Eu lembro neste dia sempre uma expressão bíblica atribuída a Jesus que se dirigindo a sua mãe Maria, em diversas ocasiões, usa uma forma de tratamento que nos deixa em suspenso e aqui neste dia vou repetir: mulher. Alguns podem interpretar esta expressão como uma espécie de símbolo da revelação de um Deus superior à mulher que atribui a ela uma missão, ou ainda como uma espécie de censura tardia ou conta atrasada ao episódio do fruto proibido. Mas me parece estar ai algo muito mais simples e de mais valor do que a glorificação ou desvalorização de gênero. Eu vejo nesta expressão uma proteção semântica e que na minha linguagem significa dizer somos iguais em nossa diferença e que eu te entendo assim mesmo como és.
E quando li hoje o depoimento de uma mãe cujo filho a chama de "Ei", um "ei você" pensei mais nesta base de relação mínima que é estar junto. Um estar junto que mistura a verticalidade da família natural e da reprodução biológica da nossa espécie e a horizontalidade da relação do homem com a mulher. Vejo na horizontalidade o verdadeiro abraço que nos protege. Eu penso, assim, numa mãe como uma mulher, que como todos os seres precisa também de proteção e não como uma salvadora, protetora ou super mulher. Não fico glorificando a maternidade como uma forma de gratidão e de elevação da minha vaidade, pois assim como meu pai que já se foi, tinha suas imperfeições, minha mãe tem as suas escolhas e próprias opções e eu mesmo e todos os demais também.
Muitos filhos e filhas gostam que as mães sejam isso mesmo um objeto de glorificação, há um orgulho e um envaidecimento nisto e os homens também aproveitam isso de certa forma, podendo dar mais atenção aos seus outros interesses. Mas eu creio que devemos proteger mesmo as mulheres disto. Penso numa mulher que, assim como os homens tenta viver, mas que possui e carrega em si um papel social bem diferente dos homens, pais, amantes, padrastos, tios e avôs. Há uma espécie de exigência simbólica que cria expectativas e que sobre as mães é excessivamente idealizada e que em discursos muitas vezes é mistificada e isso só serve para reduzir o papel dos homens e da sociedade na formação de uma humanidade e de uma sociedade com relações diferentes.
Não é a mãe que erra, quando o filho erra, não é a mãe que erra quando a sociedade tem violência. A responsabilidade pelos filhos, pelos homens e pela sociedade é de todos. Não creio que faltem mães neste mundo, o que falta são os pais e aos demais que não são nem pais e nem mães entenderem que eles também educam, também podem proteger e viver juntos.
Penso no amor e sinto o amor como uma doação, um abraço e uma forma de aceitação do outro, mas também sinto alguém que tenta ser livre e feliz ao seu modo e que muitas vezes não consegue lidar tão bem com o papel social que dão a ela. É num dia como hoje, como o dos pais e o das crianças que devemos pensar nas nossas famílias naturais e sociais e nas representações, afetos e ideias que temos delas. As representações não são aqui - como em diversos outros contextos - mais importantes que os representados. Se me faço entender aqui eu diria que tento proteger com este discurso as mulheres de uma representação que não as compreende plenamente e que muita vezes não as aceita também como são. E é nos papéis sociais que damos a elas como o de mãe e protetora que talvez estejamos errando,
Não quero que nenhuma mulher seja desprezada em seu desejo e em sua vontade e que se houver sucesso na maternidade seja por proteção e entendimento nosso também. Assim, se é que isso, este sucesso, seja passível de uma medida e que não tenha que ser relativizado para o bem ou mal dos que são diferentes e que não fazem tudo sozinhos ou sozinhas e para o bem ou mal dos que não conseguem, porque não há nenhuma obrigação de conseguir isso. Não há uma garantia de sucesso e talvez compreender isso nops ajude a aliviar este fardo. Não pode, para mim, haver uma culpa ali aonde não há pecado nem um mal intencional. E enfim, olho desde algum tempo para toda mulher e mãe como uma menina que a sua vida, seu entendimento e o seu tempo lhe impôs algumas escolhas, alguns acidentes e a necessidade de lidar com isto.
Então, um feliz dia das mães a todas as mulheres, em especial à minha mãe que contra ventos e tempestades esta ai firme, às mães das minhas filhas, minhas irmãs e minhas tias, minhas avós e também as minhas colegas professoras, alunas e amigas. Que neste dia este fardo pesado de criar os homens, sobreviver neste mundo e viver seja mais leve e mais prazeroso!
Esta canção que compartilho a seguir PROTECTION, me parece carregar um sentimento como o que eu trago aqui:PROTECTION - MASSIVE ATTACK
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