Penso que temos problemas
conceituais e de perspectiva aqui. Esta relação entre crenças, sentido da vida
e absoluto é altamente afetada por nossas inclinações involuntárias, pelos
nossos hábitos e crenças adquiridas, mas também, à medida que vamos elaborando
uma compreensão e muitas vezes interpretação de tudo que supera esta base
cultural, avançamos, por nossas
disposições deliberadas, sejam elas conceituais e reflexivas ou simplesmente de
gosto (aqui faço menção direta aquilo que nós preferimos).
Também adquirimos crenças em
nossa formação e em nossos momentos dedicados à reflexão. Nossas crenças tem
esta espécie de matriz permanente e que em alguns casos parece flutuante entre
crenças desejadas e expectativas, formas de sua aquisição, tipos de fixação de
crenças e também na modalidade ou seu status de verdade ou credibilidade em
crenças plausíveis e possíveis, crenças duvidosas e crenças ás quais atribuímos
verdade ou certeza.
Tenho notado - e não quero ser
relativista aqui, mas apenas apontar como uma direção de pensamento - que este
desejo de absoluto, ou vontade de poder, impulso de controle, busca da
totalidade, esta diretriz de método de possuir uma análise completa do tema ou
problema ainda está buscando um absoluto, certa extinção de um resto indomável
ou inexplicável. Ainda há para mim ai uma espécie de grande impulso da razão de
isolar ou cercar nossas paixões, o indeterminado e o duvidoso. Isso que chamam
de vontade de acreditar em algo absoluto se traduz para mim numa espécie de
dispositivo de gosto ou preferência, pois tendemos a preferir sempre a possibilidade de que exista algo
absoluto, uma solução definitiva ou uma explicação final. Aqui há uma espécie
de gosto para mim.
E na história da ciência vemos
esta mesma ambição e gosto por uma certa forma de absoluto que parece
irrenunciável. Quando digo gosto aqui eu creio que se trata de algo que vai
mudando por influência cultural exterior a nossa base original e que acaba por
fazer evoluir nossos anseios estéticos e morais de um tempo a outro nesta vida,
por conta de vivermos em sociedades cuja diversidade de oferta e visibilidade
de oferta cultural é bem mais ampla que aquela encontrada pelos modernos, pelos
viventes europeus do século XIX, XX e que no século XXI é ampliada mais ainda. A esperança também é uma crença e tenho visto
que mesmo após francas e claras decepções nós persistimos acreditando em algo
melhor, em algo superior.
Eu não sei se está fé se perde
assim tão fácil. Tenho pensado nisto e vejo ela minimizada, mitigada,
encolhida, mas que vez ou outra se regozija com qualquer coisa que possa
lembrar ou satisfazer por mínimo que seja aquela esperança ou desejo. A arte
substitui este absoluto sim. Ao meu ver porque envolve uma certa forma de
totalidade acabada e que conversa internamente com outras obras e externamente
com o mundo e nós mesmos fazemos e traçamos estas conexões. A arte também tem
suas decepções quando lemos a obra completa de um autor ou quando ocorre certa
decadência ou decaimento do talento de um gênio, pois muitos não conseguem se manter
no que chamo de topo da montanha alcançado, decaindo seja em sua vida seja em
sua obra. E estas decepções ocorrem de muitas formas. Nós tendemos aqui a
voltar a um grande tema metafísico que envolve a relação entre nossas teorias
científicas e até onde elas nos acompanham em nossa fé em atingir algo absoluto
ou completamente determinado.
Na arte isto também é uma espécie
de meta e na vida não podemos desprezar este desejo também. Penso, enfim, que
isto vai sendo modalizado e alterado ao longo da vida e segundo nosso acesso a
conhecimentos, experiências e também avaliações dos acontecimentos e relações
que estabelecemos entre eles e nossas crenças, expectativas, ideias e gostos.
Por fim, é claro que quando te
respondo ao tema da fome de absoluto com uma espécie de doutrina ainda que mal
desenhada do gosto em nossas volições creio estar te dizendo que esta fome não
existiria se não fosse em alguma medida saciada e satisfeita, ainda que
tenhamos muitas decepções, desprazeres e ainda muitos banquetes indigestos pela
frente e ao longo da vida e da nossa dedicação a refletir sobre ela.
Agradeço aqui a bela provocação
para esta reflexão pelo amigo e colega Alexandre Noronha Machado.
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