entre uma e outra. Isso gera uma indisposição ao conhecimento do que é difícil de compreender e um reforço da posição do ignorante em não aprender. Não aprender algo vira um direito de escolha. Me parece que trata-se de uma questão crucial do nosso ofício. A relação entre Educação e Ignorância.

Rapidamente, me sinto compelido em afirmar que isso não pode ser justificativa para nós desistirmos ou nos lamentarmos demais. É um cavaco do nosso ofício. Quando escolhemos ser educadores fizemos uma opção muito desafiadora em fazer parte de um exército de trabalhadores cujo principal combate se dá nesses termos bem definidos da luta entre o conhecimento e a sabedoria e a ignorância e perversidade. É uma luta civilizatória.

Vou resumir assim. Quando decidi ser Professor escolhi por tentar atuar para reduzir a ignorância no mundo. Algum aluno ou aluna pode olhar para mim e dizer que não quer saber, pode dizer que não interessa saber, pode dizer que quer ser livre para "pensar diferente", mas não será isso que me fará desistir de tentar tirar ela da ignorância.

Para ser mais filosófico, nós somos aqueles moradores da caverna de Platão que conseguimos sair dela e optamos por voltar para tentar tirar os nossos irmãos e irmãs de dentro dessa caverna. Isso provoca rejeição, isso provoca resistência e até mesmo alguma violência contra nós, mas não vamos desistir.

Tocamos em frente. Vamos enfrentar esse jogo de ilusões e opiniões e dar informação, ter posição e tentar ao máximo acrescentar cada vez mais conhecimento e, se possível, mais sabedoria para enfrentar a ignorância e a perversidade que decorre dela.

Essa luta pode parecer ser entre os sábios arrogantes e pretensiosos e os coitadinhos que não conseguem aprender ou que não querem sacrificar a sua liberdade de opinião e de pensarem o que bem entenderem, mas de fato é uma luta entre uma humanidade que quer vencer e viver com conhecimento e sabedoria e uma parcela da humanidade que recusa isso e não quer isso.

Nós ficamos nessa luta do lado de toda a humanidade e da vida.



Obs.: A imagem abaixo é de uma travessia sobre tábuas em uma enchente (1926 ou 1941, não sei precisar agora), na primeira quadra da Rua São Joaquim, em São Leopoldo, de umas duas dúzias de seminaristas entre os dois prédios do então Instituto Anchietano de Pesquisas e a Faculdade de Filosofia Natural nos antigos prédios da futura Unisinos. Escolhi ela agora porque estamos sim enfrentando um acidente natural, essa Pandemia, e porque devemos atravessar ela com uma combinação inteligente de fé e conhecimento, entendimento e compreensão, que seja dirigida por educação, sabedoria e amor a humanidade. A imagem pertence ao Acervo do MHVSL - Museu Histórico Visconde de São Leopoldo.

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