A MALDITA POLARIZAÇÃO
Voltamos a vaca fria como dizia o
velho vacariano na porta do açougue.
Toda vez que o povo brasileiro
resolve de fato se colocar na posição de enfrentar de vez e corajosamente o
antagonismo fundamental com a classe dominante, se colocar numa posição
antagônica e deliberada aos interesses e poderes dos exploradores, essa
disposição e coragem em desmascarar toda essa elite privilegiada, ocorre que
aparece alguém com outra solução para esse antagonismo. No mais das vezes é uma
solução mitigada e moderada que não resolve nada. É uma pretensão muito bem
comportada que atua e se expressa de modo a tentar construir o muro da paz
perpétua e da tranquilidade entre o povo massacrado e vilipendiado e essa elite
conservadora e perversa. Assim, bem no meio desse conflito sempre aparecem
aqueles que vão criar a tal terceira via por aversão a odiosa polarização e que
vão defender que nós não precisamos mais de conflitos, que é a hora de fazer a
paz e a transição tranquila e moderada, por que nós não precisamos de debates
tão radicais, por que não existem tantas contradições que são fundamentais
assim na sociedade brasileira.
Eu lembro que não queria esse
velho açougueiro patavina nenhuma disso, não queria saber dessa conversa, porque
para ele esse papo furado sempre leva a mesma coisa. Esse papo furado não percebe
uma distinção profunda e essencial entre a carne do real e o osso da estrutura
dessa realidade. Para ele, não dá mais para aceitar as coisas assim indiscerníveis,
pois se tem que saber fazer a diferença entre o osso e a carne. Saber que o
osso é a realidade estrutural da sociedade brasileira. E que o que é estrutural
é mais difícil de mudar. Assim, na carne você continua ali e ela vai passar ali
na sua vida, você vai viver, você vai mudar de cor, vai mudar de gênero, vai
mudar de perfil, vai mudar de religião e imagem, mas o osso vai continuar ali
com o mesmo poder de divisão da partilha. Que a estrutura fundamental da
sociedade brasileira é profundamente desigual desde o período colonial, desde o
período do império e mesmo com a república ou com essa farsa de República que
existiu até os anos de mil novecentos e oitenta e nove.
Veja você que, nestas repúblicas,
cujo cidadão e cidadã não tinham voz, não tinham expressão própria, não tinham
a liberdade para as pessoas da oposição e muito menos qualquer acesso a
qualquer espaço de poder. E, portanto, não temos mais de trinta anos de uma democracia
juvenil e que luta para se emancipar dessa estrutura e ossatura do real, de um
real passado e determinante. Uma democracia que, porém, é sempre ameaçada e
ameaçada justamente, não pela atitude do povo pobre, não pela rebelião dos
indignados ou dominados e explorados, não pela rebelião dos revolucionários de
esquerda, ou pelos comunistas e socialistas, que ameaçam acabar com o sistema
político brasileiro, mas sim pela reação dessa elite, dos fascistas, da direita
conservadora e dessa elite privilegiada brasileira que não suporta a
possibilidade mínima do povo brasileiro conquistar alguma parcela mínima que
seja ou mais fundamental que seja de poder na sociedade brasileira, no estado
brasileiro e na partilha da boa vida.
E, então, nós temos que suportar
a todo momento em que se afirma violentamente essa contradição das classes
sociais, ao aparecimento dessa turma do deixa disso, dessa turma dos paninhos e
planinhos quentes, essa turma que quer botar panos quentes no conceito
fundamental de que é necessário enfrentar na estrutura uma sociedade desigual e
que reproduz de forma violenta, que reproduz de forma excludente, que se
reproduz de forma miserável, a miséria e amplia a desigualdade, aprofunda essa
grande desigualdade no Brasil.
Ora, o Brasil é o país mais
desigual do mundo, e quando e se essa contradição fundamental, não for
enfrentada com coragem, ela vai continuar vigindo e o nosso país vai continuar sendo
mais e mais desigual e aqueles que tentam fazer a mediação desse conflito
fundamental estão se lixando para essa contradição social fundamental. Eles
fazem de conta que ela ou não existe ou não é crucial para um projeto de pais. Eles
tentam apenas tirar alguma vantagem desse conflito, tentam mediar esse conflito
fundamental para tirar algum proveito de classe, algum proveito ao seu
estamento, seja pessoalmente ou objetivamente.
A lição disso, bem observados
esses personagens e recorrências, é que nós temos que parar de fazer essa
pseudo terapia social do faz de conta com a sociedade brasileira, do faz de
conta com um conceito fundamental da sociedade brasileira que tem marca
histórica e estrutural. Assim, é preciso avançar mesmo e corajosamente para
cima dessa contradição, tomar posição na polarização e escolher um lado. Assim,
todo aquele que propõe a terceira via, não está defendendo de novo mais do que
uma conciliação que não resolve, mais do que um entreguismo ou recuo que não
resolve esse problema estrutural, mais do que um faz de conta que o problema
não é assim tão sério e que pode haver uma mediação uma terceira via que supere
a Polarização que é produto dessa contradição fundamental da sociedade
brasileira e não o contrário.
Veja que, quando na verdade,
milhões de brasileiros vivem na miséria, são excluídos de seus direitos mais
básicos e elementares arduamente conquistados e quando agora com a política
atual do Bolsonaro, já iniciada com Temer, serão também nossas porções mais
básicas e mínimas de sobrevivência de vida não dá pra aguentar esse papo
furado, aí da contradição, ai da
polarização, aí do conflito social.
Pois bem, meus amigos e minhas
amigas, meus irmãos e irmãs, sem enfrentar esse conflito, sem enfrentar essa
contradição não há solução.
É preciso enfrentar essa
contradição fundamental com clareza, não fazendo de conta que dá pra minimizar,
que dá pra amenizar ou atenuar esse conflito fundamental. Um conflito que posto
de modo surdo e sem voz, gera tantas vítimas, vítimas não das camadas
"superiores" da sociedade, ao contrário, as vítimas são sempre do
lado mais fraco, do lado de uma grande maioria que inteira da sociedade que vê
suas vidas solapadas e prejudicadas pela imposição desse resumo ou síntese de
interesses que contempla no mais das vezes sempre os interesses dos mais
fortes, dos que tem mais "mérito" daqueles que se julgam melhores que
os demais, seja por hereditariedade seja por pertencimento ou adjutórios
adventícios das classes dominantes.
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