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quarta-feira, 17 de junho de 2020

“ISSO É LÁ NA CHINA”


“ISSO É LÁ NA CHINA”:
O PRIMEIRO SINAL DE NEGACIONISMO,
A PRIMEIRA NEGLIGÊNCIA DO GOVERNO FEDERAL
E A CONTRAMÃO QUE PERMITIU A CHEGADA DO VÍRUS AO BRASIL

É indiscutível que toda a Pandemia no Brasil chegou pelos portos e aeroportos que acolheram abertamente o Coronavírus, sem nenhuma medida preventiva ou protetiva. E essa doeça grave foi recebida sem sofrer qualquer resistência ou restrição, através de medidas sanitárias cabíveis, e se disseminou pelo país passando pelas etapas para se tornar comunitária, interiorização e periferização que levaram ao quadro atual que ainda que seja distinto de região para região, tirou muita vantagem da falta de rigor e articulação dos gestores federais com os estados e municípios, da falta de articulação regional e, também, quando passou das camadas superiores e medias da sociedade para setores mais vulneráveis e desprotegidos seja por condições de moradia, densidade demográfica, condições de trabalho e mobilidade desprotegida, bem como, por falta de uma comunicação alinhada entre o governo federal e os estados. Hoje estamos praticamente vivendo a segunda onda – a primeira por São Paulo, Rio de Janeiro, Nordeste e Manaus, em virtude da persistente negligencia do Governo Federal e dos esforços insensatos de flexibilização por parte de um empresariado que tem proteção a sua saúde e também pela condição não resolvida dos trabalhadores informais que não receberam ajuda emergencial e das populações mais vulneráveis e periféricas das grandes cidades. Além disso, com a interiorização, a segunda onda ataca Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Brasília, com os demais estados começando a sofrer crescimento dos casos e óbitos.      

O início dessa tragédia brasileira se deu lá no começo no tratamento a questão dos portos e aeroportos que será apontada com algum detalhe a seguir. Não foi determinada uma triagem de passageiros em voos e cruzeiros internacionais, nenhuma restrição de entrada foi emitida para portos e aeroportos até. Nos portos e aeroportos brasileiros, as autoridades não monitoram sequer a temperatura dos viajantes. Sobre os cruzeiros ocorreram algumas poucas exceções noticiadas. Não foi adotada a restrição de entrada no país para viajantes de países com "alta incidência" de covid-19, como China, Japão, Coréia do Sul, Irã, Itália, França, Alemanha, Espanha e outros. A entrada de estrangeiros no país e o retorno de turistas brasileiros não foi monitorada. O Ministério da Saúde declarou uma emergência de saúde em todo o território, mas não adotou uma medida que implicasse que todos os passageiros que retornaram ao Brasil da Espanha, Itália, Irã, França, Coréia do Sul e duas províncias da China (Hubei e Cantão), os locais com os casos mais notificados, ficassem isolados em suas casas por 14 dias e nem promoveu a testagem desses.  

Na entrevista ou diálogo entre o Dr. em Virologia  Atila Iamarino e o ex-secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde Wanderson Oliveira que é também Dr. em Epidemiologia, ocorrida agora em sete de junho, Wanderson revela, aos 46 minutos dessa entrevista, os bastidores da recepção e do alerta sobre a Covid19, lá no início de janeiro.

Quem me lê sabe muito bem que considerei a hipótese de que tenha sido feita a proposta de barreira sanitária nos aeroportos já em janeiro pelo Ministério da Saúde. Esse depoimento do Wanderson confirma essa hipótese e ainda que não confirme uma negativa oficial ou formal, aponta claramente para o primeiro sinal de negacionismo em relação a Pandemia no Governo Federal.

Minha consideração sobre essa hipótese à época foi que a medida de barreiras sanitárias no aeroporto foi rejeitada por covardia política, desprezo e preconceito - o que não é menos que ignorância e burrice - por parte do Presidente irresponsável que se aconselha no Gabinete do Ódio que é orientado por pessoas que se guiam mais por paixões políticas do que por alguma dose de racionalidade e tranquilidade.
O depoimento de Wanderson, repito, não comprova isso, mas é exemplar da atitude negacionista geral que se seguirá. O problema que eu aponto aqui é que esse negacionismo não é somente retórico ou discursivo, mas ele também é gerador de ações na contramão dessas medidas de proteção do país e do povo brasileiro em relação a Pandemia.

O depoimento pode até passar despercebido para muitos, mas é perturbador para aqueles que estão acompanhando com atenção, informação e análise crítica o que está ocorrendo no Brasil com a Pandemia e os nossos problemas de toda ordem no seu enfrentamento. Não é um depoimento tão detalhado assim, mas comprova parte da situação e do descaso do Governo Federal com o tema. Longe de acusar Wanderson por esse depoimento ou confidência, mas devemos considerar isso como uma pista ou o primeiro sinal sintomático da cadeia de desconsiderações ou negligencias que se seguiriam. Além disso, também vale como uma demonstração da lógica invertida adotada pelo governo federal no enfrentamento a Pandemia. Essa lógica é acompanhada pelo negacionismo na retórica e nos atos de fala do presidente e de muitos dos seus principais acompanhantes e apoiadores, mas também por ações e atitudes contrárias às tentativas de enfrentamento adequado a Pandemia.  

Ele nos informa que em cinco de janeiro recomendou a um servidor ou dirigente da Anvisa a ativação do sistema de controle nos aeroportos e que este respondeu com ceticismo dizendo que "não tem problema, isso é lá na China." Trata-se de um colega da Anvisa que é avisado. E este responde: "Não vai chegar aqui não." Wanderson diz então na entrevista: "Eu recomendei ativar os planos nos aeroportos. Isso no dia cinco de janeiro."

Já em 16 de janeiro foi apresentado, segundo Wanderson, o primeiro boletim epidemiológico. Recomendo a leitura disponível no Site da Fiocruz. O comentário de Atila Iamarino atenua a gravidade da resposta, dizendo que não poderia ser compreendido ainda na época, pois "não tinha precedente. Tinha que ser uma extrapolação mesmo."

Escrevi, lá em início de abril, que era muito provável que no governo federal o ministério da saúde já em meados de janeiro até fevereiro tenha dado de alguma forma o sinal da necessidade de barreiras nos aeroportos, mas que isso foi rejeitado. Essa era a minha primeira tese que abre a cadeia de negligências ou desconsiderações por parte do governo federal em relação a pandemia. A minha tese mais geral é de negligencia sistemática a gravidade da Pandemia e as medidas preconizadas pelos técnicos, pela ciência e pelas autoridades mundiais em saúde pública que tem assento na OMS e na América Latina na OPAS. 

A partir de fevereiro, porém, não tem mais desculpa por que já havia o primeiro boletim da OMS e já havia sido elevada a condição de risco da Epidemia para Alta. Mas mesmo assim, esse governo federal e também o governo Trump, um pouco depois empurraram a conta do contágio e da disseminação do vírus sobre a OMS, acusando ela de não ter declarado Pandemia ou de ter apontada a importância da adoção de uso de máscaras pela população em geral, que eles retardaram fazendo discussão de especificações técnicas até que liberaram geral e começaram a recomendar no Brasil também. É bom lembrar porém que foi determinada pela OMS que haviam duas medidas cruciais para deter a pandemia: ampla testagem e isolamento. Sem falar da ausência de barreiras sanitárias nos aeroportos que hoje já são praxe na maioria dos países. No final de janeiro, porém, qualquer gestor público do planeta já tinha acesso a dois dados decisivos sobre a Pandemia: de um lado a elevadíssima e poderosa capacidade de contágio e transmissão do vírus, segundo que a única estratégia para reduzir o contágio é o isolamento.

Um exemplo dessa recusa a medidas sanitárias em Aeroportos foi o caso do estado do Ceará. No início da pandemia tomou medidas sanitárias para fechar o aeroporto de Fortaleza, um  dos cinco principais aeroportos onde o vírus desembarcou no país, para voos dos EUA e da Europa, e a iniciativa do Governo Bolsonaro via Infraero foi ir á justiça para impedir essa medida, e um Juiz do TRF de Recife a partir disso manteve os voôs assim. Para apontar o resultado atual, ontem o estado do Pernanbuco atingiu a seguinte marca de casos e óbitos: Com 920 confirmações e 73 mortes, PE chega a 46.427 casos e 3.959 óbitos por Covid-19. Ambos, o Governo Federal e o Juiz do TRF de lá, deveriam ser responsabilizados primeiro publicamente e depois processados pelo descontrole e pelas mortes da pandemia no Ceará e o Governo Federal por sistemática e repetida negligência e por atuar na contramão dessas medidas.

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