Bem - no final - você olha para a
vida que passou e pensa nas lembranças. Sente que é o fim da linha e não
consegue mais avistar nenhum capítulo ou episódio pela frente. Então espera
como num tempo comprimido a visita chegar. Entende com serenidade que a luz vai
se apagar e não tem mais medo do escuro. Está pronto para atravessar pela
última vez a cortina entre a vigília e o sono e ter o sono mais profundo e
enigmático possível. Mas não tem medo. Olha para o mundo e pensa apenas que vai
acabar se diluindo nele por inteiro. Do pó me fizestes e ao pó voltarei. Sente
que não é só o corpo que irá passar por isso, mas também todas as lembranças,
ideias, afetos e sentidos que encontrou durante a vida inteira. Do menino que
está aprendendo a caminhar e sorri no primeiro passo equilibrado ao avô que
olha o neto repetir o mesmo gesto que um dia viveu. Não tem dor e nem sente
mais o frio e o calor, mas escuta o próprio coração reduzindo o passo e conta
como contava os passos de alguém chegando mais perto o tempo comprimido da vida
toda. Nesse segundo exato sente milhões de anos passarem pelos olhos porque sua
vida não é só sua e sua existência não é mais a expressão de um indivíduo ou de
uma parte de tudo que há. Está completamente integrado ao mundo e essa sensação
traz um conforto inesperado, mas muito bem vindo. Fim.
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