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quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

AMOR, DESEJO E VONTADE: AS AMBIVALENCIAS

Ninguém suporta por tanto tempo um estado de ambivalência da vontade. De querer e não querer. Você fica se distraindo em relação ao impasse ou às mudanças de humor, tentando usufruir do que há de bom na indecisão e na situação, mas aquilo vai te roendo por dentro e cada episódio de negação reforça teu instinto ou impulso para decidir. Mesmo que você não goste da decisão ou não queira sofrer você começa a pensar seriamente. Tens conseguido controlar tua raiva, mas não a dor e o vácuo que vão surgindo. A distância vai aumentando, os silêncios de repetem e você fica sem ação, com uma decepção te aborrecendo, mas tu sabes que não adianta dar muita voz ou vasão para ela. Não tens mais um endereço para enviar. Isto deve ser a solidão e mesmo que tenhas muitos à tua volta, cala e faz um meneio com a cabeça que já não é mais de contrariado, mas sim de um corpo que recebe mais uma contusão dolorosa, uma pancada. É assim que eu sinto todas estas coisas e de cada vez elas todas.

O IMPULSO DE DAR SENTIDO ÀS COISAS

Mas fiquei pensando numa possível posição entre o "não sei" ou a negação e o "eu acredito nisso" ou "penso assim". Na verdade, fiquei relacionando isso às teorias ou tipos de teorias epistêmicas ou mesmo atitudes epistêmicas que, ao longo da história, tem sido dominantes sobre as nossas crenças.

Eu aceito a crítica a essa minha tendência a tentar dar sentido às coisas e às situações. Esse esforço psíquico - por assim dizer - que é muito persistente em mim de dar sentido a experiência em palavras, numa narrativa e com significado. É um habito adquirido que eu creio que tem me mantido equilibrado na vida e em todas as situações e que envolve um esforço de compreensão e aceitação da realidade. Me parece compensatório e me faz manter uma abordagem positiva das situações.

Aceito essa crítica, por que de fato de um ponto de vista afetivo é muito difícil dar sentido às perdas e ao sofrimento.

Não se fecha as questões da vida e da existência por decreto ou racionalização. Nenhum argumento explica a violência, o desamor, a dor e a morte. E os argumentos ou narrativas que explicam só dão conta da dimensão causal ou fatual, não do sentimento ou do modo como isso fica embolado em nossa cabeça ou trancado na garganta e roendo o nosso coração.

Eu entendo quando você diz que esse sentido ou narrativa não resolve. Porque penso que se eu me confrontar a mim mesmo com as narrativas que eu uso para assimilar ou acomodar as dores do mundo na minha experiência ou biografia, eu sei que posso erguer uma profunda e dolorosa dúvida e pôr abaixo o edifício inteiro da minha personalidade.

Eu fico imaginando que esse enfrentamento é o mesmo que nos coloca numa grande encruzilhada em que as opções são: racionalizações e imposição de um sentido construído com um esforço de compreensão, as mistificações ou construções religiosas ou psíquicas que nos levam a um esforço criativo e interpretativo em que a ficção e a credulidade ficam muito acima de uma racionalidade - que pode até chegar ou carregar para um dogmatismo ou fanatismo, e, por fim, o ceticismo mais negativo que rejeita absolutamente as duas opções anteriores, ou seja, nem a crença crítica e nem a crença desmedida resolvem a explicação da realidade. Uma, porque se satisfaz com pouco e oferece muito pouco e algo insuficiente para nós termos algum conforto, e a segunda porque aposta demais, para muito além dos limites de possibilidade de demonstração ou verificação.

Isso é uma das questões filosóficas - de fundo - mais centrais na história do pensamento humano. Mas temos bons exemplos em todos os três casos. E quase todos eles se resolvem por um único conceito ou juízo bem simples: opto por essa versão porque para mim é melhor assim, ou, para mim tal perspectiva me traz mais conforto.

Eu, por exemplo, adoto a racionalização e a construção de sentido, mas muitas vezes me relaciono com a mistificação e a credulidade e mesmo com a negação ou o ceticismo. É um processo dinâmico na minha cabeça. De fato, o que me ocorre é uma adaptação às três perspectivas dependendo de o quanto elas me trazem conforto. Sobre o término de uma análise disso com um juízo desse tipo: assim está bom, me sinto seguro assim, faz sentido assim ou assim posso esperar ou, em casos muito graves e difíceis, admito minha impotência e incapacidade de responder e aceito a negação ou a incerteza incorporando ela a esse lugar na minha vida ou experiência. 

Parece que o sentido da negação e da desmedida são irmãos. Nesse último caso, eu aceito a melhor a minha falibilidade ou incapacidade, dou de ombros e me curvo ao imponderável e ao absurdo. Digo: tá legal, não consigo explicar, não há argumentos que resolvam, não posso fazer nada. E suspiro.

Eu acho que o Freud, por exemplo, com a interpretação dos sonhos fica na linha de divisão entre as duas primeiras posições. E, curiosamente, ele é muito autoconsciente disso. Com uma outra característica que me chama muita atenção que é a de compreender muito bem no seu pessimismo sobre o destino da humanidade nos anos vinte, em especial, sobre O futuro de uma ilusão e Mal estar da civilização.

Não tenho escrito muito por aqui...mas adoro ler os comentários dos amigos...sempre vem algo diferente ou que melhora nosso humor e abordagem...agradeço sempre a participação quando vem desta forma. E é tão bom poder falar de coisas sérias ou amenidades com serenidade e sabedoria...sem aleivosia ou precipitações, sem rispidez ou grosseria...isso aqui seria melhor se as pessoas tivessem uma orientação assim...agradeço muito aqueles que entendem isto....

QUANDO OS HOMENS FALAM A VERDADE - CLIFFORD

 

"Os homens falam a verdade uns aos outros quando cada um reverencia a verdade na sua mente e na mente do outro; mas como é que o meu amigo reverenciará a verdade na minha mente quando eu próprio sou descuidado com ela, quando acredito nas coisas porque eu quero. Acreditar nelas, só porque são confortantes e agradáveis? Será que ele não aprenderá a clamar, "Paz", para mim, quando não houver paz? Por tal curso eu me rodearei de uma atmosfera espessa de falsidade e fraude, e nisso eu devo viver. Pode pouco importar para mim, no meu castelo sob uma nuvem de doces ilusões e mentiras queridas; mas importa muito para o Homem que eu tenha feito os meus vizinhos prontos para enganar. O homem crédulo é pai do mentiroso e do traidor; ele vive no peito desta sua família, e não é nenhuma maravilha se ele deve tornar-se como eles são. Tão estreitamente estão os nossos deveres unidos, que aquele que deve guardar toda a lei, se, no entanto, a ofender num único ponto, ele será culpado por todos "

"A ética da crença", Clifford.

O FIM DE TODAS AS COISAS: NOTAS

“Ora, está muito próximo o fim de todas as coisas; portanto, tende bom senso e vigiai em oração. Antes de tudo, exercei profundo amor fraternal uns para com os outros, porquanto o amor cobre uma multidão de pecados...”

Pedro, 4:7-8. Bíblia Sagrada.

"Negamos as causa finais: se a existência tendesse a um fim a esse fim já teria atingido."

 Nietzsche

Existem, com certeza e deve ser admitido em princípio, diversos modos de se observar a natureza das coisas. Estou dizendo observar aqui num sentido em que a nossa cognição, conhecimento os experiência sempre nos impõe uma certa maneira de dar atenção a algo, seja como apreensão sensível, seja como um certo produto da nossa imaginação em que a percepção é aquilo que nos faz compor essa imagem ou desenho.

Apreendemos, entretanto, e de um modo cuja distinção é clara e evidente, que a partir da experiência podemos observar as coisas de modo direto ou indireto. Essa consideração, porém, não basta para nos dar alguma garantia definitiva e alguma certeza absoluta aos nossos conhecimentos sobre as coisas, sobre a natureza das coisas e aquilo que elas são ou serão em um futuro próximo ou num futuro mais remoto ou no passado e no presente que possamos poder considerar. Isso, para muitos, é compreendido como uma limitação razoável e por outros apenas um detalhe. Mas não é. A nossa linguagem permite discernir com base em nossas experiência e dos modos de observação das coisas, da natureza das coisas ou de todas as coisas que podemos fazer um repto temporal, ou seja, podemos ver todas as coisas, a sua natureza e uma coisa, no passado, no presente e no futuro de forma imediata ou remota, sendo o grau disso regulado por nosso apelo a meios de chegar nas coisas ou em todas as coisas que é dependente do maior ou do maior uso de instrumentos auxiliares e da nossa própria imaginação. Essa perspectiva menos rígida por assim dizer, me parece ser exatamente a perspectiva necessária para a metafísica e todas as nossas especulações.   

Ocorre que esse detalhe faz muita diferença, em especial, quando procuramos com máximo esforço obter alguma pista sobre uma causa primeira de todas as coisas ou sobre um final último para todas as coisas. Os modos diretos ou indiretos de se observar as coisas e num grau maior de observação todas as coisas nos levam a crer que a observação direta é sempre imediata e abrangente, mas que somente a observação indireta e mediada pode nos permitir observar ou se julgar que se observa todas as coisas em seu princípio ou numa totalidade última e definitiva. Dentre as formas indiretas de se observar as coisas constituímos com a ciência e com razoável esforço especulativo muitas propostas de solução para certos problemas, interrogações ou inquietações nossas. Já foi dito que é uma pretensão característica dos filósofos e filosófas procurar observar todas as coisas, seja no seu passado mais remoto e mais primordial, seja no seu futuro mais remoto e final. Essa pretensão, desejo ou ambição à totalidade sempre foi considerada como ultrapassando os limites do nosso conhecimento ou atingindo as fronteiras últimas do nosso conhecimento.

É assim que quando consideramos como os primeiros filósofos, os grandes físicos e todos os cosmólogos e metafísicos ou poetas sobre a totalidade, nos vemos frente a questão de onde vem todas as coisas e para onde elas estão a se dirigir em seu movimento ao derradeiro ou só seu ciclo final. Nós humanos temos uma tendência derivada de nossa experiência existencial que é sempre temporal, mesmo que não façamos as contas do tempo, ou sempre desafiada pela finitude ou morte, mesmo que julgamos que a morte não seja o fim do nosso espírito, a pensar que haverá um final ou concerto final de todas as coisas. Essa consideração parece estar associada diretamente a um outro impulso característico da filosofia ou do nosso modo de contemplar o mundo, todas as coisas e as nossas vidas e a existência, deveria haver uma ordem ou harmonia ou certo modo de organização na natureza das coisas que nos permite racionalizar, discriminar, explicar e discernir como as coisas estão.

Mas há, podemos observar também, uma espécie de procura de um final feliz. Como personagens românticos que estivessem à deriva em um oceano a procura de uma ilha prometida ou do paraíso na terra.

Nosso impulso em busca de sentido nos leva tanto, portanto, para o caminho das religiões, como para o caminho da filosofia e da metafísica, quanto para o caminho da literatura e da poesia, bem como, para o caminho da ciência ou das ciências que com seus poderes sempre sendo renovados, fazem com que frente a frente nossa falta de sentido e nosso impulso em busca de sentido nos compensem sobre este mundo, todas as coisas, a natureza das coisas e essa ou aquela coisinha ou pedrinha que está no nosso caminho. Aqui se encontra talvez a resposta enviesada e incompleta da questão da possibilidade da metafísica como ciência. 

Lar Doce Bar - filme imperdível

 Para nós que somos adultos e temos consciência de nossa responsabilidade na educação de nossos filhos e também dos filhos de nossos amigos e conhecidos, mas também desconhecidos, é um lugar comum dizer que o bom exemplo, a boa vontade, o bom conselho e a firmeza tranquila e serena pode mudar a vida destes jovens. Para os professores e professoras mais ainda quando percebem a importância dos seus papeis humanizadores na educação dos jovens. No filme The Tender Bar, ou sua versão PT Lar doce bar, temos uma boa oportunidade para refletir sobre isso. O filme é um drama de 2021, dirigido com maestria e cuidados especiais por George Clooney, que além de bom ator tem se mostrado um diretor muito bom em explorar detalhes afetivos e subjetivos na direção de personagens exemplares e que precisam enfrentar as situações da vida. Neste filme a situação da vida é não ter um pai ou ter um pai cuja voz só se escuta no rádio. O texto do roteiro foi escrito por William Monahan em uma adaptação muito bem acentuada do livro de memórias com o mesmo nome do jornalista e escritor J. R. Moehringer. Ele narra a vida de Moehringer enquanto crescia em Long Island com a mãe na casa de seu avô e sob a vigilância carinhosa, afetiva e protetora de seu tio. Nesse sentido, é um filme cuja principal característica é apresentar um romance de formação de um jovem. O tio é representado muito bem por Ben Affleck como o tio Charles ou Chaz que faz às vezes de orientador na iniciação na vida masculina e de formação moral e cultural de seu sobrinho. Tye Sheridan que já tem interpretado outros personagens maravilhosos no cinema se apresenta como o JR adolescente e Daniel Ranieri, um ator cuja estréia  promete, interpreta muito bem o JR menino. Lily Rabe interpreta a mãe cujo pai de JR abandonou e Christopher Lloyd como o avô maluquete, mas muito sábio e afetuoso. Temos aí um filme sensível, com uma ótima mensagem anti machista também e que mostra o quão importante um familiar e outros membros de uma comunidade de boa cabeça pode fazer bem e educar bem um menino. A mão conscienciosa e muito ponderada e generosa do Diretor Clooney em uma dinâmica muito boa com os atores aparece claramente. Vou deixar sem mais informações, recomendando que assistam no canal de Streeaming Prime Video. MB. 

SOBRE MAPA DE CRENÇAS

 

O amigo e filósofo Gregory Gaboardi (1), extremamente dedicado à epistemologia, escreveu uma postagem em 2017 citando David Malet Armstrong (2), com sua abordagem dinâmica sobre Mapa de Crenças. Ele estava usando um texto de Armstrong, que eu não conhecia, sobre o tema e esse aspecto dinâmico foi o que me saltou aos olhos. Hoje visto com mais calma e distância e me beneficiando do seu tradutor quero um pouco tratar disso. Penso que agora, passados alguns anos in progress – em 2019 escrevi a base desse comentário - posso tecer algumas considerações mais longas sobre esse tema que me persegue no estudo da filosofia. Vou começar citando Armstrong:

 

"Se pensarmos em crenças como mapas, então podemos pensar na totalidade das crenças de um homem num momento particular como um único grande mapa do qual as crenças individuais são sub-mapas. O grande mapa abraçará todo o espaço e todo o tempo, passado, presente e futuro, juntamente com qualquer outra coisa que ao crente demore para existir, mas terá como ponto de referência central o eu presente do crente. Mas não devemos pensar no grande mapa como o mapa de um cartógrafo moderno da superficie da terra. Tal mapa é um mapa demasiado bom para ser uma imagem adequada. (Não é só crença, é conhecimento.) O grande mapa de crenças será muito parecido com os mapas antigos, contendo inumeráveis erros, fantasias e vastos espaços em branco. Pode até envolver representações contraditórias de porções do mundo. Este grande mapa, que está continuamente a ser adicionado e continuamente a ser tirado enquanto o crente viver, é um mapa dentro da sua mente."

 

D. M. Armstrong, grifos meus.

 

Fica clara a dimensão ou as múltiplas dimensões dinâmicas desse mapa de crenças. De um lado, ele possui uma dimensão temporal, de outro lado, que pode ser considerado relacionado à essa dimensão temporal, esse mapa está continuamente em mudança e suas crenças sob apreciação, adição e retiradas. As crenças são adicionadas ou retiradas, portanto, trata-se de um mapa em aberto, com ingresso de novas crenças, com retirada de crenças e com mutações de crenças.

 

Na descrição de Armstrong, além disso, também podemos observar que nesse mapa de crenças temos crenças até mesmo contraditórias. Podemos imaginar isso muito facilmente quando pensamos que possuímos versões verdadeiras sobre os fatos e também versões ficcionais sobre os fatos. A existência dessas crenças antagônicas ou sutilmente diversas sobre os fatos estão depositadas “dentro da nossa mente”. Esse tipo de sacada de Armstrong pode ser reconhecida por qualquer um de nós que se coloque a examinar os conteúdos de suas próprias reflexões, opiniões ou conhecimentos. Alguns de nós tem inclusive a capacidade de narrar as mudanças em suas próprias crenças a respeito das coisas, dos fatos ou das pessoas ao longo da própria vida.

 

Entendemos isso perfeitamente bem também quando lemos obras literárias, poesias ou mesmo ensaios e artigos em que ao longo de um processo esses conteúdos complexos sofrem alterações de vocabulário, estilo, narrativa e também de significado e modo ou forma de construção. Percebemos isso também quando nos damos ao trabalho de colecionar, por exemplo, traduções dos Sonetos de Shakespeare.

 

Na mente de um escritor ou escritora, de um pesquisador ou pesquisadora, tradutor ou tradutora essas variações são compatíveis e permanecem presentes no seu mapa de crenças, sendo as mais recentes ou mais aperfeiçoadas ou consideradas melhores mais utilizadas sem que, no entanto, na maior parte dos casos, este autor perca ou abandone em seu mapa mental as outras versões. Lemos constantemente ou podemos ler relatos de tradutores, autores, poetas ou mesmo cientistas sobre as mudanças de suas crenças ao longo de um processo determinado.

 

Poderíamos avançar aqui em outros exemplos, mas acredito que isto já basta para se ter uma ideia desse aspecto dinâmico do Mapa de Crenças de cada um de nós. Ressalte-se, apenas, que isso não significa que não escritores não colecionem também em seu mapa de crenças, crenças antagônicas ou distintas no todo ou em detalhes em relação aos mesmos fatos, às mesmas coisas e às suas próprias fantasias.      

 

Tenho uma intuição geral forte sobre este tema e essa imagem de Armstrong me ajuda muito a desenvolver essa intuição aqui um pouco mais. Desde que li as Meditações de Descartes e, em especial, a Primeira Meditação, pela primeira vez, tive um insight absurdo: posso enumerar todas as minhas crenças? Minha resposta foi que posso começar a anotar minhas crenças em um caderno. E em sequência imaginei que não conseguiria enumerar todas as minhas crenças em um caderno. Mais tarde isso me conectou a um outro insight a partir daquilo que poderia ser o que Wittgenstein chamava de proposições elementares.

 

Tomando uma medida ou método diverso do dele que simplifica em tipos de crenças por redução, podemos dizer que Descartes faz na primeira Meditação, uma espécie de roteiro ordenado e enumeração dos capítulos ou tipos possíveis das nossas crenças. Veja que quando ele faz a exposição sistemática e geral do método da dúvida, ele faz isso por tópicos, ou seja, em vez de refutar cada crença em especial ele opta por ir metodicamente por partes e usa argumentos conhecidos para fazer isso atacando por conjuntos ou capítulos certos tipos de crenças.

 

A ideia de um mapa das crenças de Armstrong corresponde ao exemplo que eu usava para exemplificar a escolha de Descartes. Você pode adotar um outro caminho para refutar suas crenças e chegar ao “eu penso” como substrato final ou como pressuposto inegável ou uma crença irrefutável - toda vez que a proferir em seu pensamento ou expressar ou simplesmente erguer seu caderno de crenças e dizer: bem, algumas ou muitas podem estar erradas, assim como não podem todas estarem certas, mas algumas crenças estão certas neste caderninho ou nesse mapa de crenças.

 

Uso até hoje o exemplo do caderno de crenças. Se você começar a anotar num Caderno tudo que acredita o trabalho será quase infinito, mas por hipótese, vais aceitar que é possível fazer isso e que algumas coisas que você coloca ali são tão óbvias ou quase irrefutáveis e outras são deveras banais ou corrigíveis ou até já corrigidas mas continua ali e são lembradas com ironia e humor por cada um de nós. Vais encontrar nessa caminhada ou auto exame, crenças mais seguras, então, aquelas a que você dá mais crédito e crenças mais instáveis, sutis ou sensíveis a uma ou outra forma de refutação e outras que parecem ser carentes de alguma correção ou reparo. Em todo caso, você pode fazer isso e pode, portanto, revisar suas crenças. Uma curiosidade aqui é que mormente erros, incorreções ou imprecisões, essas crenças equivocas não são simplesmente depositadas em uma lixeira e esquecidas. Você pode não fiar mais nelas, mas elas permanecem no seu mapa mental de crenças.  

 

Não é difícil imaginar que com o tempo, será uma tendência racional que você vai acabar por classificar essas crenças em tipos de crenças e aos poucos vai acabar também tendo a capacidade de as ir revisando. Você irá hierarquizar suas crenças ou ordenar suas crenças, dividindo elas em crenças mais importantes ou prioritárias e crenças menos importantes ou menos prioritárias. Ao longo da vida, e é no curso da vida que o pensamento deve caminhar, você pode mudar o conteúdo desse caderno, despachar algumas crenças e também corrigir essas crenças e construir novas crenças. Alguns alunos e alunas mais entusiasmados chegaram mesmo a topar fazer isso e os resultados foram incríveis porque boa parte deles acabou por me dizer que a coisa mais importante nesse processo não era saber o que era seguro ou inseguro, mas sim como algumas crenças seguras acabavam por estar relacionadas a outras crenças que pareciam ser apenas definições ou decisões conceituais. Tem aquele aluno que também pensou em algo como nós ou núcleos analíticos espalhados no meio dessas crenças.

 

O mapa de crenças ou o caderno de crenças parece explicitar uma exposição cartesiana de crenças no detalhe. Aqui não se trata mais de usar um método da dúvida para encontrar a certeza, mas sim o método da exposição das crenças para visualizar a rede ou a trama de crenças que constitui o nosso horizonte e perspectiva epistêmica existencial. Algumas crenças foram adquiridas por hábito, porque não havia ou fazia sentido ter razões para duvidar no curso normal da vida. E assim fomos acumulando crenças sobre crenças e formamos uma rede vasta de crenças. Algo que também me veio a cabeça agora, foi o lugar dos sistemas filosóficos e o impacto deles nos sistemas, mapas ou cadernos de crenças de um filósofo ou filósofa qualquer. É de se pensar que esses sistemas acabam organizando em diversos níveis e dos diversos tipos de crenças desse personagem. E não é assim que ocorre de fato?

 

Outro aspecto importante me parece ser o fato de que: nossos mapas pessoais de crenças, tem conexões com os mapas de outros indivíduos. Incluso, indivíduos que já não estão mais por aí. Em certo sentido, todos nós temos uma certa consciência de crenças compartilhadas e em muitos casos consciência de algumas fontes pessoais de nossas próprias crenças que só são próprias porque as possuímos, mas nos foram dadas e tiveram a sua origem em uma fonte exterior a nossas mentes.

 

Por fim, é preciso arguir aqui, porém, que algumas crenças são absolutamente pessoais. Suas fontes não são externas. Nós as criamos e produzimos por própria reflexão e intuição. Ou seja, nós produzimos crenças também por interpretação e por uma espécie de jogo de busca de sentido e significado, narrativa e compreensão sobre as coisas, os fatos e as pessoas. E essas crenças também podem possuir valores de verdade especiais ou aguardarem confirmação, correção ou refutação no nosso jogo amplo da vida e da busca de sentido da vida.

 

Obs.: O mapa de crenças pode corresponder a um caderno de crenças ou a um sistema de crenças. Mas deve haver uma espécie de dinâmica entre crenças rígidas e crenças moles, crenças mais estáveis e crenças que vão mudando de conteúdo a partir de sua situação no mapa, localização ou de suplementação de informações. Vou dar um exemplo simples aqui. A Revolução Farroupilha é um episódio histórico que não somente faz parte do imaginário simbólico dos gaúchos e gaúchas – ainda que existam gaúchos e gaúchas que não dão a mínima para isso, mas que tem gerado muitas controvérsias e polêmicas no último período. Creio que vale examinar isso sob as luzes de um mapa de crenças compartilhados socialmente que sofre abalos pontuais e no todo. Isto é, há uma disputa sobre a conformação das crenças a respeito desse episódio histórico. A única pergunta que me surge é como corrigir crenças equivocadas ou mal informadas sobre esse episódio, sem gerar, apenas resistência e/ou uma guerra do osso cujo resultado é soma zero.

 

(1)   Gregory Gaboardi.

(2)   Mapa de Crenças.

(3)   David Malet Armstrong.

(4)   Rene Descartes

(5)   Ludwig Wittgenstein

 

“A PRIMEIRA VITIMA DE UMA GUERRA É A VERDADE”

 Assistir ao filme Munique: no limite da guerra, pela Netflix, gera uma sensação estranha, um certo Deja Vü, do tipo já vi esse filme antes. Aquela complacência burocrática e encenada com o modo como os cuidados com a Paz e as possibilidades de uma guerra, eram tratados e são tratados pelos líderes das nações e seus staffs. No caso deste filme, o modo como as grandes potências européias no século XX tratavam esses assuntos aparentemente triviais e cotidianos, de tal modo que nenhuma dramatização parece fazer sentido, quando o que ocorre de fato é uma marcha quase combinada de ambos os lados para a insensatez e a barbárie, o terror e o sac5rifício de inocentes com uma complacência cerimoniosa.

Não é uma sensação distante aliás daquela que temos quando vemos a história da relação entre os EUA e a URSS ou hoje EUA e Rússia sobre a Ucrânia ou  com o Oriente Médio ou as Repúblicas próximas ou seus quintais, incluso Balcãs, Cáucaso, África, América Latina e alhures. Essa sensação nos faz associar diretamente esse modo com a gigantesca carnificina ocorrida durante todo o Século XX e que prosseguiu nas duas primeiras décadas do Século XXI. E nos faz pensar nas responsabilidades e impunidades.

A coisa é tão facilitada, sem ONU ou com ONU, que parece haver no ar uma espécie de diálogo onipresente e de consentimento nas cabeças dos líderes dessas grandes potências globais ou regionais: ah, guerra ali? Vai lá e faz. Simples assim. E esse é o modo padrão como as potências regionais ou globais lidam com os países vizinhos, próximos, um pouco distantes ou nas suas áreas de influência e interesses. Simplesmente mandam ver e combinam antes, numa espécie de diplomacia de encenação. 

Veja bem, que antes mesmo da primeira guerra mundial, em meio a ela, depois dela, na segunda guerra mundial, na guerra fria e a partir dos anos 90 até os dias de hoje essa é a dinâmica padrão dos Foreign Affairs. Fazer guerra no início do século só dependia de construir uma narrativa a priori ou sobre um determinado pretexto ou interesse inegociável, indepoendentemente da sua legimidade e de alguma contestação, ou então como é muito corrente hoje, a posteriori e impor essa narrativa criando um ambiente de tal modo que pareceria razoável a qualquer observador, excluso os povos desses países e as futuras vítimas civis e alguns observadores idealistas internacionais, tudo bem, faz um arranjo aqui e ali, constrói um discurso de legitimação e vai lá e faz. Ou seja, o velho ditado de que a primeira vítima da guerra é a verdade, foi longamente aperfeiçoado no século XX e hoje mudou de categoria passou de um enunciado constatativo para um enunciado condicional. Essa mudança deveria deixar arrepiado qualquer cidadão e cidadã desse planeta.

Assim, passamos sem a ONU de um Constatativo:

A primeira vítima da guerra é a verdade.

Para, com a ONU e o atual, amplo e disseminado sistema de informações para um Condicional:

Se queres uma guerra, produza uma mentira.

Alguém poderá pensar que estou aqui sendo ingênuo ou desconhecendo as razões de estado ou que tenho dificuldade para compreender a história. Porém, quando olhamos para o Afeganistão e sabemos, só para variar um pouco o foco, que Osama Bin Laden e a Al Qaeda foram o pretexto para aquela invasão e sabemos que a CIA e, portanto, o governo americano teve em mãos já o endereço de Osama Bin Laden em Tora Bora já em dezembro de 2001, para encerrar qualquer iniciativa de invasão ou de guerra continuada no Afeganistão, mas negligenciou isso. Que o mesmo governo apresentou a comunidade internacional a mentira de que Sadan Hussein possuía armas de execução em massa, como justificativa para mais uma vez ir lá no Iraque e destruir as vidas daquele povo.  

O filme que me levou a enunciar isso hoje aqui, narra com pinceladas de ficção e elementos de realidade histórica um episódio diplomático decisivo que antecede a Segunda Guerra Mundial. As pinceladas de ficção ficam por conta de algumas personagens que seriam o elo de ligação na trama. Dois ex-colegas de Oxford, um alemão e outro inglês, que se reencontram participando cada um deles nos dois lados opostos das negociações do Acordo de Munique.

Dei mais atenção, porém, ao assistir o filme a caracterização das personagens reais  e concretas e para uma espécie de tentativa de atenuação da responsabilidade ou erro de Neville Chamberlain na forma como encarou Hitler. Haveria uma razão para isso, segundo a versão autoral dos fatos. Neville Chamberlain estaria retardando o inicio da guerra para permitir algum preparativo do seu lado e ir, por assim dizer, “levando no bico” o líder alemão. Como se houvesse uma grande astúcia e um velho sabujo por trás dessa estratégia de apaziguamento. 

A interpretação de Jeremi Irons é muito boa e permite, não apenas pela verossimilhança, mas mesmo pela caracterização e o timing racional do ex-primeiro ministro inglês, identificar a dimensão da mentira no preambulo da segunda guerra. É evidente que Neville estava errado na estratégia de apaziguamento em relação a Hitler. Ele estava tentando negociar até o limite com uma fera indômita, desconsiderando todos os claros sinais de fanatismo e de fascismo que marcavam a atuação de Hitler, num momento em que os judeus já eram perseguidos e em que a Alemanha Nazista já tinha anexado a Áustria na Anchluss. Ou seja, num momento em que não poderia mais subsistir nenhuma dúvida sobre as pretensões beligerantes e expansionistas de Hitler.

Tendo a considerar que além de um imperialista ensimesmado e conservador, ele possuía alguma espécie de complexo de inferioridade em relação ao irmão seis anos mais velho já falecido na época, um ano antes para ser mais exato. Porque, é justamente sobre a memória notável dele que Neville procura promover uma ação diplomática exitosa com os alemães e italianos. Austen colheu um Prêmio Nobel da Paz, já Neville a Segunda Guerra Mundial. Vejamos um pouco disso aqui.

O irmão de Neville, Austen Chamberlain que permaneceu 45 anos na Casa dos Comuns, havia recebido o Prêmio Nobel da Paz em 1925, junto de seus companheiros de ações diplomáticas pelos oito tratados de Locarno, assinados entre Alemanha, França, Inglaterra e Itália e outros países para suplementar e reajustar os nefastos acordos ou tratados do pós guerra. Ele era inventor de uma certa estratégia que pode ser a matriz da estratégia usada por Neville “arranjos especiais para atender a necessidades especiais”, criando uma espécie de regra de excepção para certos tratados. Não sou um especialista nesse tema, mas acredito que não há como explicar as ações de Neville sem esse pano de fundo em tela. E basta uma simples pesquisa para se verificar as conexões entre o Tratado de Locarno e o Tratado de Munique. Sendo o tratado de Munique algo como um reajuste do anterior mais ao sabor e gosto dos interesses alemães, nazistas, e também italianos, fascistas. 

Neville, como é retratado no filme, parecia ser muito vaidoso e despreocupado em relação a operações de inteligência e de espionagem ou contra espionagem, se sentindo superior na estratégia a qualquer vantagem que pudesse ser retirada a partir da inteligência. Se tem uma coisa que o filme mostra é que ele realmente optou por um resultado diplomático imediato, contra uma política de longo prazo e sustentada. Ele estava esticando a corda com Hitler ao máximo. Porém, o filme apresenta também e mais uma vez a hipótese ou alternativa histórica de que uma rejeição inglesa e francesa nas negociações enfraqueceria Hitler e fortaleceria certa facção de militares de carreira alemães que gostariam de afastar Hitler do poder. A dimensão histórica aqui mistura a característica irônica dessa hipótese. E a personagem de Neville de certa forma expressa isso: nada deteria Hitler, o máximo que se pode fazer é dissimular nossa objeção a ele e aguardar um tempo melhor para enfrentar ele.

Todo mundo sabe que isso apenas facilitou a invasão da Polônia e moto continuo a deflagração da guerra em setembro do ano seguinte. Dando um ar de legitimidade as pretensões de Hitler sobre os Sudetos e, portanto, admitindo as ambições expansionistas dele. A teoria da busca de ampliação do espaço vital não uma quimera, é a própria lógica imperial nazista levada as suas últimas consequências que envolve não somente tomar um espaço, mas saquear esses territórios e submeter as populações desses lugares a sua opressão étnica e social.            

Churchill depois faz a metáfora mortal dessa política de apaziguamento: colocaram a cabeça na boca de um leão faminto e esperaram que ele não os devorasse? Foi de fato um erro. Acredito que a vantagem desse firme é praticamente colocar a peça nesse episódio que faltava e completar a grande narrativa ainda que cheia de dissonâncias sobre a perspectiva inglesa da Segunda Guerra. Completa Dunkirk, Churchill e alguns outros filmes.

Sobre a falta de uma Otan e a questão de um staff estratégico a altura, chega a irritar ver a empáfia maníaca da elite inglesa em relação ao processo histórico que estão enfrentando. As cenas da hora do chá, o “não tratar disso agora”, o retardamento de informações e mesmo observarmos que um assunto tão grave dependia de um staff limitado e pedante, arrogante e torpe.

Por fim, a caracterização de Hitler faz uma importante contribuição em desvendar sua força de constrangimento contra um jovem que, por hipótese ou ficção, poderia ter liquidado com ele. Pode não ter existido essa personagem, mas com certeza diversos outros que passaram de admiradores a conspiradores contra ele, também se sentiram constrangidos e demovidos de promover algo contra esse monstro. Isso também aconteceu com Stalin.

É triste se perceber como é fácil matar Gandhi, Luther King, etc, e quase impossível matar uma criatura dessas e isso não é assim por um sistema de proteção erguido sob paranóia persecutória sistemática, mas por certa caraterística da personagem que parece tornar esse tipo quase inatingível. Os tiranos, em geral, quando são assassinados, o são antes de terem o poder ou imediatamente depois de perder o poder, quase jamais no exercício de seus mandatos. Aproveitei para esboçar parte de um longo comentário sobre o filme que começaria com "a primeira vítima de uma guerra é a verdade". E terminaria com a versão retórica de Churchill que era a única resposta tática possível às consequências nefastas desse acordo de Munique e a essa política de apaziguamento dos conservadores, que também sofriam influência, é bom que se diga, de simpatizantes ingleses da política de Hitler. 

A verdade mais terrível é que a Inglaterra e a França venceram a primeira guerra, afundaram com a providencial ajuda americana a Alemanha no tratado de Versalhes e foram absolutamente negligentes em manter e preparar seus exércitos para o troco. Em história se aprende muita coisa compreendendo que um péssimo acordo tem consequências sempre. E isso vale para o fim da primeira guerra e o acordo de Munique, entre outros episódios. O modo como ingleses e franceses, em sua cerimônia dispuseram dos sudetos na mesa  e cravaram o destino da Tchecoslováquia, é vergonhoso. Aquilo não é diplomacia, é puro imperialismo.

TENTANDO DAR SENTIDO E VALOR ÀS NOSSAS VIDAS

 

Cada um de nós, especialmente aqui, dos que nos lêem nessas digressões filosóficas e humanas, demasiadamente e simplesmente humanas, está tentando dar sentido às suas vidas, às pequenas e às grandes coisas que nos ocupam.

Nossos trabalhos, nossas leituras, nossas anotações, nossas relações, nossos discursos e narrativas e nossas ações, enfim, nossos gestos e palavras são para nós a única forma de fazer isso. E me parece que não há nada mais digno do que isso e nem nada mais difícil do que isso, quando o mundo à nossa volta parece estar forra dos gonzos e girando sem sentido algum, muitas pessoas à nossa volta nos assombram porque parecem não ter um sentido e um sentimento comum.

Abrimos um aplicativo, lemos uma notícia, olhamos para o lado, para a nossa frente e também para o presente e o futuro e parece que o sentido desmorona, parece que o sentido está sendo destruído perversamente e com brutalidades intoleráveis e insuportáveis. O sentido, nessa percepção do mundo, procura nos escapar como se dissesse aqui não, aqui não é mais possível, aqui não dá ou aqui falta muita coisa para um simples e singelo sentido, sentimento ou sensibilidade.

Nossa busca de sentido se choca o tempo todo ou no mais das vezes com uma brutalidade mundana que nos violenta e nos agride.

Sinto como se o Mito de Sísifo fosse encenado e reencenado até mesmo nas pequenas coisas, nos detalhes e em contatos mesmo que rápidos com outros. E, eis que então, volto a um esforço de extrema boa vontade para dar sentido e fazer sentido, apesar de tudo.

Muitas vezes falamos em resistência e resiliência e parece mesmo que tentar dar sentido a tudo isso é um grande combate, até mesmo contra si mesmo e seus próprios sentimentos.

Mas a gente consegue, e quando consegue o sentido nos fortalece e nos inspira em continuar, por mais difícil e mesmo pequeno que ele pareça. Um pequeno sentido vale, enfim muito mais que toda grande desolação ou sofrimento que nos toca, que vivenciamos ou testemunhamos dolorosamente e pesarosamente.

E assim, por mais perigosa que pareça toda essa situação, por maior que seja a desesperança, persistimos, não desistimos e prosseguimos, com uma vela acesa a iluminar cada pequeno sentido conquistado diariamente que acaba nos dando força e luz para atingir o próximo em seu coração e sua mente.

Parece ser preciso repetir a todo enfrentamento e desalento esse ato de persistência e determinação em dar sentido a algo apesar do caos e do ranger dos gonzos desse mundo que nos ensurdece e nos obriga a cantar no tom apesar de toda a perturbação.

E conseguimos, persistimos mais uma vez e de novo tentando dar sentido, como nessa luta com as palavras, como um tapete que precisa sempre ser refeito para se escapar de todo mal e de toda a perdição que nos ronda e nos cerca nesses dias de tempos tão sombrios e tristes.

E quando encontramos esse sentido que nos faz tecer mais uma linha ou ligação entre o passado e o futuro, nesse presente, nos levantamos e sobrevivemos ajudando mais e mais amigos e amigas como nós a andar nesse vale de lágrimas e apoiar aqueles que precisam uma gota de orvalho para saciar a sede pelo sentido e por um bom sentimento.

terça-feira, 27 de dezembro de 2022

A LIBERDADE EXISTENCIAL

 


A sua vida é sua. Aprender isso é uma descoberta que pode demorar tempo demais. E nossa liberdade está em risco, antes disso acontecer. E pela nossa liberdade, a nossa forma de existência também depende disso. Talvez a maior liberdade humana ou a se conquistar seja de fato decidir exatamente o que fazer de sua vida e como ou com que se ocupar nela ou no tempo que ela durar. Isso talvez nos imponha mais respeito com aqueles que se botam a se ocupar somente de si mesmos. O cuidado de si deveria ser a primeira lição das nossas vidas e quem cuida da gente ou nos educa deveria dar certa ênfase contínua, constante e sistemática nesse assunto. Cuidar de si mesmo talvez seja a tarefa número um de nossa existência. Todo o mais vem depois. Aprender isso de verdade pode nos tornar de falto melhores aos nossos olhos, pode nos deixar mais honrados e mais humildes também, mas também poderia servir de exemplo para outros que não cuidam direito nem de uma coisa - de si mesmos, nem de outra coisa, do mundo ou das outras pessoas. Essa é uma luz que pode não ser forte o suficiente para nos despertar, mas que quando é vista, nos dá um conforto muito próprio.


SARTRE SOLITÁRIO

 "O homem não pode querer, a menos que tenha compreendido primeiro que não pode contar com nada além de si mesmo: que está sozinho, deixado sozinho na terra no meio das suas infinitas responsabilidades, sem ajuda nem socorro, sem outro objetivo senão aquele que ele irá definir r ele mesmo, sem não outro destino, mas aquele que ele irá forjar nesta terra. É essa certeza, essa compreensão intuitiva da sua situação, que chamamos desespero. Pode ver que não é um frenesim romântico fino, mas a consciência afiada e lúcida da condição humana. Assim como a angústia é indistinguível de um sentido de responsabilidade, o desespero é inseparável da vontade. Com o desespero, o verdadeiro otimismo começa: o otimismo do homem que nada espera, que sabe que não tem direitos e nada lhe chega, que se alegra em contar somente consigo mesmo e em agir sozinho para o bem de todos."

 

Livro: Os Escritos de Jean-Paul Sartre.




DAVID HUME & O NOSSO HUMOR PARA SOBREVIVER

David Hume foi um aventureiro filosófico bafejado pela sorte e por uma espécie de jogo oscilante de ocasiões difíceis, sucedido por êxitos quase inacreditáveis.

Foi, após um colapso nervoso, que o jovem Hume iniciou a escritura do seu livro mais célebre e notável. O Tratado da Natureza Humana, recomendável a todos e todas que amam a filosofia, em especial a boa filosofia de língua inglesa, que já era esboçado pelo jovem com apenas 23 anos.

Curiosamente, boa parte das imagens ou pinturas que temos dele são tardias. Um homem volumoso e quase mastodôntico, para poupar outros adjetivos.

E é por isso que vaguei procurando uma imagem do jovem muito ágil nas ideias e veloz e preciso nos pensamentos e argumentos. O que eu encontrei, mais semelhante ao que buscava, é esta aqui publicada. Nela, ele parece já ter seus 30 anos. Nota-se o olhar arguto e bem humorado com certa tendência às profundidades, para além das superfícies.



E é preciso muita agilidade intelectual para repentinamente saltar a outro aspecto ou outra perspectiva das questões.

E os exemplos dessa agilidade e ligeireza, quase singeleza, de uma simplicidade lacônica e muitas vezes irrefutável estão em toda parte da sua obra, que vai da juventude aos seus últimos dias.

A obra de Hume é praticamente um oceano recheado de belas conchas que carregam pérolas de diversos tamanhos. Dá para fazer uma coleção de colares de pérolas filosóficos em praticamente todas as áreas do pensamento. Da lógica à metafísica, da ética à epistemologia, passando pela política e também por diversas outras curiosidades a que muitos e muitas dedicam seus pensamentos e reflexões, investigações e inquirições.

O Sol vai nascer amanhã? Poderia perguntar qualquer jovem contemplando o entardecer. Hume avança sobre essa questão com a segurança de um velho sábio que sabe o quanto a vida e o curso dos fatos e acontecimentos é imprevisível, fugaz e pode ser surpreendente. Talvez, não há nada que garanta isso de um ponto de vista lógico, a não ser a nossa crença no curso repetido dos acontecimentos. E está crença se regozija quando eles se repetem e a gente se sente sapiente e esperto quando isso acontece. Porém, pode ser diferente.

Para terminar, como termina esse ano de 2023, da Graça de Nosso Senhor, vamos ler rapidamente uma descrição do Cético por Hume, que alguns amigos e amigas consideram uma autodescrição e que para mim é um exemplo de o quanto o nosso pensamento pode nos levar a uma entre outras perspectivas diferentes sobre a vida, sobre as regras da vida e nosso modo de encarar ela num jogo continuo, em que a sorte e a circunstância nos testam como num jogo. E nesse jogo nosso temperamento e humor são chaves cruciais para o modo de enfrentar tudo, venha como vier, seja como for, esteja como estiver.

D'O Cético

«Em suma, a vida humana é mais governada pela sorte do que pela razão; há que vê-la mais como um passatempo maçante do que como uma ocupação séria; e ela é mais influenciada pelo temperamento de cada um do que por princípios gerais. Deveremos aplicar-nos na vida com paixão e ansiedade? Ela não merece tanta preocupação. Deveremos ser indiferentes ao que aconteça? Com a nossa fleuma e desatenção, perderíamos todo o prazer do jogo. Enquanto pensamos sobre a vida, a vida foi-se; e a morte, embora talvez seja recebida diversamente pelo tolo e pelo filósofo, trata-os da mesma maneira. Reduzir a vida a uma regra e a um método exactos costuma ser uma ocupação desagradável e frequentemente infecunda. E não constituirá também uma prova de que damos valor a mais ao prémio pelo qual nos batemos? Mesmo meditar com tanto cuidado sobre a vida, e definir precisamente a sua justa ideia, seria sobrevalorizá-la, não fosse esta ocupação, para alguns temperamentos, uma das mais divertidas em que podemos empregá-la.» (David Hume),

 Extraído do post do Professor  Eduardo Vicentini de Medeiros. Meu grande amigo a quem homenageio junto de todos os demais amigos e amigas que se dedicam à filosofar e à educar para o filosofar.

Ah....o fundo vermelho é acidental ou talvez, melhor dizendo, fortuito.

Feliz Natal

domingo, 5 de junho de 2022

R.I.P. ARY MOURA – 1954-2022

 

R.I.P. ARY MOURA – 1954-2022

O Leão Trabalhista

Lá se vai para uma outra dimensão, nosso companheiro de lutas, disputas, vitórias e  muitas alegrias. Merece meu testemunho esse cidadão que foi um verdadeiro Leão Trabalhista e Democrata.

Conheci Ary Moura muito jovem, numa peleia política em que estávamos de um lado com meus companheiros e ele e seus então companheiros de outro lado. Foi uma disputa de época no movimento estudantil leopoldense. Ary era um adversário duro, intrépido e extremamente organizado.

Nós perdemos aquela disputa pela UESLE, lá no início dos anos 80, mas de lá para cá, tirando as eventuais disputas eleitorais que duraram até aproximadamente 2000, sempre tivemos uma espécie de acordo tácito, daqueles que sabem de que lado estão da história e com o passar do tempo, calhou de sermos no mais das vezes aliados em praticamente todas as questões e debates. E nunca foi uma aliança pessoal ou de interesses pessoais. Ary Moura foi a vida inteira um homem de partido e de fidelidade partidária, algo muito importante quando vemos isso no quadro maior da história de São Leopoldo. Eu o tinha como um amigo e um excelente parceiro de prosa, diálogo e muito bom humor. Vou sentir muita falta da sua presença de espírito e firmeza.

Sei que muitos sentiram a dureza dele nas disputas, mas sei também que por mais duro que ele tenha sido, sempre foi leal, jamais promoveu vendetas insensatas, nunca atuou de modo a conquistar inimigos ou adversários venais. Veio para São Leopoldo como milhares de jovens vieram entre os anos 70 e os anos 80 em busca de uma educação de qualidade, trabalho e para conquistar e construir a sua cidadania. E conseguiu tudo isso. Fundou um partido político com Brizola e muitos outros, se transformou em um advogado respeitado em todos os foros, foi um político e um gestor público muito produtivo e criou uma família, conquistou amigos e construiu a cidadania em São Leopoldo em diversos espaços de atuação, que vão da modesta associação de bairro, passando pelo time de futebol, pela escola de samba, pelo centro de tradições gauchescas e também em todos os cantos da cidade onde sempre foi bem recebido e bem vindo.  

Sei que ao longo desses mais de 45 anos, o amigo Ary ajudou muitas pessoas, tanto como advogado quanto como político. Se destaca na trajetória desse amigo a capacidade marcante em todos os bons políticos em reconhecer os cidadãos e as cidadãs e também uma característica fundamental para aqueles que buscam fazer política: Ary Moura gostava de gente e tinha gosto por tratar bem as pessoas. Assim, apesar da dureza de qualquer disputa, era um homem de bom coração, afável e muito gentil.

Conosco, do Partido dos Trabalhadores, sempre teve uma atitude firme, mas em muitos momentos foi generoso e grandioso em suas posições. De tal modo que contribuiu decisivamente para essa cidade receber políticas públicas e milhares de cidadãos e cidadãs devem a iniciativa dele e a sabedoria política dele, o fato de terem melhorado de vida nessa cidade, tanto com os governos do PDT, quanto com os governos do PT.

Ary Moura merece todas as homenagens e seus familiares que se despedem dele hoje, com seus correligionários e aliados políticos e mesmo com seus adversários que são capazes de superar ressentimentos ou desentendimentos, merecem um grande e fraterno abraço. Perdemos um grande e corajoso irmão da história política de São Leopoldo hoje e que todos tenham conforto em seus corações, porque a luta continua e a nossa luta precisa muito de fraternidade e solidariedade para ser efetivamente vitoriosa e mudar de fato a vida do povo. E nós vamos continuar nessa luta!           

sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

O FOGO E A LENHA

 

O FOGO E A LENHA



 


Plutarco saca aqui duas grandes linhas ou estilos de pensamento.

 

A metáfora não exige uma grande explicação. Me interessa apenas sugerir a exploração do que talvez seja uma falsa dicotomia, desde que não se esteja disposto a sentar em um extremo ou outro dessa diferença e julgar que a partir dali tudo mais é desprezível.

 

Muitos filósofos e filósofas podem ser considerados como sistemáticos ou cumulativos e é assim também na ciências e nas artes. Não há neles algo como um brilho de gênio ou uma faísca ou raio mágico do pensamento. Eles acumulam conhecimento, organizam, introduzem e fazem quase algo como um jornalismo engenhoso do pensamento. A originalidade deles aparece nos detalhes e aqui e ali, num ponto ou outro percebemos algo notável. Muitas vezes é preciso se dar ao trabalho de compreender o ponto de vista deles, seus métodos e estilos e comparar a outros de seu tempo para perceber ou apreender algo realmente importante.

 

Outros filósofos e filósofas tem um gênio mais surpreendente. Percebemos a chama prometeica da sua sabedoria num pequeno fragmento de texto, em um aforismo ou nas primeiras linhas de seus textos. Em geral, são esses que despertam paixões, adesões mais duradouras e também dão mais prazer na leitura e geram uma cadeia de descobertas e surpresas quase incessante. Eles tem essa chama da qual fala Plutarco e são notáveis de forma até escandalosa. Não raramente participam de grandes controvérsias, enfrentam as tradições consolidadas e as autoridades de muitos domínios, mas, o que me parece mais importante geram em nós a espécie de espírito de liberdade e impulso para topar certas paradas e não deixar assim.

 

Porém, me parece um bom desafio compreender a ambos. E eu recomendaria ver como alguns filósofos ou pensadores transitam de um extremo ao outro em suas obras. Porque parte dessa dicotomia me parece estar ligada tanto ao próprio estilo, mas também em um modo de se enfrentar os demais pensadores/as.

 

É evidente  que todos que se apaixonam pelos incendiários brilhantes e geniais tem pouca paciência para aqueles que são acumuladores e ruminantes quase infinitos. Mas a fagulha depende da lenha para gerar um grande incêndio.

GRATIDÃO E DIGNIDADE

 

GRATIDÃO E DIGNIDADE

 

Tenho postado muitas mensagens com gratidão no Instagram e no Facebook. Esse excesso talvez pareça piegas ou alguma espécie de demagogia de circunstância. Ter gratidão, porém, não significa dizer que tudo foi resolvido, que minha vida foi um mar de rosas, que as pessoas sempre são boas, honestas e generosas comigo.

 

Sim, tem o lado B dessa minha vida e da passagem da gente na vida e na  história de outras pessoas. Não se iludam com narrativas lineares e contínuas. Nem tudo ou quase nada se deu sem muitas difículdades.

 

 Eu já tive o hábito de indiretas em rede social e vez ou outra escapa um alerta ou sinal sutil do que penso sobre as ideias, os discursos e as ações de muitas pessoas e algumas vezes de pessoas com quem provei algum amargor, mas nada disso é realmente importante no fim da nossa jornada ou quando já passamos da metade da vida.

 

A gente demora muito tempo em compreender e aceitar que algumas pessoas mudam e mais ainda em aceitar que alguns são o que são mesmo.

 

Porém, quando agradeço é a mais genuína gratidão e ela é tanto maior quanto mais digno em reciprocidade for o outro.

 

Assim, 57 anos completos nesse janeiro e eu sou realmente muito grato a todos e todas que são muito dignos da minha gratidão.

 




Valeu!

 

P.S.: Escolhi esse número e desenho porque gostei da combinação. 57 anos foi um tempo muito importante para muitos seres humanos que admiro demais. Que eu tenha o favor devido para fazer algo bom ou muito bom nesse ano.

LULA EM CAMBRIDGE E QUEM TEM MEDO DE LULA

 

LULA EM CAMBRIDGE E QUEM TEM MEDO DE LULA

 

Lula causa medo em uma parte da elite por suas habilidades de inteligência, mas isso só mostra o quanto essa elite é incapaz de reconhecer virtudes ou quando topa com uma precisa encontrar defeito. Alguns dizem que tem medo de Lula por suas habilidades, pois esses são os covardes de sempre que votaram num torpe e inabilitado candidato a presidente, contra um professor altamente preparado e ilibado.

 

É uma tradição dos covardes transformar as virtudes dos outros em defeitos, seja com mentiras, seja com meras negações e acabar elegendo medíocres e imbecis para cargos de alta responsabilidade. Depois ficam com um discurso cínico dando justificativas fúteis e pueris para não fazer o certo.




 

Quando Lula pisar em Cambridge eles vão botar defeito nessa Associação de Cambridge, em Churchill e até mesmo em Stephen Hawking.

 

Enquanto isso, espero que todos e todas que não tem problema algum em reconhecer o outro e as virtudes dos seus próximos aproveitem para aprender, prestem atenção e e se tiverem alguma grandeza de caráter sigam o bom exemplo e reconheçam em todo aquele que possui, as suas qualidades.

 

Nós professores e professoras tornamos o mundo muito melhor quando somos capazes de educar os jovens para isso.

 

Vai Lula, ser gauche em Cambridge com seus méritos e virtudes!

 

Valeu Alberi!

SER PROFESSOR, ESTAR DIRETOR

 

SER PROFESSOR, ESTAR DIRETOR

 

Agradeço muito as oportunidades e apoios que recebi para estudar, ingressar na universidade, fazer o curso que fiz e iniciar a minha carreira praticamente um ano após ter me formado. Agradeço todos os apoios.

 

Iniciei a docência em Porto Alegre, em 1995, na Escola Técnica do Comércio da UFRGS, em seu prédio novo, ao lado do Planetário. Foram dois anos e meio de ensino de filosofia no Ensino Médio Técnico dessa escola. Lá já iniciei lecionando pela manhã e a noite. Somente Filosofia.

 

Depois disso, em 1998, iniciei na rede estadual na Escola Estadual Fernando Ferrari em Campo Bom. Um ano somente com ensino no turno da manhã e tarde. Filosofia, Psicologia e Ensino Religioso

 

Em seguida, já em 1999, comecei uma trajetória continua e ininterrupta de professor na Escola Estadual Olindo Flores da Silva, em São Leopoldo, minha terra natal, no turno da noite e lá se vão 23 anos nessa escola e nesse turno, com alguns períodos na manhã e durante todo esse tempo à noite. Iniciei com História e Geografia e depois também Sociologia e Filosofia, bem como, Ensino Religioso.

 

Lecionei também durante um ano no turno da tarde na Escola Estadual Visconde de São Leopoldo, em 2004. Principalmente Geografia.

 

Em 2016, assumi a vice-direção no turno da manhã no Olindo, foi uma excelente experiência e agora, em 2022, inicia a minha dedicação a direção da escola em que durante tanto tempo fui professor.

 

 Serão três anos no trabalho de gestão de todos os aspectos da escola, com a colaboração da equipe Diretiva que formamos e com a participação do grupo de professores, da comunidade escolar, incluso alunos e alunas e pais e mães através dos conselhos e das assembléias da escola.

 

Apesar da atual legislação excluir esse tempo para efeitos da aposentadoria do professor, acredito que é uma contribuição nossa e de nossos pares que deveria ser mais reconhecida, respeitada e valorizada.

 

Mas esse é um tempo amesquinhado e sombrio, em que vamos resistindo a estupidez e ao desrespeito às nossas carreiras e elevadas responsabilidades.

 

Isso vai passar. Hoje comemoro com orgulho minha contribuição e o fato de que mantive a bandeira da esperança erguida e vou prosseguir assim.




ELZA SOARES VIVE!

 

ELZA SOARES VIVE!

 

Lá se foi Elza Soares aos 91 anos. No mesmo dia que Garrincha faleceu 39 anos atrás. Aprendi a respeitar muito as datas e efemérides ao longa da minha vida. Porque, como muitos dizem não há coincidências. E eu estou fazem três semanas vendo a imagem dos dois e pensando como os amores mais lindos das nossas vidas são maravilhosos e inacreditáveis. E Elza e Garrincha certamente viveram um amor dessa natureza.

 

Então, lá se vai a Grande Elza, essa que sim era quebra barraco, todo o resto é apenas similar, mas nada e nem ninguém a sua altura. E para nos fazer pensar isso também acontece numa semana em que todos e todas nós amantes da música brasileira e das cantoras brasileiras e suas grandes personalidades, estivemos lembrando muito Elis Regina e Nara Leão.

 

Todas essas três - e vale colocar a Rita Lee que fica aqui conosco, foram verdadeiras leoas brasileiras contra os brucutus e esse bando de inúteis que não tem alguma serventia e vivem se impondo pela força e pelo abuso no uso da força Como Garrincha enlouqueceu todos zagueiros ou todo João que na frente dele tentou impedir seus avanços com dribles previsíveis, mas sempre inesperados, Elza e essas mulheres driblaram e enfrentaram os truculentos que se lhes pararam pelo caminho.

 

Que todas elas, com a Elza agora e todos eles olhem por nós e torçam por nós contra todos esses fascistas e reacionários. Talvez, a sorte e a morte seja isso mesmo: o momento de nós enfim estarmos juntos de novo, mas, dessa vez, definitivamente.

 


Na foto: Elza e Garrincha um dos casais mais icônicos da história do Brasil.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Provérbios do Inferno – William Blake

 

Provérbios do Inferno – William Blake

Tradução de Paulo Vizioli.

 

No tempo da semeadura, aprende; na colheita, ensina; no inverno, desfruta.

Conduz teu carro e teu arado por sobre os ossos dos mortos.

A estrada do excesso leva ao palácio da sabedoria.

A Prudência é uma solteirona rica e feia, cortejada pela Impotência.

Quem deseja, mas não age, gera a pestilência.

O verme partido perdoa ao arado.

Mergulha no rio quem gosta de água.

O tolo não vê a mesma árvore que o sábio.

Aquele, cujo rosto não se ilumina, jamais há de ser uma estrela.

A Eternidade anda apaixonada pelas produções do tempo.

A abelha atarefada não tem tempo para tristezas.

As horas de loucura são medidas pelo relógio; mas nenhum relógio mede as de sabedoria.

Os alimentos sadios não são apanhados com armadilhas ou redes.

Torna do número, do peso e da medida em ano de escassez.

Nenhum pássaro se eleva muito, se eleva com as próprias asas.

Um cadáver não vinga as injúrias.

O ato mais sublime é colocar outro diante de ti.

Se o louco persistisse em sua loucura, acabaria se tornando Sábio.

A loucura é o manto da velhacaria.

O manto do orgulho é a vergonha.

As Prisões se constroem com as pedras da Lei, os Bordéis, com os tijolos da Religião.

O orgulho do pavão é a glória de Deus.

A luxúria do bode é a glória de Deus. A fúria do leão é a sabedoria de Deus. A nudez da mulher é a obra de Deus.

O excesso de tristeza ri; o excesso de alegria chora.

A raposa condena a armadilha, não a si própria.

Os júbilos fecundam. As tristezas geram.

Que o homem use a pele do leão; a mulher a lã da ovelha.

O pássaro, um ninho; a aranha, uma teia; o homem, a amizade.

O sorridente tolo egoísta e melancólico tolo carrancudo serão ambos julgados sábios para que ejam flagelos.

O que hoje se prova, outrora era apenas imaginado.

A ratazana, o camundongo, a raposa, o coelho olham as raízes; o leão, o tigre, o cavalo, o elefante olham os frutos.

A cisterna contém; a fonte derrama.

Um só pensamento preenche a imensidão.

Dizei sempre o que pensa, e o homem torpe te evitará.

Tudo o que se pode acreditar já é uma imagem da verdade. A águia nunca perdeu tanto o seu tempo como quando resolveu aprender com a gralha.

A raposa provê para si, mas Deus provê para o leão.

De manhã, pensa; ao meio-dia, age; no entardecer, come; de noite, dorme.

Quem permitiu que dele te aproveitasses, esse te conhece.

Assim como o arado vai atrás de palavras, assim Deus recompensa orações.

Os tigres da ira são mais sábios que os cavalos da instrução.

Da água estagnada espera veneno.

Nunca se sabe o que é suficiente até que se saiba o que é mais que suficiente.

Ouve a reprovação do tolo! É um elogio soberano!

Os olhos, de fogo; as narinas, de ar; a boca, de água; a barba, de terra.

O fraco na coragem é forte na esperteza.

A macieira jamais pergunta à faia como crescer; nem o leão, ao cavalo, como apanhar sua presa. Ao receber, o solo grato produz abundante colheita.

Se os outros não fossem tolos, nós teríamos que ser.

A essência do doce prazer jamais pode ser maculada.

Ao veres uma Águia, vês uma parcela da Genialidade. Levanta a cabeça!

Assim como a lagarta escolhe as mais belas folhas para deitar seus ovos, assim o sacerdote lança sua maldição sobre as alegrias mais belas.

Criar uma florzinha é o labor de séculos.

A maldição aperta. A benção afrouxa.

O melhor vinho é o mais velho; a melhor água, a mais nova.

Orações não aram! Louvores não colhem! Júbilos não riem! Tristezas não choram!

A cabeça, o Sublime; o coração, o Sentimento; os genitais, a Beleza; as mãos e os pés, a Proporção.

Como o ar para o pássaro ou o mar para o peixe, assim é o desprezo para o desprezível.

A gralha gostaria que tudo fosse preto; a coruja, que tudo fosse branco.

A Exuberância é a Beleza.

Se o leão fosse aconselhado pela raposa, seria ardiloso.

O Progresso constrói estradas retas; mas as estradas tortuosas, sem o Progresso, são estradas da Genialidade.

Melhor matar uma criança no berço do que acalentar desejos insatisfeitos.

Onde o homem não está a natureza é estéril.

A verdade nunca pode ser dita de modo a ser compreendida sem ser acreditada.

É suficiente! Ou Basta.

 

William Blake

E AQUELES QUE NÃO ESCUTAM?

E AQUELES QUE NÃO ESCUTAM?

 

Os sinais e avisos são dados. 

Sons e imagens 

por diversos canais 

exibem claramente 

o que está ocorrendo, 

mas eles não observam 

e não escutam. 


É correto chamar isso de 

Negacionismo. 

A realidade está aí 

perante teus olhos, 

ela grita e você recebe 

as informações todas. 


O mundo real está acessível. 

Mas você nega 

o que a realidade te apresenta 

e constrói um sistema 

de crenças para sustentar isso. 


É um tipo de insulamento dogmático 

que ergue uma barreira 

fortemente reforçada 

pela recusa à interpretação, 

pelo excesso de fé no altíssimo 

ou em outra criatura  

e a ausência completa de amor 

e confiança no próximo. 


Há aí uma ética da suspeita. 

Essa ética da suspeita 

que constrói essa barreira 

que impede a assimilação 

de qualquer ideia do outro. 


Você nega deliberadamente 

toda e qualquer informação 

que te é oferecida, 

mesmo por aqueles que te amam 

e gostariam de te proteger. 


Eles tornam impossível 

a tarefa de salvação 

pelo amor mais genuíno ao próximo.


Nem Jesus aguenta eles, 

como muito bem 

citou no ano passado, 

o filósofo Renato Janine Ribeiro. 


No exemplo, 

Jesus deve esperar eles em algum lugar 

e perguntar porque 

você não aceitou a ajuda que te enviei? 


Porque não ouviu meu aviso 

através daquele homem 

ou daquela mulher 

de bom coração 

que queriam te salvar? 

Esperava o quê? 

Um milagre?


Saiba, que o maior milagre na humanidade 

será produto do amor ao próximo! 

Essa é a minha mensagem.

 

Capice?