Powered By Blogger

quinta-feira, 24 de outubro de 2019

MARCOS JUSTO TRAMONTINI: UMA LEMBRANÇA E HOMENAGEM


MARCOS JUSTO TRAMONTINI: UMA LEMBRANÇA E HOMENAGEM

"A maioria dos seres humanos atua como os historiadores: só em retrospecto reconhece a natureza de sua experiência"

Eric Hobsbawn

A Organização Social dos Imigrantes: a Colônia de São Leopoldo na Fase Pioneira 1824-1850, é uma tese de doutorado defendida em 1997 na PUC-RS e publicada em 2000, pela Editora Unisinos. Uma das obras mais importantes sobre a história de São Leopoldo já publicadas. Esta Opus Magna de Marcos Justo Tramontini (1958-2004), se destaca pelo tratamento crítico da bibliografia existente sobre o tema dos imigrantes alemães nas primeiras décadas e renovou os estudos sobre a imigração e colonização alemã no Rio Grande do Sul, conforme afirma Marcos Witt em homenagem póstuma.



O orientador da tese, Rene Ernaini Geertz, aponta seu caráter e relevância, no prefácio da publicação:

“os imigrantes não eram pobres coitados abandonados pelo poder público nacional/regional que tinham que resolver sozinhos seus conflitos. Sua leitura do período inicial da imigração em São Leopoldo mostrou que os conflitos eram parte do processo de organização social dos imigrantes. Para ele, a história social e a história político-cultural não podiam ser separadas. Sendo assim, sua reflexão conduziu-se no sentido de deixar claro que a teoria do enquistamento social do imigrante não tem qualquer sustentação, se não for vista como parte integrante da realidade econômica e social da colônia. Tramontini demonstrou ser lenda a tese de auto-isolamento, de o imigrante ser avesso à integração e indiferente à política. Evidenciou, ainda, que, desde os primórdios, a sociedade do imigrante é brasileira, é plural e tolerante, mas também rebelde.”

Esse estudo do historiador leopoldense, promoveu o reconhecimento da dinâmica dos conflitos e da mobilidade social na formação histórica da cidade, que antes era vista e analisada como uma condição passiva e estática de submissão dos imigrantes e das etnias na história da cidade. Quando, num certo dia de sua vida, ainda na adolescência, Marcos decidiu ser professor de história e se lançou com todo o seu espírito a estudar a história e a pesquisar alguns temas intocados no vasto campo de estudos por onde se enveredou, talvez ele não imaginava que fosse conseguir destrinchar toda essa trama. Porém, é bem possível pressupor que este jovem que viveu os anos de ditadura militar e de lutas por democracia em São Leopoldo, participou de movimentos sociais e culturais locais e que dialogava com militantes sociais, intuía que o conflito social encoberto e quase invisível para a história oficial não era apenas de seu tempo e que a tal passividade de classes ou de segmentos sociais escondia apenas uma tentativa de apagar as diferenças e reconhecer as desigualdades sociais, religiosas, étnicas e culturais que formaram as organizações sociais, os ideias e as lideranças de diversos segmentos que representavam interesses em conflitos desde o povoamento, colonização e disputa da terra nessa região abrangida pela colônia de São Leopoldo.

Quando iniciou sua graduação em História na Unisinos em 1977, vivíamos o início das lutas urbanas contra a ditadura que combinavam sindicalistas, lideranças religiosas, camponesas, culturais e intelectuais que reagiram massivamente em todos os espaços sociais ao regime decadente. Quando ele concluiu o curso de História, em 1983, já estávamos em outro patamar e promovendo a luta pelas eleições diretas em todos os níveis no Brasil. Naquela época ou período de transição de 1977 a 1983, São Leopoldo vivia um turbilhão de movimentos sociais de base dentro da universidade, nas escolas, nas comunidades religiosas e também no meio cultural.

Após um período de ocupação local, dois anos após a conclusão do curso de graduação, em 1985, Marcos, então professor já, iniciou o Mestrado em História na PUC de São Paulo e concluiu o mesmo em 1989, com uma dissertação sobre o Clube de Gravura de Porto Alegre de 1940-1950. Onde ele inaugura uma nova abordagem de história cultural e intelectual que depois será seguida em muitos outros estudos sobre esse grupo que articulava arte, política e uma concepção social. Em 1990 iniciou sua carreira de professor na Unisinos. E em 1997 já estava defendendo sua Tese de Doutorado na PUC-RS como foi apontado acima. Também deve constar numa biografia mínima de sua trajetória que parte de seu enfoque de análise social estava fundado em interpretações e revelações sobre os processos de aquisição, disputa e luta pela posse da terra em nossa região por diversos agentes e interesses, demonstrando assim que a disputa ideológica ou cultural repousa principalmente na luta pela sobrevivência e uma busca de um chão e uma terra para viver, morar, plantar e existir plenamente.

Em novembro de 2007, Marcos recebe uma homenagem que marca o reconhecimento de suas atividades minuciosas e notáveis de pesquisa em arquivos públicos que embasaram sua tese e seu trabalho de pesquisa e de seus orientados, o auditório do Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul passou a se chamar Marcos Justo Tramontini, atendendo à sugestão da direção da seção gaúcha da Associação Nacional de História (Anpuh) da qual Marcos também foi Presidente de 1998 a 2000.

A importância de Marcos como historiador também passa por ter tido assento no Instituto Histórico Visconde de São Leopoldo-IHVSL, ocupando a cadeira 13, nessa instituição que congrega historiadores da imigração, colonização e história da região do vale dos sinos.

Marcos se despediu desse mundo de conflitos e afetos Históricos, Políticos, Culturais e Sociais, em 1° de Dezembro de 2004.

Agora, em 2019, teremos em São Leopoldo um possível Local de Memória na Rua Brasil - próximo a Antiga Sede da Prefeitura e ao lado do Hotel Kleinville onde está sendo construído um centro de eventos com auditório.

Este lugar, servirá para referir a este importante historiador de nossa cidade, tendo em vista que o Conselho Municipal de Patrimônio Artístico e Cultural chegou a um termo na negociação sobre intervenção e edificação que preserva parte relevante da residência em que Marcos Justo Tramontini viveu desde sua nascença até sua emancipação intelectual. O inicio dessa imporante trajetória de um historiador que contribuiu tanto na compreensão da história da cidade quanto na formação de uma legenda de historiadores e historiadoras através de suas pesquisas, lições, orientações e também provocações à reflexão sobre história social, política e cultural do povo brasileiro, gaúcho, portoalegrense e leopoldense .

Nenhum comentário:

Postar um comentário