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segunda-feira, 2 de setembro de 2019

A Despedida


A gente morre, sabia?

Ele levantou os olhos do chão onde estavam fixados e esperou ela responder aquela obviedade que parece desaparecer da nossa consciência, até que algo aconteça com alguém e nos faça lembrar dela.

Ela olhou bem para ele. Uma lágrima escorreu do olho esquerdo e caiu bem no meio da blusa vermelha. E aquele tempo de espera do que ela ia dizer pareceu uma eternidade. Ele teve a impressão de que toda a vida dos dois juntos se passou entre as suas palavras e aquela lágrima derradeira. Ela se concentrou e respondeu, então, de modo a não deixar dúvida alguma:

Eu sei. É triste isso.

Ele ficou pensando no que ia dizer mesmo em sequência. Mas não pronunciou nada daquilo que já lhe estava pronto na cabeça. Disse, então, simplesmente:

É por isso que nossos momentos precisam ser sempre os melhores. Podem ser os últimos. Podem ser uma despedida.

Ela olhou para ele e sorriu. Deu-lhe um beijo na face. Ele retribuiu. Agradeceu a carona e desceu do carro.

Naquela noite eles haviam conversado sobre tanta coisa, com tão poucas palavras. E enquanto ele seguia na sua direção, levantou a não esquerda e deu adeus com um gesto simples. Ela sorriu e ele foi embora.


P.S. É um texto que fiz pensando na nossa finitude e na extraordinária experiência que nós temos em compartilhar com alguém uma relação real e verdadeira. Algumas pessoas parecem levar muito tempo para se dar conta disso. E às vezes fica tarde demais. Eu acredito que parte da desumanização das relações de todo tipo está ligada ao esquecimento da finitude e de que nossa existência não é eterna e que talvez não seja possível mesmo que tenhamos qualquer outra existência além dessa que, na loteria entre essa fusão de matéria e espírito, foi milagrosamente possível. Se essa loteria já foi difícil de ganhar para existir, dá para imaginar o privilégio que deva ser ter uma existência autêntica e genuína, honesta e verdadeira com outra pessoa ou outras pessoas. Só o esquecimento da finitude não explica a brutalidade e perversidade de algumas ideologias e tipos de pessoas, mas me parece ser um sinal do caráter mesquinho delas e do pouco caso e generosidade que elas tem para com os outros seres humanos. Em face disso é bom lembrar, tanto para quem amamos quanto para quem nos ama, que a gente morre mesmo e que a vida não dura para sempre. Assim como deveria ser lembrado para quem nos odeia também. Paz para os homens e mulheres de boa vontade por que o amor ao próximo é uma bela forma e talvez a única de imortalidade.

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