Caro amigo Bado eu devia te dizer
algumas coisas mais sobre o debate de ontem.
Primeiro, eu creio que você não
precisa criticar a gestão passada para ter o direito de criticar a atual. E eu
acho que você fica fazendo isso por um motivo muito ruim: tentar se tornar
imparcial, ou afastar-se de ser tendencioso. Não creio que você precise disso –
para usar uma expressão maniqueísta e não perder a metáfora – para pagar a
conta para o diabo, para poder criticá-lo, não precisa bater nos anjos, e é
isso que você faz agindo desta forma. Mesmo que você não nos veja como anjos, o
que é um direito seu e meu também. A justificativa que aparece ai seria muito
ruim: olha estou batendo em você, mas também bati nos outros. E o único
problema é quando você bate nos outros – ou em nós do PT - sem razão e sem
argumentos, só por repetição ou ouvir dizer. Penso que isso é desnecessário
mesmo. Até porque o teu quero-quero foi criado agora e tem legitimidade – como
qualquer um, aliás, para criticar o que quiser, desde que o objeto da crítica
seja real e não imaginário. Sei que você faz esse debate por diversão também e
não tenho nada contra isto. A demo0cracia que a gente defende também aceita
isto.
Segundo, eu acho completamente
irrelevante que eu tenha que defender a gestão passada, mas você não a criticou
aqui na época e era lá atrás que deveríamos ter recebido este tipo de crítica e
eu também prefiro uma crítica mais objetiva do que genérica. Porque genérica
não tem objetividade e só deixa no ar, Vá direto ao ponto, dê nomes aos bois se
eles estiverem no campo, porque daí eles merecem mesmo e se sinta a vontade
para fazê-lo. Hoje em dia não conheço nenhum político que não tenha uma penca
de processos para responder e este é inclusive o ônus da administração pública,
não pelos mal feitos, mas também por conta de denúncias e por conta de detalhes
que as vezes são mais resultado de interpretação equivoca das leis ou também de
simplificações na gestão ou mesmo ausencia de leis que regulamentem certas ações inerentes à função.
Terceiro, a discussão de que o PT
aparelha o estado é a mais absurda que eu conheço de todas as críticas que
recebemos. Aliás, ela é uma crítica que curiosamente é a cantilena do PSDB
contra o PT. Do mais simplório diretório do PSDB aos seus próceres mais notáveis,
mas onde mesmo isso acontece? Em nossa gestão de São Leopoldo, eu vi pessoas
manterem um pé em entidades e entrar no governo, mas isso foi muito criticado,
chegando ao ponto da gente romper inclusive com alguns representantes de aliados
internos e externos. E se foi criticado por nós isso significa que não somos
favoráveis ao aparelhamento de entidades ou do estado. Mas como com cavalo
burro não adianta açoite ou cutucão, até hoje algumas pessoas em diversos
partidos acham isso completamente normal. É interessante isso em outro sentido
também. Porque às vezes eu noto uma coisa muito ruim, até parece que o PT é o
único partido que fez discurso ético e que, portanto, ele é o único que tem
obrigações éticas e para os outros é um vale tudo. Não é isso que eu entendo
mesmo. Acho que a discussão sobre a ética na política foi levantada e brandida
mais por nós do que por muitos outros, mas não penso que isso deva ser uma
exclusiva obrigação nossa. Hoje é uma exigência da democracia. Temos a lei da
ficha limpa em vigência no pais e não preciso dizer que não é o nosso partido o
campeão de ficha suja. Quanto ao exercício ético na política, penso que isso
vale tanto para crimes tipificados em lei, quanto para as ações em geral dos
políticos e dos cidadãos também.
Quarto, você pode até tentar, mas
não há o lugar ou a cadeira que você procura sentar na mesa, aquela da
imparcialidade e neutralidade, que fica além do bem e do mal. E você nem precisa
ter esta cadeira para poder criticar o que está errado. Eu acho ótimo que
pessoas de todos os partidos discutam de forma honesta e verdadeira os
problemas da nossa cidade, independente de quem está na gestão. Mas para poder
fazer isto não é preciso mesmo fazer onda de neutralidade ou esconder as
simpatias políticas, sejam elas mais pessoais, sejam elas mais programáticas.
Não tem problema algum se você gosta ou quer muito bem quem governa ou é
secretário agora. É um direito seu mesmo. E eu não tenho dúvida de que devem
haver pessoas legais neste governo, apesar dele não ser do meu partido e de que
é muito cedo para julgar quem realmente é bom. Porque só no discurso não rola
gestão mesmo. Meu problema fundamental com este governo é programático e também
ideológico. Por outro lado, não há neutralidade alguma em omitir pelo menos
quatro ou cinco grandes retrocessos que eles já estão cometendo agora, hoje,
inclusive com você pelo que dizes. A saúde está muito pior agora. Voltaram a
ocorrer situações de nepotismo agora. O racismo voltou a ser uma bandeira
brandida por alguns simpatizantes deste governo. E muitos funcionários me
relatam episódios de patrulhamento, perseguição política e um pacote de
maldades em relação aos funcionários. Sem tratar aqui de desvios de competência
profissional que corrigimos em nosso governo respeitando categorias profissionais
e também sindicatos de servidores e de profissionais de diversas áreas. Omitir
isto é signo de quem tem lado nesta história. Só vi você falando levemente
sobre a saúde, e o que escuto agora nestes Cem Dias de governo não é sinal de
quem vai resolver o problema mesmo. E eu sou um daquels que sabe que o problema
da saúde não é o hospital mesmo. O problema do hospitale da rede de saúde que agora se agrava é que
falta médicos e este prefeito que é médico sequer isto conseguiu resolver
ainda. Aliás, eu ando com trena e fita métrica no bolso o tempo todo, porque
tudo que tem medida tem limites. Eu gostaria, por exemplo, que você defendesse
os funcionários públicos porque sai governo e entra governo, e são eles é que
mantém esta prefeitura mesmo e são fundamentais e devem ser muito mais
respeitados. Liderar eles é fundamental para o bem da cidade e não se lidera
com autoritarismo ou bandeirismo, ou favorecimento e casuísmo. Assim, como não
se defende um governo ou se lidera uma cidade com patrulhamento ou perseguição
política. Lamento que isto esteja acontecendo agora com o quero-quero. E
lamento por você e pela cidade. Esta política do ódio não ajuda em nada e
sequer sustenta qualquer governo. A pior fantasia que um governante pode ter
nos dias de hoje e seus assessores e correligionários também, é de que vai manter
o poder policiando, coagindo, contrangendo ou perseguindo as pessoas, seus
conhecidos, seus amigos ou seus colegas. Eu, por exemplo, conheci muitas
pessoas na administração passada. Criei amizades e desenvolvi muita tolerância inclusive.
Aprendi muito com os servidores públicos e vi eles fazendo esforços
desinteressados pela cidade. Atacar os servidores públicos ou os formadores de
opinião é um grande erro. E você é sim um formador de opinião. Traz informações
que muitos não tem e também levanta debates que outros não tem coragem de
levantar e isto é ótimo para cidade e para o povo da cidade. Você ajuda a
desafogar com o quero-quero o massacre que alguns sofrem e também os absurdos
que alguns são constrangidos a assistir em silêncio. Um governante
sábio não deixaria isto acontecer, porque isto é indefensável em qualquer
situação.
Quinto, pior que o maniqueísmo é
pretender estar acima dele, quando para isso se cometem erros e imprecisões -
dai você pula da frigideira para o fogo - quer dizer você acaba caindo no
simplismo. Dê a Cesar o que é de Cesar, mas não faça Cesar ter aquilo que não
lhe é de direito ou responsabilidade. Penso, também, que esta tua pretensão é
muito ruim para a política, porque o que você repete aqui é o erro de afirmar a
tese de que político é tudo igual, que é a mesma tese daqueles que são contra a
democracia, porque gostariam de ter um poder incontestável ou governar somente
com os sábios e os cientistas. Nós abandonamos esta doutrina faz muito tempo
já. Não porque ela não ajudou a construir o estado brasileiro ou gaúcho, mas porque
ela foi ultrapassada pelos tempos. Esta doutrina foi o Positivismo e o Partido
Republicano Riograndense (PRR) foi criado em 1882 com base nela e teve
hegemonia política no Rio Grande do Sul por muito tempo. De Júlio de Castilhos
a Getúlio Vargas. Eu e, provavelmente, todos os democratas deste pais, preferimos
os erros dos políticos e do povo que os elege, do que os erros que não podem
ser corrigidos, porque são cometidos por pessoas que tem poder absoluto ou
conhecimento absoluto das coisas e que, por isto, são incontestáveis ou
incorrigíveis. O tempo dos bacharéis e dos doutores já passou. Assim, para mim
a democracia permite o exercício do princípio de correção, sem que a gente
tenha que esperar o fim de uma dinastia, a morte de um gênio ou demagogo ou a
queda do muro de Berlin para fazer a história mudar. Toda eleição é uma
oportunidade para debatermos os rumos, os programas e mudarmos o que precisa
ser mudado, desde que tenhamos na eleição programa e debates para apreciar e discutir,
é claro. Mas você sabe qual era o programa do MOA? Tens uma cópia escrita dele?
Pois é!!! Todo mundo erra e todo mundo pode um dia acertar. A história da
ciência é uma coleção de erros que foram corrigidos ou descobertos. E na gestão
pública também é assim. Então não existe uma garantia de que ninguém vai errar,
mas o que se espera é que não se cometam erros já superados e um destes típicos
erros é começar uma administração sem um programa, somente com a vontade de
acertar. Eu acho isso uma coisa extremamente primária. Nenhum engenheiro
constrói um prédio sem projeto e já está na hora dos candidatos a prefeito
terem projetos e apresentá-los, porque quem está encomendando a casa que eles
devem construir é o povo, não seus correligionários ou suas entidades de
classe.
Sexto, eu não penso de forma maniqueísta
sobre coisa alguma, muito menos politicamente - se é esta a ironia que você
tentou imputar sobre mim. Ao contrário, conheço lobos e cordeiros de todos os
partidos e conheço águias e urubus também, não é porque eu sou filiado no PT
desde que me conheço por gente que eu ache que o PT é o céu ou o Deus encarnado
nesta terra. Tenho mais concordância com o programa do que com muitas pessoas
que estão nele - e hoje como sempre - não sou unanimidade no partido com minhas
opiniões e nem quero ser. Aliás, faço sim uma avaliação bem dura dos nossos
erros e não tenho mais necessidade de fazer isto exclusivamente no partido, até
porque muita gente do meu partido constrói projetos e promove ações de tudo que
é tipo sem – muitas vezes - nos consultar internamente também. Então não são as
avaliações, críticas ou debates externos que me amendrontam ou me intimidam. Ao
contrário, sempre que puder farei a crítica necessária e da forma mais honesta
possível. Mas temos que combinar sim uma única coisa aqui nisto tudo: não se
corrigem erros, cometendo mais erros. Sendo assim, para lá ou para cá, o erro
dos outros não pode ser justificativa para os meus erros, e, inversamente, os
meus erros não podem ser justificativa para os outros errarem também.
Sétimo, apesar de admirar René
Descartes, não defendo nenhuma tese dualista sobre coisa alguma. Não divido os
homens em diabos e anjos. E toda vez que faço uma contraposição, procuro apenas
tornar legíveis as diferenças e argumentar mais rapidamente, mas posso também
classificar e interpretar com mais detalhes estas diferenças.
Um exemplo disto é o que se
segue. Por anos acompanhei a história política de São Leopoldo, aproximadamente
desde 1974 e 1976 e mais tarde. Nos últimos 8 anos me dediquei a estudar esta
história em mais detalhes avançando até o século XIX, e ao primeiro período
republicano de 1890 a
1945. Isto é, passei da fase da opinião para procurar ter conhecimento sobre as
coisas que aconteceram nesta cidade. Aprendi com isto a respeitar muito mais
tanto o Olímpio Albrecht, quanto o Waldir Schmidt para ficar em duas pessoas
que fizeram política desde os anos 60 e 70, respectivamente. Assim, como
conheço também a trajetória inteira do Henrique Prieto, os papéis coadjuvantes,
importantes, mas passageiros, do Glodomiro Martins, Manoel Nunes, Ronaldo Ribas.
Conheci pessoalmente diversos lideres políticos e ex-vereadores de São
Leopoldo, conheci deputados de vários partidos passando por um Rosa Flores. Também
conheci pessoas notáveis das quais me lembro com muito respeito como o Noel
Maciel e também conheci diversos assessores políticos de muitas épocas. Sei,
por exemplo, da história da formação política do PL desde os anos 20 que levou
a Maria Emília de Paula a ser prefeita por um ano. E também sei que o André de
Alexandri foi quase um prefeito por um dia, o que foi o mandato mais impugnável
que já conheci na história política de São Leopoldo. Mas ele foi prefeito
administrativo. Aquilo foi uma proeza jurídica, política e social que só se
explica pela total hegemonia e supremacia real do Waldir no período e em todos
os poderes da cidade. Como diz um grande
intelectual do PMDB, que foi meu professor e é meu grande amigo: “Se pegar,
pegou”...e pegou. Estudei as crises que levaram, por exemplo, o PTB, em 1958-1959, a rachar entre Siegbert
Saft e Brasil Camoretto Gall e, também, conheço alguns detalhes de bastidores
da Ditadura Militar em
São Leopoldo. Por uma questão biográfica e muito particular minha,
tive sempre acesso e muitas vivências que me facilitaram a observação do que
ocorria tanto no cenário quanto nos bastidores e, ao mesmo tempo, sempre
procuro ampliar meus conhecimentos sobre a história política da cidade o que
envolve conhecer as instituições sociais e de classe da cidade também. Em
resumo, apesar de ter atuado no cenário e nos bastidores, respeito muito a história
política desta cidade e a única coisa que eu peço é que os novos, aqueles que
agora começam a ter experiência política, o façam com dignidade. E que os
velhos aproveitem a sua larga experiência para respeitarem os sinais na pista e
não incorrerem nos mesmo erros de outras épocas. Tenho a franca opinião de que
não há nada mais vergonhoso do que uma pessoa andar de forma arrogante na rua e
ser objeto da reprovação unânime dos seus concidadãos, como parece que vai
começar a acontecer com alguns logo, logo.
Por fim, minha oitava letra, é um
muito obrigado e vida longa ao QUERO-QUERO.
A democracia de São Leopoldo
agradece.
São Leopoldo, 17 de abril de
2013.
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