Powered By Blogger

domingo, 12 de janeiro de 2025

Nota sobre o Censo Demográfico 2022: Conselho Diretor do IBGE

 Nota sobre o Censo Demográfico 2022


O IBGE está realizando o Censo Demográfico 2022 de forma transparente, com vários mecanismos de controle, seguindo rigorosamente todas as etapas necessárias e imprimindo qualidade em todas as fases da operação. Até o dia 24 de janeiro de 2023, foram visitados cerca de 89 milhões de domicílios e recenseadas 184 milhões de pessoas.


Ressaltamos que os dois adiamentos do Censo, em 2020 e 2021, permitiram ao IBGE aprimorar alguns processos da operação. Um deles foi a realização de testes nacionais, uma prática inédita na Instituição e sempre destacada pelas equipes de campo do IBGE como uma boa prática. Os testes nacionais abrangeram pelo menos uma localidade em cada estado do Brasil. Foram visitados cerca de 40 mil domicílios, sendo recenseadas 111 mil pessoas naquela ocasião. Foi uma grande oportunidade de se testar com sucesso todas as etapas da operação, além de capacitar as equipes envolvidas e implementar melhorias nos processos de coleta e controle.


A qualidade da cobertura de um Censo é acompanhada durante a operação, por meio de indicadores do sistema de supervisão e de modernas ferramentas de geotecnologia, inéditas no Censo, além de retorno a campo para verificação in loco. O Censo 2022 conta ainda com a Pesquisa de Pós-Enumeração (PPE), feita por amostra de setores censitários, cujo principal objetivo é fornecer recursos para a avaliação da cobertura e da qualidade da coleta. A PPE tem início quando os setores selecionados estiverem completamente coletados e supervisionados pelo Censo. A divulgação da PPE está prevista no plano de divulgação do Censo 2022.


O período da operação se alongou fundamentalmente pela falta de pessoal, sobretudo para a coleta de dados. Em alguns municípios essa escassez foi consequência de mais oportunidades de emprego existentes no local. O IBGE envidou vários esforços para minimizar a falta de recenseadores: demandou medidas provisórias a fim de flexibilizar o recrutamento e permitir a contratação de servidores públicos aposentados; aumentou a remuneração dos recenseadores; implementou o pagamento de ajuda locomoção das equipes; e fez acordos com secretarias municipais de saúde e universidades.


O IBGE está dedicado a minimizar os efeitos do atraso na conclusão da operação censitária para a qualidade dos resultados. Ressaltamos que cerca de 65% da coleta das informações do Censo 2022 foi feita até o mês de outubro. Destacamos ainda que se trata de uma pesquisa com coleta eletrônica, o que reduz a possibilidade de erro durante a captação das informações, visto que as datas de referência da pesquisa fazem parte das perguntas inseridas no Dispositivo Móvel de Coleta (DMC). Ademais, existem perguntas de cobertura para verificação das informações, além da etapa de supervisão prevista, conforme salientado acima. Existe um sistema de supervisão muito abrangente e efetivo.


Embora não tendo o alcance desejado, a publicidade paga existiu. Em complementação, o IBGE se valeu, de forma inédita, dos veículos de imprensa através de um Plano de Comunicação desenhado para o Censo 2022, com objetivo de colocá-lo na mídia quase que diariamente, dando ampla divulgação a todas as etapas programadas: Processos Seletivos; Teste em Paquetá; Teste Nacional; Pesquisa do Entorno; Lançamento do Censo no Museu do Amanhã;  Início da Coleta Domiciliar; Acompanhamento da Coleta em territórios quilombolas e indígenas; Visita de Observadores Internacionais de 18 países;  Balanços Mensais da Coleta; e Divulgação dos Resultados Prévios. De acordo com o clipping contratado pelo IBGE, o Censo esteve na mídia em pelo menos 9 mil matérias veiculadas, no âmbito nacional e regional, desde o início da coleta. Cabe lembrar que todas as críticas publicadas pela imprensa já foram tratadas e discutidas em entrevistas coletivas e individuais promovidas pelo próprio IBGE, sempre comprometido a garantir a máxima transparência institucional.


Entre os inúmeros desafios do Censo 2022, destacam-se algumas mudanças estruturais na sociedade que impactam diretamente na operação, tais como: maior número de domicílios com apenas um morador, mudanças no mercado de trabalho, e questões relacionadas à segurança. Esses fatores têm dificultado cada vez mais o acesso dos recenseadores aos moradores. Salientamos que não é somente o Censo que sofre com a falta de acesso a parte da população, este fenômeno também vem sendo observado nas pesquisas domiciliares por amostragem.


No ano de 2022, a dotação orçamentária foi de R$ 2.292.957.087, sendo liquidados cerca de R$ 1,76 bilhão e inscritos em restos à pagar não processados aproximadamente R$ 484 milhões. Para o ano de 2023, a dotação orçamentária é de R$ 233.873.573.


Informamos que, diferente de Censos passados, os DMCs e os tablets foram adquiridos em parceria com o Ministério da Saúde, para o qual serão repassados ao final do Censo. O IBGE não arcou com os custos de aquisição destes equipamentos.


A colaboração dos agentes de saúde se deu também de forma inédita no Censo. Esses agentes estão plenamente aptos a trabalhar no Censo, pois, além de terem sido treinados e capacitados, são pessoas que conhecem o território com muita propriedade, visto que fazem este percurso diariamente em suas tarefas como agente de saúde. Além disso, possuem experiência de abordagem aos moradores, habilidade essencial na coleta. Destacamos que já durante o processo de treinamento ficou clara a capacidade desses agentes em lidar com o Cadastro Nacional de Endereços para Fins Estatísticos (CNEFE). Muitos desses agentes estão atuando em aglomerados subnormais, locais de difícil acesso, mas que eles já conhecem. Cabe esclarecer que esses agentes foram recrutados como recenseadores, seguindo todos os trâmites de contratação e capacitação previstos.


Não houve imputação de questionário, o que ocorreu foi imputação de pessoas nos domicílios, uma prática semelhante já utilizada no IBGE quando se divulgam resultados preliminares do Censo. Mais detalhes podem ser conferidos na nota metodológica divulgada com a Prévia da População dos Municípios com base nos dados do Censo 2022 coletados até o dia 25/12/2022.


Em 2022, assim como ocorreu em 2010, o resultado entregue ao Tribunal de Contas da União (TCU) foi um resultado não definitivo de população. No Censo 2010, os resultados tiveram a seguinte sequência de divulgação, conforme consta na página 673 da Metodologia do Censo 2010:


- Dia 4 de novembro de 2010: População Residente – Resultados divulgados no diário oficial da união em 7/11/10 (população entregue ao TCU) - 185.712.713 habitantes


- Dia 29 de novembro de 2010: População Residente – Primeiro Resultados do Censo 2010 - 190.732.694 habitantes


- Dia 29 de abril de 2011: Sinopse do Censo 2010 – Resultado definitivo de População do Censo 2010.  190.755.799 habitantes


O treinamento dos recenseadores é uma etapa importante, e o IBGE fez inovações no processo de capacitação dos censitários, através da combinação de treinamentos presenciais e ferramentas on-line (vídeos, ensino a distância, seminário etc.).


Para a elaboração do modelo de treinamento, foram consideradas estratégias que assegurassem a transmissão uniforme dos conhecimentos, bem como o uso prático do equipamento de coleta.


A operação de campo é complexa e exige muita coordenação e, principalmente checagem do trabalho realizado de maneira permanente durante a coleta. Os Censos anteriores tiveram suas formas de verificação e checagem da coleta, porém com menos recursos tecnológicos que estão disponíveis atualmente.


Em 2022, o processo de verificação do trabalho de campo mudou valendo-se da inovação tecnológica com a utilização de ferramentas de georreferenciamento. O Censo 2022 conta com modernos instrumentos de geoinformação e ferramentas de controle, alcance, cobertura e acompanhamento digital, em tempo real, com capturas das coordenadas de GPS, permitindo altíssimo nível de precisão operacional - via Dashboard Censo 2022; SIGC (Sistema Integrado de Gerenciamento e Controle); Sispac (Sistema de Plano de Análise do Censo Demográfico); PGI (Plataforma Geográfica Interativa); SIG-RC (Sistema de Informações Gerenciais do Ritmo da Coleta). Salientamos que o sistema de supervisão do Censo 2022 passou por um processo de atualização permitindo acompanhamento muito mais tempestivo da operação.


No Censo 2022 os recenseadores estão indo a campo com DMCs com chip de telefonia, diferentemente do que ocorreu em 2010. Esta tecnologia permite acompanhamento praticamente em tempo real, no qual recenseador pode transmitir as informações imediatamente após coleta de cada questionário e ter seu percurso registrado. O controle das coordenadas e trajetos dos recenseadores possibilita uma verificação inédita da cobertura geográfica do Censo, além de outras variáveis que podem ser monitoradas durante a operação.


Até o Censo 2010, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) não era realizada em anos de Censo, por se entender que a estrutura do IBGE não comportava as duas operações concomitantes. Em 2022 a PNAD Contínua foi mantida em função da sua característica conjuntural que, portanto, não deve ser interrompida em anos de Censo. Vale lembrar que a PNAD Contínua é uma pesquisa mais abrangente que a antiga PNAD.


Alterar o calendário da pesquisa não estava previsto, entretanto, foi necessário visando garantir a qualidade da pesquisa e a realização do Censo simultaneamente. Destacamos que o adiamento foi comunicado com antecedência no Portal do IBGE e que não acarretou quaisquer prejuízos à pesquisa. O adiamento da PNAD Contínua não é um fato inédito, tendo ocorrido em período de greve dos servidores; de mudanças na estrutura de sistema e de questionário da pesquisa; e por último, no período da pandemia de Covid-19.  A pesquisa foi a campo nos 3º e 4º trimestres de 2022, trazendo, além do seu núcleo básico e dos módulos tradicionais, os módulos especiais: 3º trimestre - Desenvolvimento Infantil e Pessoas com Deficiência; 4º trimestre - Tecnologia da informação TIC, Trabalho através de plataforma e Teletrabalho. Os resultados de mercado de trabalho do 3º trimestre já foram divulgados e os referentes ao 4º trimestre serão divulgados no dia 28 de fevereiro de 2023. Será uma divulgação histórica com a apresentação da PNAD Contínua 2012-2022, uma retrospectiva, além das divulgações tradicionais: Divulgação Mensal referente ao trimestre móvel terminado em dezembro, Divulgação Trimestral do 4º trimestre de 2022 com dados desagregados por UF. No dia 24 de fevereiro de 2023 será divulgada a Renda domiciliar per capita com base nos dados da PNAD Contínua.



Conselho Diretor do IBGE

24 de janeiro de 2023

O NEVOEIRO: STEPHEN KING

O NEVOEIRO: STEPHEN KING

O PESSIMISMO E O DESESPERO: DUAS VACINAS VINDAS DIRETAMENTE DO REINO DA FICÇÃO 


Eu recomendei muito que as pessoas, esses seres humanos aqui, hora amigos, hora conhecidos, ou apenas e fortuitamente próximos,  vissem o filme O Nevoeiro (2007, The Mist, também traduzido como O Nevoeiro Misterioso) baseado em um conto homônimo de Stephen King. 

Fiz isso, porque nele fica exibida uma situação cujos elementos da ficção distópica encenada no cinema parecem estruturais nesses casos:

Anomia e ausência de autoridade, disputa de lideranças e grandes controvérsias e dificuldades nas tomadas de decisão e nas escolhas coletivas; violências e  a recorrência de paranóias que levam às más escolhas; os apelos recorrentes a um salvacionismo transcendental e supra humano  e a credulidade exacerbada em uma entidade superior reguladora da moral, bem como recurso  ou a submissão ao fatalismo e a uma profunda  culpa moral,; o aparecimento do impacto desorientados e desesperador do medo atávico da morte violenta, desespero, impaciência, ansiedade e atitudes impulsivas ou compulsivas, 

Enfim, o filme mostra ou exemplifica claramente o quanto o Pânico bloqueia a obtenção de informações e a estabilidade emocional dos agentes e, por consequência, como o desespero de causa no mais das vezes se mostra um péssimo conselheiro, um bloqueador de escolhas de alternativas melhores e um guia de ações imprudentes e não refletidas que só agravam a tragédia. 

Assim, temos em O Nevoeiro  um filme didático e paradigmático que pode ser muito bem usado em sala de aula e para a nossa reflexão em tempos de Covid e de Pandemia Global, pelo menos para tentar recomendar que mais pessoas mantenham suas cabeças nos seus devidos  lugares, sobre o pescoço, como diziam as avós.

Ou também, como eu costumo dizer ou comentar ou pensar, quando as pessoas ficam irritadas em filas de supermercado e destilam todo seu fel: se com a impaciência em enfrentar uma mera fila ele ou ela já está assim, imagina o que fará  este ser no momento em que as coisas ficarem realmente feias na nossa vida e para a nossa sobrevivência? Vão acabar batendo com as suas cabeças na parede. Como aliás infelizmente e tragicamente muitos fizeram ao longo da Pandemia e com consequências muito infelizes, tristes e trágicas. 

Nós devemos manter a calma e evitar isso e sempre fazer um esforço ou buscar alguma habilidade para evitar e mitigar isso, suas causas e suas consequências.

CORONA E HISTÓRIA - DAS NUVENS ÀS PROFECIAS - Artigo de 24 de março de 2020.

 CORONA E HISTÓRIA - DAS NUVENS ÀS PROFECIAS


Artigo de 24 de março de 2020.


Olha, eu não me fiaria nisso de que após esse grande Fenônemo, tudo vai voltar ao normal. Não vejo um céu limpo e cristalino à vista para nós hoje. Eu vejo esse Tsunami chegando - a minha sensação e imagem recorrente de que estou vendo uma onda gigante se aproximar e destruir tudo, não desaparece mesmo.

Essa grande Pandemia Global do Corona Vírus ou Covid 19, não me parece deixar nenhuma ou alguma pequena possibilidade de que tudo vá voltar ao normal ou ser como era antes. Talvez alguns esperem isso mesmo, mas isso é uma ilusão para mim.

Alguns por pessimismo de que o mundo vai continuar exatamente tão desigual e perverso como era antes e que não adianta ter esperanças. E outros de que vão continuar levando a boa vida que levam, apesar de reclamarem e apurrinharem a vida de muitos, seja dominando eles, seja discriminando, seja explorando. O mundo tem sido muito perverso e injusto com milhões de seres humanos e não por acaso, mas por decisão de poderosos e também de humildes que decidem sobre o mal dos próximos ou dos desconhecidos.

É interessante que isto esteja ocorrendo também em tempos dos filmes Bacurau, Parasita e Coringa, em que excluídos, explorados e estigmatizados pela tal sociedade evoluída e institucional se revoltam contra ela. Coringa é um símbolo de um estigma e Joaquin Phoenix usou uma expressão no Oscar que merece ser usada aqui: temos que dar voz aos que não podem falar. Pois esse vírus acaba, com o seu grande impacto, tirando a voz de muitos, mas dando hora e lugar para a voz não da economia, do lucro, da riqueza ou ao sucesso de poucos, mas dando voz a luta pela vida de todos. Como essa equação não tem sido bem feita, parece que ela está sendo imposta pela natureza - alguns diriam que Deus quis assim ou fez assim. Cada um com sua doutrina pode bem entender o que eu digo aqui.

Todos os cenários, modelos e análises, devo registrar, indicam um grande golpe evolutivo e seletivo sobre a nossa espécie e a nossa cultura.

Esse fenômeno tem, portanto, uma grandeza muito superior a Peste Negra na Europa ou a Gripe Espanhola ou a todas as catástrofes que ocorreram desde o início do século vinte pelo mundo. Esse fenômeno tem a grandeza de uma guerra mundial, uma glaciação, um tsunami, um meteoro e/ou um salto evolutivo na espécie. Eu já chamo ele de terceira guerra mundial porque é de fato global e atinge a totalidade dos países e porque requer a mobilização de um grande exército de trabalhadores da saúde, de governos e da iniciativa privada para lhe fazer frente. Além disso, o modo como o processo tem sido recebido com um misto de incredulidade - não pode ser e não é possível - e de pânico - isso é surreal, é um filme de terror ou um grande pesadelo, o que só prova o seu assombro em nós. Esse misto de negação e espanto, cegueira e pânico. 

Vejam, não faz muito tempo aqui no Brasil estávamos em uma guerra iminente com ameaças e arroubos e violências de parte de uns e declarações de resistência de outros. De tal modo que estávamos em tempos de guerra e o comportamento litigante, odioso e raivoso, o impulso de haters e outros estava em alto e elevadíssimo grau. Sim, eram os tempos de guerra. E curiosamente também tempos em que – como em toda guerra - mais uma vez a verdade se torna a primeira vítima com a proliferação desavergonhada e na maior cara de pau de Fake News e de militantes de Fake News para derrubar governo, prender e matar pessoas, eleger presidente com mentiras e destruir direitos e o patrimônio público nacional na maior cara de pau e era isso.

Mas esse fenômeno que bota uma Guerra efetiva e real em tela não é de origem política, por mais que tenhamos uma proliferação de teorias de conspiração para todos os gostos, terrores e paranóias, o fenômeno é essencialmente de natureza biológica, tem sua origem biológica, mas tem tal grandeza que - como a AIDS nos anos 80, possui a virtualidade de ter impacto não sobre um segmento ou um tipo de comportamento sexual ou acidental - sexo, uso de drogas injetáveis e transfusão de sangue foram as causas da proliferação da AIDS, o Corona Vírus se dissemina por contato físico cordial ou proximidade, e a deposição do vírus em superfícies as quais se tem contato com as mãos e por transmissão aérea pegando indiscriminadamente quase 80% da população que será sintomática ou assintomática.

O Coronavirus tem pelo seu nível de contágio social ou comunitário consequências culturais sobre todos os segmentos e setores sociais. Não tem muito como fugir dessas consequências também porque provoca isolamento de todos ou da grande maioria, mas também porque parece mudar as formas das relações de confiança e proximidade e, portanto,  as distâncias e os parâmetros de proximidade e confiança entre nós.

Ao ameaçar de colapso os sistemas de saúde, tendo parte da sua letalidade associada ao fato de não ter cura e de também não se ter suficientes equipamentos, recursos humanos, leitos e mesmo sangue para transfusão, como tratar todos para enfrentar seus danos. E isso não é um privilégio de um ou outro país: nenhum país possui os meios para atender a todos os sintomáticos leves ou críticos. A única vantagem possível contra ele que é a prevenção e o isolamento tem sido negligenciada na maior parte dos países pelas razões políticas mais mesquinhas e também por uma certa ganância econômica mais comezinha que é a ganância do curto prazo. Vejo pessoas pensando na feira da semana e esquecendo completamente o resto de suas vidas pela imediatez de continuar como está e “ir levando assim mesmo”. Além disso, temas as pessoas e aqueles países onde a ignorância grassa ou possui algum poder.

Não é pouca coisa mesmo por isso tudo o impacto dele. O fato de se disseminar completamente e globalmente deveria gerar maior percepção nas pessoas, mas tem ocorrido negação dele. Talvez isso seja um fenômeno ao que Freud chamou de impulso de morte ou tanático que veio assaltar de novo O Mal Estar da Civilização ou criar esse mal estar, mas eu percebo algo muito semelhante aquela negação trivial, costumeira, habitual e corrente de muitas pessoas que sabem que devem mudar algo, uma conduta ou tomar uma decisão, mas que não o fazem porque tem estão muito adaptadas a situação que vivem, as condições que vivem e aos seus hábitos e rotinas – por piores que elas sejam aos olhos dos outros – e, então, esse típico e  certo comodismo a uma determinada situação, mantém tudo como está. Se mudar estraga – eles dizem, não pode melhorar eles pensam e assim seguem vivendo mal, se relacionando mal - com as coisas, as gentes e a natureza, e, portanto, fazendo o mal para si mesmo e para os outros.

Porém, é preciso lembrar também que nem sempre as testemunhas da história tem noção ou a dimensão dos fatos que vivem. Já usei esse exemplo em Lula é um gigante. Para mim, porém, a cada dia que passa e que ocorre a evolução dos acontecimentos, e eu sinto que mudamos definitivamente de era histórica ou grande período histórico em dezembro de 2019. E o nome dessa era pouco me importa agora. E quanto mais as pessoas lhe negarem esse estatuto, parece que mais evidente fica que tal tipo de negação é apenas a confissão de um crime, de uma culpa, de uma responsabilidade de todos.

E é uma curiosidade assaz interessante - por falar em responsabilidade de todos, de quase todos ou da maioria - que ele tenha ocorrido justamente no momento em que aqueles que mais defendem o neoliberalismo que é um liberalismo mais radical e individualista, estão no poder no Brasil e nos EUA com uma combinação de ultra direita, fanatismo religioso, militarismo e xenofobia e fascismo.

Deve ser ou parece ser uma resposta da natureza impondo um limite na liquidação de parte da nossa espécie. Tipo assim: agora chega, assim não dá mais!

Ponto Final.


P.S.: teria um post scriptum gigantesco para escrever aqui cinco anos depois. Mas não tenho essa disposição agora. O artigo é datado, porém, do inicio da Pandemia. Só por isso, acredito que vale a pena postar aqui. nestes cinco anos minha vida, de minha cidade e estado, do Brasil e do mundo, mudou muito.  

sábado, 11 de janeiro de 2025

O Ator e as Bonecas - fragmentos de um esboço

 O Ator e as Bonecas 

Não tenho uma ideia clara sobre como funciona exatamente a tradição do Teatro Japonês, mas me veio uma imagem a mente a respeito de uma história que me pareceu muito interessante.

Um ator japonês para economizar recursos em suas apresentações dramáticas resolveu utilizar duas bonecas para contracenarem em suas peças, sem dispender mais recursos com isso.

Tudo corria bem até que ele chegou a uma velha aldeia para sua apresentação. Divulgada a peça a ser apresentada Entre dois Amores: a paixão, e eis que irá se iniciar o espetáculo.

A música se inicia e lentamente as luzes. Velas são desobstruídas lentamente e se descortina um cenário decorado com motivos niponicos, desenhos de cerejeiras e tecidos de sedas coloridas com pinturas de bambus ao fundo do palco e um Pagode estilizado ao sope de uma montanha muito semelhante ao Fuji.

Primeira cena e entra o cavalheiro em um monólogo de sua solidão e desalento.

Um homem jovem e majestoso, porém infeliz. Seu semblante é marcado pela maquiagem.

Uma jovem canta ao fundo enquanto ele perora num monólogo sobre seus flagelos pessoais.

Abandonado na cidade grande e sem nenhuma profissão além de carregar caixotes e sacas no porto, ganhando uns poucos trocados. Suas roupas, entretanto são elegantes e finas. Veste um kimono de seda azul e vermelha com dragões nos braços e tem uma bandana branca à cabeça com um hexagrama conhecido.

Ele caminha para um canto do palco e se senta sob uma cerejeira, após carregar muitos caixotes da ponta do palco ao fundo, em algo que parece um barco. 

Após alguns resmungões, descobrimos também que ele abandonou a cidade grande e voltou para a aldeia em que nasceu e onde perdeu tudo um dia. Quer recuperar tudo e para isso medita sobre como disfarçar melhor seu desalento e sua falta de um nome de família para contar quem é.

Ele profere nomes e vai descartando opções. Logo se decide e se ergue para enfrentar a vila para onde voltou.

Ao caminhar pela via principal da aldeia percebe que ninguém lhe reconhece e se pergunta porquê? Afinal não mudou muito e está até mais esbelto devido aos constantes exercícios de seus trabalhos anteriores.

....

A POLÍTICA, O ATO E O DISCURSO: ENTRE HOMENS E MULHERES, MONSTROS

 A POLÍTICA, O ATO E O DISCURSO: ENTRE HOMENS E MULHERES, MONSTROS 

Em política, talvez mais do que em qualquer outra atividade humana, o discurso é marcado por um tipo muito específico de ato de fala no sentido bem definido por Austin e explorado por muitos outros linguistas, é um performativo. Em política, ainda que alguns acreditem fazer somente parole como Jack Sparrow, dizer é fazer. 

Uma das consequências disto é que podemos avaliar esse tipo de discurso sob vários aspectos. Primeiro, se é um discurso verdadeiro e se expressa alguma intencionalidade positiva, cujas consequências são virtuosas ao final. Segundo, se é um performativo bem formado e bem feito. Terceiro, se há alguma consistência moral ou se é virtuoso, expressando não somente um exercício retórico - a parole sedutora ou enganadora, mas sim alguma qualidade socialmente virtuosa e que possa ser reconhecida enquanto tal. 

Assim, políticos e políticas apresentam performativos em seus discursos e nestes não somente apontam para a realidade, mas sob análise mais apurada, apontam para si mesmos. Ou seja, acabam colocando e exibindo uma circunstância em que parecem estar julgando aos outros, mas também estão desafiando os outros a lhes julgarem. 

Não se trata apenas do Peito Aberto ou do Telhado de Vidro, mas sim de um confronto consigo mesmo ao espelho. 

Acredito que muitos políticos compreendem bem isso e que a grande maioria percebe essa dimensão muito rapidamente em suas vidas públicas. Sabem que estão se expondo ao julgamento dos demais e que podem até seduzir, gerar simpatia, conquistar, mas com a maturidade, compreendem também que não podem enganar e que estão sendo julgados em casa fala, em casa ato falho e em cada um dos seus exercícios de retórica ou performativos.

Alguns, infelizmente, consideram os eleitores e as eleitoras com um nível de desrespeito e desconsideração que fica claro em seus discursos que pretendem enganar os eleitores ou ludibriar eles. Estes para mim consistem de um grupo que vou chamar de Monstro. Com uma nota muito característica, eles jamais conseguem se compreender nessa tipologia. Tudo se passa como se eles tivessem uma opacidade ou o transparência essencial. O problema de coerência ou monstruosidade deles só nos aparece quando lhes observamos não agora, mas a partir de suas trajetórias e peripécias de trajetória. E essas peripécias podem ser chamadas de contradições. E essas contradições aparecem em seus performativos.

Dentre os performativos mais contraditórios que conheço, dentre os muitos, está aquele que considero o mais complexo e o mais próximo da loucura ou do auto-engano, é aquele do agente que cobra expressiva e sistematicamente moralidade dos demais agentes, cobra compromisso dos demais agentes, cobra coerência dos demais agentes, cobra honestidade dos demais agentes, mas no mais das vezes todas as suas decisões ou medidas decisivas apontam para uma falta de moralidade absurda, uma falta de compromisso estrondosa, uma festa de incoerências e ausência de reciprocidade que beira a uma relação sem escrúpulos e altamente instrumental e desonesta com os demais. 

Não se sabe se é uma insanidade ou um modus operandi de alguma forma de perversão moral arraigada.

A impressão que passa é que este tipo de agente acredita que poderá persistir nessas ações sem ser flagrado na sua falta de escrúpulos e de compromissos morais com os demais. 

Um professor chamava de estultícia esse tipo de conduta, porque presume enganar a todos, mas que porém, parece estar a enganar principalmente a si mesmo. Curiosamente, esses tipos de consideram astutos e espertos nas relações com os demais. A tal ponto de se ufanarem ou regozijarem perante os demais quando lhes deixam espantados.

Tudo bem que política não é o casamento da tua filha ou do teu filho. Não é nem mesmo o teu próprio casamento. Porém, ficamos espantados sim com a desenvoltura dos monstros.

O sujeito se comporta como Dr. Jekill e Mrs Hyde sem ter nenhuma consciência um do outro. 

Diríamos que a consciência de um poderia atenuar a monstruosidade do outro, porém, na forma posta tanto a face angelical é demoníaca quanto a face demoníaca persiste sendo mais e mais monstruosa pela forma como o mesmo age sistematicamente quando confrontado com os fatos. 

A retórica canhestra desse tipo de sujeito e tal que você se põe a perceber a forma como ele tenta encurralar seus interlocutores e desafiar eles moralmente, mas quando olha com mais atenção percebes que ele não tem simplesmente compromisso algum com moralidade, relações ou com a verdade.

Não fico triste ao constatar isto numa personagem real. Ao contrário, percebo o quanto ele se enquadra numa tipologia extrema e me surpreendo muito ao perceber o quão inacreditável é essa descrição sem o seu exemplar que a demonstra.

TUDO PASSA

 Vanitas vanitatis


"Uma geração vem, e outra geração vai, mas a terra para sempre permanece. E nasce o sol, e põe-se o sol, e volta ao seu lugar, de onde nasceu.”


Eclesiastes, 1 4-6.


Tudo passa. 


Tudo tem seu tempo.


Tempo de nascer.


Tempo de viver.


Tempo de partir.


De nada vos adianta toda essa vaidade e veleidade.


Nada restará de ti digno de lembrança.


Queres deixar tua marca, mas por mais profunda e segura que ela te pareça agora, perecerá.


A natureza leva tudo em eternas ondas sucessivas e repetidas em ciclos imprevisíveis.


Nada é impossível, tudo pode acontecer.


Acautela-te, prepara-te e seja sereno.


Enfim, tudo passa.

OS PRÓPRIOS SONHOS - THOREAU

 “Com a minha experiência aprendi pelo menos isso: que se uma pessoa avançar confiantemente na direção de seus sonhos, e se esforçar por viver a vida que imaginou, há de se encontrar com um sucesso inesperado nas horas rotineiras. Há de deixar para trás uma porção de coisas e atravessar uma fronteira invisível; leis novas, universais e mais abertas começarão por se estabelecer ao redor e dentro dela; ou as leis velhas hão de ser expandidas e interpretadas a seu favor num sentido mais liberal, e ela há de viver com a aquiescência de uma ordem superior de seres. A medida que ela simplificar a sua vida, as leis do universo hão de lhe parecer menos complexas, e a solidão não será mais solidão, nem a pobreza será pobreza, nem a fraqueza, fraqueza. Se construístes castelos no ar, não terá sido em vão vosso trabalho; eles estão onde deviam estar. Agora colocai os alicerces por baixo”.

Henry David Thoreau, “Walden” ou “A Vida nos Bosques”

MEDO E SOLIDÃO - NIETZSCHE

 O homem medroso não sabe o que é estar sozinho: atrás da sua cadeira há sempre um inimigo. O valor de um homem mede-se pela quantidade de solidão que lhe é possível suportar. Ninguém aprende, ninguém aspira, ninguém ensina a suportar a solidão. Ser independente é coisa de uma pequena minoria, é privilégio dos fortes.


Friedrich Nietzsche






TRÊS MANEIRAS DE VENCER A SOLIDÃO - ERICH FROOM

 “Há três maneiras pelas quais o homem tenta vencer a solidão: sexualidade, conformidade e atividade criativa. No primeiro caso, o resultado é uma sensação crescente de isolamento, porque o ato sexual, sem amor, nunca preenche o vazio que divide dois seres humanos, se não absolutamente momentaneamente.

A solução mais comum escolhida pelo homem é juntar-se ao grupo. Se eu for igual aos outros, tanto em ideias quanto em costumes, não posso ter a sensação de que sou diferente. Estou seguro: salvo do terror da solidão. A união alcançada pelo conformismo não é intensa nem profunda; é superficial e, por ser fruto da rotina, é insuficiente para acalmar a ansiedade da solidão.

Uma terceira forma de alcançar a união é a atividade criativa: se o agricultor cultiva o grão ou o pintor pinta um quadro, o homem junta-se ao mundo no processo de criação. Isso, no entanto, só se aplica ao trabalho produtivo, para o trabalho em que desenho, produzo, vejo o resultado do meu trabalho. Mas no processo de trabalho moderno, o empregado, um anel de uma cadeia sem fim, é um apêndice da máquina ou da organização burocrática."

"A arte de amar"

Erich Fromm 1900_1980

Psicanalista e psicólogo social alemão.

UMA COISA DE CADA VEZ - TUDO AO MESMO TEMPO, AGORA

 UMA COISA DE CADA VEZ 

TUDO AO MESMO TEMPO, AGORA

A aplicação da Teoria do Caos, se é que existe uma teoria do caos apenas, a domínios distintos, pode fazer à tona desafios epistêmicos, morais e políticos que são simultaneamente cruzados com questões sobre o que sabemos, como devemos agir ou como esperam que nós devemos agir e o que é o bem comum ou como realizar e decidir a natureza do bem comum com alguma concordância entre os fins e os meios para atingir ele. 

Isso ocorre porque, por motivos de certa forma psicológicos, como insegurança, pânico perante a incerteza, desespero e também ansiedade, perante certa ambiência instável e imprevisível, bem como, pela rigidez como o paradigma racional moderno impõe uma certa forma de pensar, um método de pensamento e de organização e sistematização das ideias, cujo hábito e preferência está consolidado na nossa cultura ocidental e nos nossos sistemas de interpretação do mundo e da ordem ideal das coisas e dos acontecimentos. 

É um desafio razoável seguir na contramão dessa corrente que marca o pensamento e a ação no mundo ocidental.

Já foi dito que um paradigma só muda pela decadência ou falta de força de reprodução dos seus modelos, não tanto pela ineficácia objetiva, mas sim pela insatisfação ou inquietação subjetiva dos agentes. 

O desejo de ter mais êxito ou eficácia também é acompanhado de, vez por outra, um certo impulso para a mudança. Tal coisa, porém, não ocorre sem resistências ou barreiras culturais e políticas.

O MERCADO

 O mercado despreza, em seus juízos, a diferença crucial para o desenvolvimento econômico e a geração de riqueza, dos investimentos públicos em todas as áreas. Cabem diversos exemplos aqui. A leitura de viés da economia, da política, de uma cidade, estado ou país continua produzindo os pseudo sabichões e uma gama de consultores que são completamente incapazes de produzir políticas e estratégias para cidades, estados e países. A maior prova disso é que todos eles sem exceção, quando assumem postos nas estruturas estatais, contaminados por suas crenças carregadas de viés e distorção da realidade, são incapazes de promover desenvolvimento e incrementar a economia de cidades, estados e países. Cansa ouvir a mesma ladainha de sempre vindo deles, principalmente porque permanecem prisioneiros de uma visão recessiva e pessimista das dinâmicas econômicas induzidas pelo estado. Todos que avançam sobre pautas progressistas acabam dando certo. O problema no meio desse caminho é o nível de contaminação dessa leitura paralela sobre a opinião pública. E assim as administrações vivem ultimamente nessa gangorra entre recessivos e progressistas, com consequências nas cidades, estados e países.

FRAGILIDADE - CLARICE LISPECTOR

 "Você não precisa esconder sua fragilidade,

basta ter cuidado para quem você mostra, pra quem você dá o que há de mais lindo em você.

Você é uma alma pura e, assim como a arte, não é para todos."


Clarice Lispector

Soneto 14 - William Shakespeare - mais uma versão

 Soneto 14 - William Shakespeare


Não arranco das estrelas os meus juízos

Mas me meto a pensar n'alguma astronomia

Não que veja a sorte e o demônio e seus avisos

Nem as pragas, as estações e epidemias

Nem tenho a fortuna de ver os minutos

Nem pontuar os raios, as chuvas e as ventanias

Ou aos príncipes dizer coisas boas

Olhando aos céus com atenção

Mas dos teus olhos, sim, eu tiro saber

E, esses astros constantes, nos quais leio esta arte

Como a beleza e a verdade fazem crescer em mim

Se a tiveres em ti há de vingar


   E se for assim, eu te prevejo

   O belo e o verdadeiro contigo terão fim

ESCRITA AUTOMÁTICA DOS EDITORES DE TEXTO

 ESCRITA AUTOMÁTICA DOS EDITORES DE TEXTO


A gente, a medida que as técnicas, tecnologias e aplicativos avançam, se depara com surpresas e novidades interessantes.

Agora, temos um editor que sugere palavras diretamente no editor de whatsapp e em outros. 

Tu vai escrevendo e na barra logo abaixo vão aparecendo as sugestões de palavras.

Eu não fico chateado com isso. Já faz muito tempo que escrevo escolhendo mentalmente as palavras, numa velocidade que me surpreendeu muito no começo, lá atrás nas primeiras experiências de escrever sob encomenda ou em colaboração com jornalistas, advogados, técnicos e outros. A minha imaginação coloca uma palavra e logo tenho uma coleção de sinônimos para escolher em mente. Sei que isso não ocorre só comigo. Deve ser comum a muitos escritores e escritoras de todo tipo.

Minha experiência de escritura é, então, também um mergulho nos sinônimos e nas constelações ou cenários de sentido de cada uma das palavras, substantivos ou adjetivos que utilizo ou escolho. 

Sempre tive certo fascínio por descobrir novas palavras ou refazer texto em diversas versões. Sou um revisor permanentemente ativado. Imagino que tradutores e tradutoras e poetas tem o mesmo tipo de experiência também. 

Mas veja.. essa forma dinâmica de escrever. Ela nos fala tanto como é melhor escrever, dando opções mentalmente ou na barrinha, que quando o texto fica pronto, ficamos desconfiados e com sérias suspeitas de que não foi a gente que escreveu isso. É um conflito de autoria dentro da gente. 

Agora, com esses corretores de texto e que completam nossos textos a coisa fica mais séria ainda e mais interessante, como assoprou aqui agora, na minha primeira versão desse texto, o editor textual do Facebook, a gente parece cavalo de santo. O santo baixa na gente e a gente faz, diz e escreve o que ele quer. 

Mesmo por linhas às vezes tortas, que tentamos caprichar para ser um pouco originais e diferentões, não adianta. 

Porém, tem a parte boa, o texto fica redondinho. Salvo com os escritos prolixos, como os meus. Aos lacônicos favorece a precisão.

P.S. a ideia de escrever sobre este assunto surgiu de um comentário sobre o texto da escritora Livia Garcia-Roza , em que ela aponta essa estranha ou interessante autonomia ou autoria da linguagem sobre os escritores. 

A gente começa a escrever com uma ideia e quando vê a própria linguagem e, muitas vezes, as personagens nos levam em outra direção. Muitos escritores e escritoras já falaram sobre o fato de que algumas personagens e também temas parecem lutar com quem escreve em busca de sua auto-realização ou objetivos próprios. Michel Foucault, aliás, aponta para o fato de começarmos a escrever e sermos levados por um curso de pensamento para certas direção que antes não estava em nossos planos ou perspectivas iniciais.

SIGNIFICADO E USO - ANOTAÇÃO

 Determinar e estabelecer o uso correto de uma expressão, palavra ou sinal nos escapa ao alcance ou mesmo necessidade, pois já usamos compreendendo a sua aplicação e isso sem sequer lembrar como aprendemos a usar essa expressão, palavra ou sinal.

É isso que quer dizer com o significado está no uso. 

Já estou usando tal palavra e assim sei já o seu significado ou subentendo ele em uma rede de significados ou num contexto de uso que pode ser chamado de jogo de linguagem.

Já jogo esse jogo compreendendo toda a sua rede de significados e sentidos. O que inclui regras que desde um "sempre" indeterminado sei aplicar, seguir e ensinar.

Essa compreensão é como uma espécie de limbo do inconsciente. Recorro às palavras que me habitam. Uso o significado delas que está em rede em minha compreensão.

PAUL AUSTER - RIP - O MUNDO SEM VOLTA

 Paul Auster ( 1947-2024 ). 





O mundo sem volta

Lá se vai um escritor que parece fazer parte integrante das nossas vidas. Parte integrante do nosso mundo e do modo como somos obrigados a ver ou aceitar nosso mundo real e objetivo em sua fusão ou confusão com nosso mundo imaginário e ideal, com nosso mundo subjetivo cheio de janelas e portas, por onde a luz entra e as coisas saem e entram, caminhando ou pulando, voando ou fulgurando.

O nosso mundo comum com Paul Auster é aquele mundo que nos impressiona e assusta, mas que também nos toca suavemente e delicadamente com uma previsão tão aguda e suave quanto uma vacina ou injeção, quanto um raio ou trovão ou o murmurar das ondas do Oceano ou o tilintar das águas de um córrego, da chuva, de uma cascata ou corredeira de um curso de água. Um curso de água sem volta, que passa somente uma vez, como a vida.

O mundo da chuva redentora e da enchente arrasadora. Sim esse mundo maravilhoso e tenebroso. Cujas dupla face ou outra face precisa ser aceita sem olhar para nada mais transcendente que nossa própria consciência de leitor ou leitora, escritor ou escritora. 

Paul Auster, cujas obras e experiências pessoais, portanto , pertencem ao nosso mundo interior e exterior. Por testemunho ou experiência, por leitura ou escritura.

O mundo cheio de surpresas maravilhosas e aterradoras. O mundo do amor relâmpago ou eterno, cuja ficção parece ser um mero espelho diminuído e comezinho. O mundo em que o real é mais surreal que o sonho, em que o pai tem dupla face, conhecido e desconhecido. Em que a interpretação tem longa duração ou nada.

O mundo em que a decepção, a sorte, o destino, a liberdade, o caminho sem volta, a rua sem saída e a perda irreparável precisam ser aceitas, podem ser resmungadas ou festejadas, defendidas ou desejadas, mas em que o grande jogo da sorte e do destino, da proteção e do azar jogam com nossas vidas sem dar a mínima para nossas vontades. O mundo em que precisamos suspirar e compreender, olhar mais de perto, desejar e abandonar, enfrentar ou fugir sem temor ou culpa. 

O mundo do homem e da mulher livre e também do homem e da mulher escravos de crenças e preconceitos, em que as escolhas por mais comezinhas e passageiras acabam sendo definitivas e decisivas e sem volta, no return, no regress, no flashword.

P.S.: Em 1 de maio, aulas suspensas e logo mais a grande enchente atingiu muitos de nós no RS. São Leopoldo e RMPA, minha casa e nossa escola. Vejo agora essa sensação de perda do mundo ou de um mundo perdido e sem volta em todo o seu sentido mais amplo possível. 

PAUL AUSTER - ANIVERSÁRIO 3 de fevereiro de 2024

 Paul Auster - Aniversário 

Um dos textos mais incríveis que já li sobre o próprio pai e a paternidade, foi escrito por Paul Auster, nascido em 3 de fevereiro de 1947 e que hoje completa seus 77 anos. Recomendo muito.

Em sua obra A invenção da solidão, ele nos põe frente ao enigma da paternidade em duas direções, a do próprio pai e da sua relação de pai com seu filho. Constrói uma narrativa não somente ilustrada, erudita ou cheia de referências, mas principalmente com um sentido de transcendência e profundidade que nos toca como filhos e como pais. 

É muito revelador também do oculto ou daquilo que parece permanecer em segredo para todos nós nessa relação e que só se revela quando enfrentamos a paternidade sem temor ou culpa, apenas com a luz da revelação e os olhos da aceitação que só o desejo de compreensão, mais do que explicar nos permite acessar. É uma viagem para o outro em nós, nosso próprio pai e o pai que nos tornamos.

Feliz aniversário!

Gratia ao Luisinho, o meu editor favorito por me lembrar dessa efeméride hoje. @antoniopaimgomes

O cântico escolhido para está homenagem e lembrança tem o timing da conexão lenta e dramática que só ocorre quando a reflexão se defronta com o sentimento, ou quando o sentimento nos leva a reflexão sensível.



P.S.: texto escrito no aniversário do escritor. Algum tempo depois ele veio a falecer, no mesmo ano. Adiante mais uma postagem sobre um tema que em 2024 ficou muito mais caro: a perda do mundo.

O SONHO DO MARINHEIRO

 O SONHO DO MARINHEIRO

Essa é a minha vida, pensei. Esse é o meu lugar, mas algo me atraia em seguida em pensamentos e fantasias recorrentes após um longo êxtase alcançado. Deixar, ficar, sair e voltar. Nem tive tempo de me segurar aqui e logo já era a partida.

Amanheceu, a aurora dourava as cortinas e fazia os vidros das janelas brilharem com reflexos por todo quarto. Vi meu corpo sobre o leito e voltei aos meus sonhos.  

E se foi minha alma para outro lugar como a névoa dissipada de uma manhã em que os ventos do mar chegam para me lembrar que o meu lugar não é em terra firme ou no regaço de uma dama, mas sim no balançar da rede entre uma pilastra e outra de uma caravela. Com uma garrafa de rum esgotada entre os braços e o negrume da noite a proteger nosso navegar entre os canhões.

Ainda que tente me agarrar em terra firme e em teu belo colo manter minha cabeça, nas curvas alvas de tua pele perder o meu olhar, sob teus braços acalentado e aos cuidados de tuas mãos bem repousado, não fico aqui. O sonho me chama devo voltar ao mar, como aquele homem que encontra um tesouro no deserto, mas que não possui água para beber e só vai viver se a encontrar. Uma força me impele para longe de tua suavidade. Do teu tesouro eu sigo o mar de volta.

Penso que sem você não viveria, mas que sem o mar não acreditaria mais em minha vida e em minha existência, porque em cada sonho em que eu voltava, era minha vida que eu encontrava.

RAINHA DOS SONETOS

 PARA A RAINHA DOS SONETOS


Ó, tu que és a Rainha dos sonetos

Que mesmo com a alma sonâmbula 

Tem muita rimas e metros sem fim

Abandona um pouco a prosa e os tercetos

E olha um pouco para mim

Antes que eu esqueça todos os metros,

Que jamais servimos em forma crua

Vem cantando assim meu bem

Foge à Lua e seus Epítetos, sem respeitos quietos

Sem reflexos indiretos e sem nada mais além


Ó, tu que és a Musa dos meus afetos mais completos 

Que suaviza a pedra dura, 

Como quem molha até que fura

E que ao pobre coração traz a boa cura 

Tal qual o bom vinho torna a alma pura

 Vem brindar tua roupa carmim

Aqui bem perto de mim

Vem rimar com o bandolim

Mas lembras, com pouca glosa e floreios

Co’ alma e a calma afim


Ó, Diva dos espíritos inquietos

Poetisa que protege as ruas

Que sopra na brisa as letras nuas

Que sobe ao Palco em solilóquios 

Senta bem aqui no meio do meu salão

Traz o canto no peito ao que veio

Derrama teus dialetos em recheios

Sobre um leito e sua suavemente

Deixa me ver melhor esses teus versos   


Ó, tu que és jovem de boas preces

Fecha uma oração aqui comigo

Que pula de um salto aos meus olhos

Tal qual a rosa do meu desejo

Deixa a veste e logo vem

Chega a mim muito mais perto

Mostra tua perfeição que estou aberto


Ó, Dama das noites e dos dias

Te sirvo um banquete matinal

E que fiques sem igual

Tentada assim de um lampejo

Se chegares e cantares assim, meu bem

Prometo quieto aceitar ao que vens

Ser reto e verdadeiro nos meus afetos

E começar e terminar melhor do que ninguém


P.S. publicando coisas no Blog de novo. Poema do ano passado. 

quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

AMOR, DESEJO E VONTADE: AS AMBIVALENCIAS

Ninguém suporta por tanto tempo um estado de ambivalência da vontade. De querer e não querer. Você fica se distraindo em relação ao impasse ou às mudanças de humor, tentando usufruir do que há de bom na indecisão e na situação, mas aquilo vai te roendo por dentro e cada episódio de negação reforça teu instinto ou impulso para decidir. Mesmo que você não goste da decisão ou não queira sofrer você começa a pensar seriamente. Tens conseguido controlar tua raiva, mas não a dor e o vácuo que vão surgindo. A distância vai aumentando, os silêncios de repetem e você fica sem ação, com uma decepção te aborrecendo, mas tu sabes que não adianta dar muita voz ou vasão para ela. Não tens mais um endereço para enviar. Isto deve ser a solidão e mesmo que tenhas muitos à tua volta, cala e faz um meneio com a cabeça que já não é mais de contrariado, mas sim de um corpo que recebe mais uma contusão dolorosa, uma pancada. É assim que eu sinto todas estas coisas e de cada vez elas todas.