“ISSO É LÁ NA CHINA”:
O PRIMEIRO SINAL DE
NEGACIONISMO,
A PRIMEIRA
NEGLIGÊNCIA DO GOVERNO FEDERAL
E A CONTRAMÃO QUE PERMITIU
A CHEGADA DO VÍRUS AO BRASIL
É indiscutível que toda a
Pandemia no Brasil chegou pelos portos e aeroportos que acolheram abertamente o
Coronavírus, sem nenhuma medida preventiva ou protetiva. E essa doeça grave foi
recebida sem sofrer qualquer resistência ou restrição, através de medidas
sanitárias cabíveis, e se disseminou pelo país passando pelas etapas para se tornar
comunitária, interiorização e periferização que levaram ao quadro atual que
ainda que seja distinto de região para região, tirou muita vantagem da falta de
rigor e articulação dos gestores federais com os estados e municípios, da falta
de articulação regional e, também, quando passou das camadas superiores e
medias da sociedade para setores mais vulneráveis e desprotegidos seja por
condições de moradia, densidade demográfica, condições de trabalho e mobilidade
desprotegida, bem como, por falta de uma comunicação alinhada entre o governo
federal e os estados. Hoje estamos praticamente vivendo a segunda onda – a primeira
por São Paulo, Rio de Janeiro, Nordeste e Manaus, em virtude da persistente
negligencia do Governo Federal e dos esforços insensatos de flexibilização por
parte de um empresariado que tem proteção a sua saúde e também pela condição
não resolvida dos trabalhadores informais que não receberam ajuda emergencial e
das populações mais vulneráveis e periféricas das grandes cidades. Além disso,
com a interiorização, a segunda onda ataca Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Brasília,
com os demais estados começando a sofrer crescimento dos casos e óbitos.
O início dessa tragédia brasileira
se deu lá no começo no tratamento a questão dos portos e aeroportos que será
apontada com algum detalhe a seguir. Não foi determinada uma triagem de
passageiros em voos e cruzeiros internacionais, nenhuma restrição de entrada
foi emitida para portos e aeroportos até. Nos portos e aeroportos brasileiros, as
autoridades não monitoram sequer a temperatura dos viajantes. Sobre os cruzeiros
ocorreram algumas poucas exceções noticiadas. Não foi adotada a restrição de
entrada no país para viajantes de países com "alta incidência" de
covid-19, como China, Japão, Coréia do Sul, Irã, Itália, França, Alemanha,
Espanha e outros. A entrada de estrangeiros no país e o retorno de turistas brasileiros
não foi monitorada. O Ministério da Saúde declarou uma emergência de saúde em
todo o território, mas não adotou uma medida que implicasse que todos os
passageiros que retornaram ao Brasil da Espanha, Itália, Irã, França, Coréia do
Sul e duas províncias da China (Hubei e Cantão), os locais com os casos mais
notificados, ficassem isolados em suas casas por 14 dias e nem promoveu a
testagem desses.
Na entrevista ou diálogo entre o
Dr. em Virologia Atila Iamarino e o
ex-secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde Wanderson Oliveira
que é também Dr. em Epidemiologia, ocorrida agora em sete de junho, Wanderson revela,
aos 46 minutos dessa entrevista, os bastidores da recepção e do alerta sobre a
Covid19, lá no início de janeiro.
Quem me lê sabe muito bem que
considerei a hipótese de que tenha sido feita a proposta de barreira sanitária
nos aeroportos já em janeiro pelo Ministério da Saúde. Esse depoimento do Wanderson
confirma essa hipótese e ainda que não confirme uma negativa oficial ou formal,
aponta claramente para o primeiro sinal de negacionismo em relação a Pandemia no
Governo Federal.
Minha consideração sobre essa
hipótese à época foi que a medida de barreiras sanitárias no aeroporto foi rejeitada
por covardia política, desprezo e preconceito - o que não é menos que
ignorância e burrice - por parte do Presidente irresponsável que se aconselha
no Gabinete do Ódio que é orientado por pessoas que se guiam mais por paixões
políticas do que por alguma dose de racionalidade e tranquilidade.
O depoimento de Wanderson,
repito, não comprova isso, mas é exemplar da atitude negacionista geral que se
seguirá. O problema que eu aponto aqui é que esse negacionismo não é somente
retórico ou discursivo, mas ele também é gerador de ações na contramão dessas
medidas de proteção do país e do povo brasileiro em relação a Pandemia.
O depoimento pode até passar despercebido
para muitos, mas é perturbador para aqueles que estão acompanhando com atenção,
informação e análise crítica o que está ocorrendo no Brasil com a Pandemia e os
nossos problemas de toda ordem no seu enfrentamento. Não é um depoimento tão
detalhado assim, mas comprova parte da situação e do descaso do Governo Federal
com o tema. Longe de acusar Wanderson por esse depoimento ou confidência, mas
devemos considerar isso como uma pista ou o primeiro sinal sintomático da
cadeia de desconsiderações ou negligencias que se seguiriam. Além disso, também
vale como uma demonstração da lógica invertida adotada pelo governo federal no
enfrentamento a Pandemia. Essa lógica é acompanhada pelo negacionismo na
retórica e nos atos de fala do presidente e de muitos dos seus principais acompanhantes
e apoiadores, mas também por ações e atitudes contrárias às tentativas de
enfrentamento adequado a Pandemia.
Ele nos informa que em cinco de
janeiro recomendou a um servidor ou dirigente da Anvisa a ativação do sistema
de controle nos aeroportos e que este respondeu com ceticismo dizendo que
"não tem problema, isso é lá na China." Trata-se de um colega da
Anvisa que é avisado. E este responde: "Não vai chegar aqui não."
Wanderson diz então na entrevista: "Eu recomendei ativar os planos nos
aeroportos. Isso no dia cinco de janeiro."
Já em 16 de janeiro foi
apresentado, segundo Wanderson, o primeiro boletim epidemiológico. Recomendo a
leitura disponível no Site da Fiocruz. O comentário de Atila Iamarino atenua a
gravidade da resposta, dizendo que não poderia ser compreendido ainda na época,
pois "não tinha precedente. Tinha que ser uma extrapolação mesmo."
Escrevi, lá em início de abril,
que era muito provável que no governo federal o ministério da saúde já em
meados de janeiro até fevereiro tenha dado de alguma forma o sinal da
necessidade de barreiras nos aeroportos, mas que isso foi rejeitado. Essa era a
minha primeira tese que abre a cadeia de negligências ou desconsiderações por
parte do governo federal em relação a pandemia. A minha tese mais geral é de
negligencia sistemática a gravidade da Pandemia e as medidas preconizadas pelos
técnicos, pela ciência e pelas autoridades mundiais em saúde pública que tem
assento na OMS e na América Latina na OPAS.
A partir de fevereiro, porém, não
tem mais desculpa por que já havia o primeiro boletim da OMS e já havia sido
elevada a condição de risco da Epidemia para Alta. Mas mesmo assim, esse
governo federal e também o governo Trump, um pouco depois empurraram a conta do
contágio e da disseminação do vírus sobre a OMS, acusando ela de não ter
declarado Pandemia ou de ter apontada a importância da adoção de uso de
máscaras pela população em geral, que eles retardaram fazendo discussão de
especificações técnicas até que liberaram geral e começaram a recomendar no
Brasil também. É bom lembrar porém que foi determinada pela OMS que haviam duas
medidas cruciais para deter a pandemia: ampla testagem e isolamento. Sem falar
da ausência de barreiras sanitárias nos aeroportos que hoje já são praxe na
maioria dos países. No final de janeiro, porém, qualquer gestor público do
planeta já tinha acesso a dois dados decisivos sobre a Pandemia: de um lado a
elevadíssima e poderosa capacidade de contágio e transmissão do vírus, segundo
que a única estratégia para reduzir o contágio é o isolamento.
Um exemplo dessa recusa a medidas
sanitárias em Aeroportos foi o caso do estado do Ceará. No início da
pandemia tomou medidas sanitárias para fechar o aeroporto de Fortaleza, um dos cinco principais aeroportos onde o vírus desembarcou
no país, para voos dos EUA e da Europa, e a iniciativa do Governo Bolsonaro via
Infraero foi ir á justiça para impedir essa medida, e um Juiz do TRF de Recife a
partir disso manteve os voôs assim. Para apontar o resultado atual, ontem o estado
do Pernanbuco atingiu a seguinte marca de casos e óbitos: Com 920 confirmações
e 73 mortes, PE chega a 46.427 casos e 3.959 óbitos por Covid-19. Ambos, o Governo
Federal e o Juiz do TRF de lá, deveriam ser responsabilizados primeiro publicamente
e depois processados pelo descontrole e pelas mortes da pandemia no Ceará e o
Governo Federal por sistemática e repetida negligência e por atuar na contramão
dessas medidas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário