Não me sinto um corpo estendido
no chão, mas sinto que se depender do desprezo pela educação e pelos educadores
de alguns ignorantes - o que infelizmente inclui alguns colegas meus - e certos
canalhas serei um dia apenas isto...um corpo estendido no chão, e nem serei
mais visto como um professor nesta situação. Aqui entre nós, sinto que há
inclusive hoje a disposição de alguns em me considerar um bandido ou um
marginal porque ouso militar por alguma causa, protestar ou me manifestar
politicamente contra uma lógica de manada na qual nossa sociedade sucumbiu.
Não me sinto um herói também, mas
sei que pela expectativa de milhares de alunos e alunas, amigos e amigas, e
alguns colegas, nos olham como heróis, heróis potenciais, criaturas prontas
para todos os sacrifícios pela educação e pelas nossas causas. Não me vejo
assim. Não me vejo como um herói, nem como um kamikaze e muito menos como um
lutador suicida que enfrenta um adversário com mais forças do que possui e se
coloca em holocausto perante o inimigo. Me vejo apenas como um professor que
precisa lidar com estas dimensões negativas e positivas da luta pela educação.
O atual Governo do Estado tenta
sim nos derrubar, nos faz tanto mal e consegue também nos humilhar e nos
submeter a sua agenda e isto é um problema que parece bloquear a reação de
muitos educadores, mas eu sei que podemos reagir.
Em São Leopoldo, o atual governo
de minha cidade também faz a mesma coisa. No ano passado tentou humilhar,
violentar e agrediu moralmente muitas educadoras e educadores. Meus colegas
reagiram e fizeram a maior greve da história do magistério municipal. E nem
nisso vimos neles algo herói, não foram ao chão, pois todos se sentiam apenas
como educadores que escolheram um lado na história e optaram por lutar em
defesa de sua dignidade reivindicando respeito e o pagamento de um reajuste que
lhes era devido tendo em vista a existência de recursos nos cofres públicos
para tal. Vejam os vereadores municipais provaram depois em CPI que haviam
recursos e que a greve foi provocada apenas pela intransigência e
irresponsabilidade, inépcia e incompetência da gestão municipal que tinha as
famosas "outras prioridades" para 2015.
E hoje é o dia que se consolida
este poder perverso e covarde contra nós educadores e cidadãos, quando o
golpista do Michel Temer vai ganhar no Senado um mandato de forma espúria e
safada, de forma indireta vai ascender a presidência da república, através de
um processo que frauda nossa constituição e que comete uma iniquidade absurda
resultado de uma conspiração que envolveu interesses de poderosos empresários,
corporações, políticos e partidos que representam interesses de estamentos
tradicionais e conservadores, com um bom empurrâozinho da mídia e com a
conivência e omissão do STF.
Este golpe tem uma agenda que
tenho chamado de agenda golpista e que irá agravar em muito minha situação de
trabalho e a situação da educação brasileira. Verei em poucos meses conquistas
pelas quais lutei por mais de trinta anos serem dissolvidas, verei em poucos
meses direitos de trabalhadores e cidadãos serem minimizados e diminuídos,
inclusive direitos de alguns que apoiam o golpe, mas eu lutei com alguns
colegas e conclamo a todos que se engajem nesta luta e nesta jornada que se
inicia hoje.
E é preciso reagir sim, porque
senão acabaremos todos como este corpo estendido no chão, sob uma ótima
consideração de alguns, mas porém derrubado e atropelado pela covardia e falta
de caráter de muitos, derrubados pela canalhice e a ignorância que andam de
mãos dadas a serviço daqueles que querem o poder apenas para preservar seu
status, ampliar seu status e manter o povo brasileiro bem submisso e bem
explorado.
Não quero mesmo ser um herói,
quero apenas ser um professor e dar minhas aulas em paz, tocar minha vida, cuidar
dos meus filhos, ler meus livros, amar e fazer música...mas não tem sido
possível e eu agradeço aos envolvidos nisto, pois não serei eu que irei contar
esta história no futuro, aqui sou apenas um professor e militante social. A
nossa luta vai continuar, vamos perder alguma coisa sim, mas vamos nos
organizar, debater, lutar pela democracia e a educação para construir a
superação disto e colocar no chão não pessoas, mas as velhas ideias que
orientam este golpe, a agenda golpista e as personagens golpistas que hoje
triunfam com arrogância e soberba sobre o que é certo, o que é justo e o que é
correto, na maior desfaçatez.
Não devemos morrer no altar da
pátria a serviço daqueles que não lutam, mas devemos sim defender a nossa
pátria contra aqueles que a aviltam e a vilipendiam e quanto mais colegas,
jovens e cidadãos entenderem isto, menos sacrifícios sofreremos.
(Obs.: A imagem abaixo é uma
releitura de obra de Hélio Oiticica: Seja Marginal, Seja Herói, baseada em uma
foto do corpo de um velho bandido chamado cabeça de cavalo que foi encurralado
e executado em um tiroteio com a polícia em 1968. "Hélio Oiticica
frequentava a Mangueira e conhecia o mundo da marginalidade. Dentro de uma
lógica de transgressão de valores burgueses, tinha certo fascínio pelos tipos
marginais e malandros. Cara de Cavalo, acusado de matar um policial, foi uma
das primeiras vítimas do esquadrão da morte carioca, em outubro de 1964. Esta
obra é marcante no movimento chamado de marginália ou cultura marginal, que
passou a fazer parte do debate cultural brasileiro, a partir do final de 1968,
durando até meados da década de setenta. O artista foi acusado de fazer
apologia ao crime. A marginalidade é considerada uma forma de transgressão dos
valores conservadores e burgueses, identificados com o regime militar, aliado à
idealização do mundo do crime, como mundo produzido pelas contradições da
sociedade." op. cit. in http://memoriasdaditadura.org.br/)
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