A situação descrita na breve
história de fundação da Universidade de Stanford em que ocorre desprezo por
parte da secretária do reitor e do reitor de Harvard, por um casal de senhor e
senhora que pretendia homenagear o filho morto e que, por conta disto, acabam
fundando a Universidade de Stanford é só mais uma entre tantas demonstrações e
típicos textos culturais que fazem certa homenagem ou reverência ao homem
comum, modesto e humilde na América.
É também mais um caso de história que
sofre certa transformação ficcional e fica mais bonita. Mas nesta histórica o
que eu mais gosto não é sequer o tema da diferença entre a aparência modesta do
casal e o juízo discriminatório da secretária e do reitor - justamente o
elemento ficcional destacado e criado - mas sim o tema do homem comum, modesto
e trabalhador cuja aparência é desprezada somente por sábios presunçosos,
pessoas preconceituosas e que não entendem
com certa facilidade a importância e o respeito que devemos aos homens e às
mulheres comuns, sem os quais a comida não chega em nossas mesas, casas não são
construídas, o lixo não é recolhido, não há luz para o baile, nem transporte
para as viagens, muito menos razão e sentido em se ter algum conhecimento,
estudo ou qualquer distinção ou autoridade quando não compreendemos a sua
importância. E isso é justamente uma das características que eu mais admiro em
certa tradição cultural presente na américa do norte, em especial, em certas
regiões dos EUA, onde qualquer um - do mais rico ao mais pobre - sabe que é do
homem comum que deriva toda a riqueza, todo poder e toda sabedoria. Muitos
elogiaram este elemento da américa de Alexis de Tocqueville à Hannah Arendt.
E
eu me rendo a isso, reconheço a grandeza disto naquele país, porque sei que
este é justamente um dos elementos culturais que nos falta aqui no nosso pais.
Um país que foi colonizado pela sub-elite européia, cuja arrogância com o povo
comum, o desprezo permanente e a discriminação com as pessoas simples ou
pobres, esconde e encobre apenas esta ferida de um narcisimo fragilizado pela
subalternidade, subordinação e submissão persistente aos Impérios Coloniais Europeus.Para mim é
justamente disto que que se deriva tanto o complexo de vira-latas, quanto as
fugas para Miami, a adoração à última moda em París, Londres ou Berlim e,
também, é claro esta persistente e repetida presunção de que o povo brasileiro
não merece respeito, consideração ou elogio em qualquer coisa que faça, procure
fazer ou já tenha feito. Aqui, ao contrário do que a historinha conta ali um
casal modesto sequer seria atendido pela secretária do reitor, pelo gabinete do
prefeito e etc. Lá, e é isso que eu gosto de elogiar nesta grande tradição
cultural deles, um cidadão qualquer é a base da liberdade de todos.
Para
terminar com um exemplo, estes dias comprei em um sebo um livro extraordinário
organizado e introduzido por Paul Auster - Achei que meu pai fosse Deus e
outras histórias verdadeiras da vida americana, pois nele constam histórias
reais narradas por pessoas comuns de toda parte da américa e ao ler me deliciei
com a quantidade de tramas originais e muito significativas para roteiros de
cinema, canções ou mesmo cenas de teatro ou imagens a serem criadas, pintadas,
em colorido ou preto e branco, desenhadas por cartunistas ou até virarem temas
de cenas e todas as formas possíveis de criações que estendam, com mais ou
menos ficção, seus enredos incríveis e muitas vezes surpreendentes de alguma
forma para nós.
E após ler fiquei pensando se isso seria possível ser feito no
Brasil e como seria. A ideia que levou a isso é muito simples receber e ler por
escrito histórias de pessoas comuns em um programa de rádio: pois ele recebeu
em um ano 4000 histórias de uma, duas, três e até quatro páginas. Mas que apelo
teria aqui no Brasil histórias contadas por pessoas comuns para uma parte da
elite que é ensimesmada e para outra parte de nosso povo que parece desprezar
sua própria condição?
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