Hoje pensei muito neste desenho de novo.
Ele foi uma grande descoberta de juventude em meio aos livros da biblioteca da minha família, ou melhor, de minha mãe. Um volume cheio de desenhos e pinturas de Albrecht Dürer que conheci bem cedo na vida e que folheava com algum vagar. Tentava ler as cosias escritas em alemão e dava no que dava eu ia e voltava a olhar esta pintura uma, duas, três vezes
Ele foi uma grande descoberta de juventude em meio aos livros da biblioteca da minha família, ou melhor, de minha mãe. Um volume cheio de desenhos e pinturas de Albrecht Dürer que conheci bem cedo na vida e que folheava com algum vagar. Tentava ler as cosias escritas em alemão e dava no que dava eu ia e voltava a olhar esta pintura uma, duas, três vezes
Um anjo super envolvido com toda a técnica e sabedoria possíveis, talvez entediado com a impossibilidade de aplicá-la com eficácia rigorosa no mundo dos homens. Ou melancólico com a distância gritante e as vezes silenciosa e contemplativa entre a sabedoria e a vida. Um pouco abaixo temos também uma outra figura a do querubim triste com a situação colocada assim.
Quando olho para os olhos do jovem lembro de mim mesmo e de muitas pessoas que aprendi a respeitar nesta vida. O cenho franzido, por um aborrecimento eventual, uma pequena inconformidade ao plano superior de nossas ideias e ideais. Mas também por um sentimento profundo de impossibilidades. Um sentimento existencial de que algo é absolutamente inviável.
Aborrecidos nós ficamos e eles também não porque se levam a sério demais - como diria um amigo, não porque lhes falta uma auto-ironia, não, mas porque ficam muito sérias em determinados assuntos e situações. O destino, o imprevisto,a s surpresas, os fracassos, os erros e todas as imperfeições que temos que encaram neste mundo real e concreto distante da perfeição de nossas equações e lógicas.
Também lembro muito de uma das imagens da face de Beethoven em um quadro os lábios apertados, não fazendo beicinho, nem biquinho, mas sim pressionando os lábios para impedir uma palavra que seja e na expectativa de um espaço de tom, de um silêncio ou de um som que ocupe e resolva aquela lacuna na partitura. Talvez observando o violinista em seu erro de nota ou ritmo. Talvez olhando para algo incorrigível e aborrecido come sta impotência.
Todos os gênios, líderes e loucos que conheci são melancólicos em algum momento de suas vidas, mesmo aqueles que nos fazem rir o tempo todo com seus WITS, seus toques ou humores e ironias características. Tem uma hora em que não há graça e esta é a hora da melancolia.
E bem lembro de muitas pessoas mais. lembro de professores e professoras olhando para o que se encena a sua volta. Lembro de pessoas que sabem que certa ação, discurso, posição ou atitude é um erro, mas que devem se calar e observar.
Lembro de personagens e pessoas que devem assistir as tropelias como os anjos de Win Wenders, em Asas do Desejo, assistem as vidas das pessoas. Aquela perspectiva, para lembrar Leibniz de novo, quase sub aespecie aternitati.
E devo até entender que já que é assim mesmo, então...
Esta imagem da MELANCÓLIA DE ALBRECHT DÜRER, foi a contracapa do meu primeiro trabalho existencialista de faculdade. Um trabalho de 1989 sobre Heidegger entregue ao filósofo e professor Ernildo Stein. Aliás, um trabalho sobre o Parágrafo 16 de Ser e Tempo. E você sabe bem que é ali que a porca torce o rabo e que a vaca vai para o brejo na inoportuna falta ou falha da manualidade do Dasein. Quando ele tem consciência de que é separado do mundo, das coisas e dos demais seres.
Sim, ela bem é uma das obras que mais admiro pela coleção de signos que apresenta e pelo que parece nos expressar, pelo que me evoca ao analisar. De certa forma quase tudo que sei(?) e quase tudo que não sei se encaixa nela, como num feixe de diversas redes e ondas a partir das quais as luzes, os silêncios, os saberes e os limites se apresentam ao anjo, ao querubim, ao cão e à mim.
A Melancolia deve ser mais bem vista ai...não mais como um sentimento, mas como o quê mesmo?
Como uma certa forma de consciência talvez...que se renova a cada vez que a vejo de novo.
Como o amor é mais evocado e vivente na presença do seu objeto do desejo, ainda que seja lembrado na sua ausência, na sua falta, mas jamais na sua inexistência.
Melancolia....por onde andavas mesmo?
acabei encontrando esse quadro pesquisando sobre alquimia, ele faz muitas referências a tal assunto, acho admirável também o sentimento que ele pode passar
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