Powered By Blogger

quinta-feira, 31 de maio de 2018

Sobre a Morte que eu Quero - Fim - 2


Bem - no final - você olha para a vida que passou e pensa nas lembranças dela. Sente que é o fim da linha e não consegue mais avistar nenhum capítulo a mais como possível ou um pequeno episódio pela frente. Então espera, como num tempo comprimido, a visita chegar. Entende com serenidade que a luz vai se apagar e não tem mais medo do escuro. Está pronto para atravessar pela última vez a cortina entre a vigília e o sono e ter o sono mais profundo e enigmático possível. Mas não tem medo. Olha para o mundo e pensa apenas que vai acabar se diluindo nele por inteiro. Do pó me fizestes e ao pó voltarei. Sente que não é só o corpo que irá passar por isso, mas também todas as lembranças, ideias, afetos e sentidos que encontrou durante a vida inteira. Do menino que está aprendendo a caminhar e sorri no primeiro passo equilibrado ao avô que olha o neto repetir o mesmo gesto que um dia viveu. Não tem dor e nem sente mais o frio e o calor, mas escuta o próprio coração batendo e pulsando e reduzindo o seu compasso e conta como contava os passos de alguém chegando mais perto o tempo comprimido da vida toda. Nesse segundo exato, sente em si, em seu corpo e mente milhões de anos passarem pelos olhos porque sua vida não é só sua e sua existência não é mais a expressão de um indivíduo ou de uma parte de tudo que há. Estou completamente integrado ao mundo e essa sensação traz um conforto inesperado, mas muito bem vindo. Fim.

P.S.: Fiz isso agora a noite inspirado em Hölderlin e outros. Não tenho medo algum mais e entendo tudo.  Me sinto parte de tudo. Estou vivendo uma experiência muito profunda nos tempos que passam por força de leituras e vivências. Tenho a impressão de que certas coisas que li durante toda a minha vida até hoje se apresentam em minha reflexão com um sentido que não tinham e articuladas com essa vida de forma muito aplicada. Concluí algumas coisas que julgo especiais. Só o amor nos permite enfrentar a morte. Entre a vida e a morte só o amor realmente conta. Todo o resto só tem sentido se ele estiver presente. Talvez seja essa a chave da serenidade ao final e da nossa integração à existência.

A MORTE DE EMPÉDOCLES - SOBRE O FIM


"E abertamente entreguei meu coração 
à terra séria e doente, 
e muitas vezes, na noite sagrada, 
prometi amá-la fielmente até a morte, 
sem medo, com a sua pesada carga de fatalidade, 
e não desprezar
nenhum de seus enigmas. 
Dessa forma, liguei-me
à fatalidade por um elo mortal."

Friedrich Hölderlin

A MORTE DE EMPÉDOCLES

O FIM - 1


Bem - no final - você olha para a vida que passou e pensa nas lembranças. Sente que é o fim da linha e não consegue mais avistar nenhum capítulo ou episódio pela frente. Então espera como num tempo comprimido a visita chegar. Entende com serenidade que a luz vai se apagar e não tem mais medo do escuro. Está pronto para atravessar pela última vez a cortina entre a vigília e o sono e ter o sono mais profundo e enigmático possível. Mas não tem medo. Olha para o mundo e pensa apenas que vai acabar se diluindo nele por inteiro. Do pó me fizestes e ao pó voltarei. Sente que não é só o corpo que irá passar por isso, mas também todas as lembranças, ideias, afetos e sentidos que encontrou durante a vida inteira. Do menino que está aprendendo a caminhar e sorri no primeiro passo equilibrado ao avô que olha o neto repetir o mesmo gesto que um dia viveu. Não tem dor e nem sente mais o frio e o calor, mas escuta o próprio coração reduzindo o passo e conta como contava os passos de alguém chegando mais perto o tempo comprimido da vida toda. Nesse segundo exato sente milhões de anos passarem pelos olhos porque sua vida não é só sua e sua existência não é mais a expressão de um indivíduo ou de uma parte de tudo que há. Está completamente integrado ao mundo e essa sensação traz um conforto inesperado, mas muito bem vindo. Fim.

"Está acontecendo alguma coisa comigo - o que é que está acontecendo comigo?"


O desejo provoca mudanças no nosso sono, na nossa vigília e até no jeito da gente andar e se expressar. No começo você não entende nada, por que esse desejo ainda não tem um objeto. Assim, ele vai construindo um espaço no teu corpo e na tua alma para alguém vir é preencher esse espaço de forma plena. Você não suspeita. Você não está consciente de que algo está se preparando em tua vida. Até que a cadeia de fatos começa a ocorrer é esse sentimento inexplicável começa a ser preenchido por certa presença que vai te mudando os afetos e os sentidos. Quando dá por conta percebe que aquela sensação inexplicável antecipava o que viria sentir e dar sentido ao teu âmago. Encontra então não um discurso, mas nem sequer consegue mais fazer um discurso ou um texto sobre isso. Quer apenas e tão somente viver esta paixão que substitui completamente a falta e faz da espera apenas um episódio vago que ficou para trás.



Pensando em Simone de Beauvoir,, cujo título aqui é a interrogação dela ao chegar aos EUA e passar uma semana sonhando antes de conhecer Nelson Algren e conseguir vencer o vazio que vivia ao saber que Sartre estava vivendo um romance mais do que apaixonado com Dolores Vanetti. A inspiração a escrever isso veio a partir do Romance Biográfico Simone Apaixonada de Irène Frain.

A intervenção Militar melhoraria ou deixaria pior a Situação?

Não resolve o principal problema que é político, econômico, social e de gestão e não deixaria a gente reclamar que não houve solução. Ficaríamos todos impedidos pelo regime de força de reclamar se não resolverem o problema.

A cena dos coxinhas ontem na Refap de Canoas, pedindo intervenção e reclamando do “autoritarismo” da polícia militar prova isso. A outra cena dos coxinhas rezando num posto de gasolina também, E, por fim, as manifestações em frente aos quartéis também mostram isso. É um espírito que busca uma solução absoluta ou mágica aos problemas do país e que esquece que o “prende e arrebenta” da ditadura militar não foi dirigido apenas contra a esquerda ou guerrilheiros. Que as execuções autorizadas pelos presidentes militares – como o último vazamento das CIA prova – não foram feitas somente com baderneiros. Não custa lembrar que a maioria dos líderes que pediram a intervenção militar forma cassados e perseguidos pela ditadura militar, em especial o Carlos Lacerda, líder da UDN. As mortes de Castelo Branco, num “acidente” de avião mais do que suspeito. De Juscelino Kubistchek num acidente de carro na ponte Rio-Niterói, a morte de Jango e muitos outros desaparecimentos e acidentes são suspeitos. Então, é definitivamente ridículo pregar “intervenção militar” ou a volta da “ditadura militar”. É uma sandice e insanidade.

Vejam os seguintes fatos. Estamos há cinco anos nessa escalada de estupidez e imbecilidade. Fizeram uma festa com as manifestações de 2013, sequestrando o movimento contra o aumento das passagens de ônibus e a revolta contra a repressão da polícia de Alckmin em São Paulo. Não contribuíram em nada para se superar o quadro com reforma política ou constituinte, sequer consideraram essa hipótese. Enquanto o PMDB já bloqueava as propostas de mudanças do governo Dilma na Câmara dos Deputados. Depois se embalaram com camisetas da seleção brasileira e o MBL e foram para rua, tinham corpos nús nas manifestações que era um espetáculo de imbecilidade, apoiaram o golpe/impeachment. Do outro lado, a esquerda brasileira reagiu contra o golpe, mas a votação na câmara aprovou o impeachment e no senado, os derrotados da eleição de 2014 fizeram a festa, conspiraram e tiraram a presidenta do poder, dando o cargo de presidente ao vice que passa a trair o programa eleito em aliança com o PSDB e outros derrotados de 2014.

Adoraram e idolatraram o Cunha, cantaram loas ao Moro e ao Dallagnol, a Lava Jato ia salvar o Brasil e as coisas pioraram cada vez mais, porque foi usada como instrumento para aumentar a crise institucional. Já a mídia oficial e dependente de verbas públicas adorou, porque os bons tempos voltaram, Temer compôs um ministério de notáveis com PMDB, PSDB, PP, DEM, PSD, PPS e outros. Promoveram o desmanche da Petrobrás invertendo a política do setor a serviço dos interesses do capitalismo de mercado internacional e a banca internacional agradece elogiando junto com a mídia local, pagam os rentistas regiamente – mais de 50% dos recursos federais, congelaram investimentos e custeio das áreas sociais por vinte anos, asfixiaram as prefeituras com redução de repasses, concederam perdões de dívidas milionárias aos bancos e a certos empresários e latifundiários, arrebentaram os direitos trabalhistas, a fome voltou a figurar no Brasil, destruíram programas importantes em todas as áreas de educação, saúde, assistência social e outros, promoveram uma verdadeira festa de clientelismo com as emendas parlamentares, o desemprego voltou, hoje 27 milhões de brasileiros estão ou desempregados ou em desalento – que é o novo neologismo técnico para disfarçar o desemprego -, e promoveram essa inversão de política na Petrobrás com reajustes sucessivos do gás, do óleo diesel, da gasolina e de outros derivados. Desmancharam os parques e estaleiros de construção das plataformas, gerando milhares de desempregados – o caso de Rio Grande no Rio Grande do Sul é bárbaro, entregaram o Pré Sal à exploração estrangeira e o Brasil continua perdendo a cada dia mais divisas e mais riquezas,

Explico melhor. Nós temos muitos problemas hoje e podemos falar deles como listei acima. Podemos reclamar, protestar, ter opinião, debater, discutir e também votar contra ou a favor de quem propõe soluções se houver eleições gerais em outubro. Podemos até reverter esse quadro e tentar recuperar o Brasil dessa política equivocada e desse programa que não foi eleito pela grande maioria do povo brasileiro nas eleições de 2014. Porém, é preciso acordar dessa ilusão fascista, coxinha e golpista profunda. Com um regime militar as primeiras medidas serão o completo controle da informação, o controle das manifestações e a censura à liberdade de opinião das pessoas. Até mesmo os jornalistas das grandes empresas de comunicação, da chamada mídia oficial ou golpista sabem disso. Com a censura serão proibidas as manifestações contrárias. Então, o governo poderá fazer qualquer coisa e todos deverão ficar calados. É por isso que eu digo que é uma solução que não resolve. Pois, não haverá no horizonte nenhuma solução política para reverter esse quadro e tirar o Brasil de vez da mão desses golpistas e entreguistas.
Será que é tão difícil mesmo de entender isso?

domingo, 27 de maio de 2018

COMO O GOVERNO TEMER E A CNM TRATAM OS PROBLEMAS MUNICIPAIS?


Andei lendo de ponta a ponta os dois últimos boletins da CNM de março e abril de 2018 e fiquei muito impressionado com a tranquilidade dessa entidade municipalista nacional. Tudo se passa como se a situação dos municípios estivesse igual ao período anterior ao golpe, como se nenhuma dificuldade sufocasse as prefeituras e como se todos os problemas pudessem ser resolvidos e solucionados nesse compasso de tartaruga e muita paciência como Brasília  anda funcionando no Congresso, no Executivo e no Judiciário.   

Ora, enquanto isso, 90% dos municípios brasileiros se encontram com problemas sérios para manterem políticas básicas. Creio que parte fundamental da nossa luta para defender, não o municipalismo como um  jargão pessoal, mas sim as prefeituras municipais de todo o Brasil e os cidadãos e cidadãs que vivem nelas passa por justamente apontar essa fraude e engodo que o governo federal e seus partidos aliados e representantes em entidades como a CNN tem promovido. Ao meu ver, eles estão enganando os municípios, seus prefeitos e prefeitas, com promessas de solução que só amortecem e não resolvem nada. E, ao mesmo tempo, essas promessas que não se realizam são combinadas com cada vez mais sufoco, asfixia e estrangulamento das finanças municipais. Além do contingenciamento dos recursos, do engessamento em 20 anos dos recursos, e da transformação de recursos específicos para políticas públicas em emendas, além da redução promovida e cultivada dos repasses municipais dos estados e da união aos municípios, ocorreu também a extinção de muitos programas federais ou sua redução. Programas esses que tanta importância cumpriram no aquecimento e na aceleração da economia nacional e no esforço de se fazer frente a crise internacional de 2009.

A única explicação que eu dou ao fato dessa crise das finanças e das situações municipais não estourar de forma política é que estão acomodando e mantendo essa pauta perniciosa e perigosa para os municípios em banho maria, e que isso só serve para se manterem no poder, não para resolverem os problemas das cidades. O PMDB e seus satélites, assim, se mantém dando benesses só para os poderosos que se sustentam na concentração de recursos no governo federal.

Também é notável essa política de emendas que devolve as políticas públicas aos deputados que passam a ser intermediários dos prefeitos. Isso é exatamente a mesma coisa que a ditadura fazia para se sustentar.

Hoje peguei um texto clássico de um brasileiro sobre as finanças municipais. É lá de 1977 - Korff. E aponta para o mesmo modelo de centralização da arrecadação e dos recursos para fortalecer um sistema por cima e não pela proximidade com os cidadãos. Isso é exatamente a nossa antítese de colocar o estado sob controle público do povo e de colocar o povo no poder. Típica estratégia elitista e tecnicista que só serve para fortalecer as grandes corporações e estamentos que já foram apontados na obra clássica de Raimundo Faoro, Os Donos do poder.

Isso reproduz também o modelo colonial e do império. A capital federal e a elite em festa e as províncias na miséria. É a política do atraso. Colocando o Brasil mais de vinte anos para trás em apenas dois anos do golpe.


P.S.: Texto escrito na terça feira, dia 22 de maio de 2019, debatendo em paralelo a marcha dos prefeitos a Brasília.

GOLPE, CAOS, CRISE E OS IDIOTAS


A receita neoliberal e de livre mercado usada por Parente na Petrobras, com a simpatia da mídia global, deu no que deu. Com a política de reajustes sucessivos, com a entrega do pré sal e outras iniciativas entreguistas no setor, botaram a economia brasileira de joelhos. Isso devorou a renda de todos que trabalham com transportes e aumentou todos os custos diretos e indiretos. A economia andava maquiada e sua solidez era puro fingimento. Com muitas medidas botaram o país à deriva e devoraram suas reservas. Agora com o avanço da crise e, com a paralisação, greve e Lockout que persistirá - porque o governo não tem política ou margem de manobra mais, se reprimiu profundamente a dinâmica econômica. O Brasil vai colher grande prejuízo e com certeza vai reduzir de tamanho economicamente. Vejam que os impostos e as receitas necessárias para áreas de saúde e educação e muitas outras políticas públicas já estavam escassos, agora vão minguar mais também. Já houve o congelamento de recursos em áreas estratégicas por vinte anos - o que é um absurdo - agora haverá depressão maior no financiamento e no custeio do estado. Metade do orçamento federal vai para a dívida e os juros da vida garantindo o pacto com os rentistas e acionistas invisíveis. As prefeituras que já estavam sufocadas em suas receitas e condições de pagamento dos salários, por redução de repasses e ausência de reparos e um vazio de investimentos, vão entrar num sufoco ainda maior. Isso atinge diretamente os cidadãos e cidadãs. Um estado que não consegue cumprir seus compromissos, efetuar pagamentos de salários e fornecedores vai estagnado a economia local e regional. Os estados vão ver suas receitas minguarem por três meses. O PIB do país vai cair no mínimo 10% e até se retomar a dinâmica econômica minimamente, o que também não tem data certa para ocorrer mais, vai demorar no mínimo seis meses até às confianças se restabelecem. A barbeiragem do Parente e do Temer, dos ministros e do congresso que achava tudo muito bom, do judiciário que estava achando tudo muito justo, e de seus blocos de partidos e de interesses vai colocar o Brasil numa situação pré-falimentar. A política para os combustíveis, gás, óleo diesel e gasolina é só um exemplo crítico e que trouxe o limite porque foi abusiva e incontrolável. Em diversas outras áreas as medidas foram também perversas e irresponsáveis. Não mediram as consequências e elas vieram e são profundas. Não adianta ficar culpando empresários somente, nem os caminhoneiros ou os petroleiros no contexto atual. Não adianta botar o exército na rua também. Intervenção militar é uma insanidade, pois não resolve o problema e pode apenas aumentar ele encobrindo a sua gravidade com um regime de força. Só um bando de idiotas acredita nisso como solução. A base da economia é a confiança - Trust - e a confiança foi dissolvida e destruída. O pânico dos consumidores nos mercados é a prova de que ninguém tem uma perspectiva boa no horizonte. Os abusos nas tabelas de preços, provam o estado de anomia e o caos instaurado. Irresponsáveis, eles e aqueles que os colocaram lá, ainda não entenderam o tamanho do problema atual. Nem que você vista toda a população brasileira de verde amarelo, esse te não vai jogar junto mais na mesma direção. Imbecilizaram de tal modo a classe média e as elites que não há hospício suficiente para internar e recuperar a sanidade de todos. De outro lado, as saídas políticas ou estão abandonadas ou fazem pouca diferença num cenário de desespero e irracionalidade. O golpe das pedaladas foi dado, porque ainda havia riqueza nacional a ser entregue e interesses poderosos a serem satisfeitos, usurparam o poder e fizeram a festa, agora já entregaram tudo e o grande butim foi feito e a festa de impunidade está consagrada. Como configurar já que o país andou para trás vinte anos em dois, não há muito mais o que fazer. Parabéns aos idiotas, aos coxinhas, aos patinhos, aos fascistas, aos liberais ou pseudo liberais e aqueles que acreditam em soluções absolutas. Conseguiram colocar o país num caos. Brasil, se não o ama, deixe de meter o bedelho no seu destino: canalhas!





P.S.; O texto trata da Greve dos caminhoneiros que está parando o Brasil desde a última terça feira dia 22 de maio de 2018 e que vai seguir nesta semana. 

segunda-feira, 21 de maio de 2018

SARTRE E SIMONE


Eu admiro muito os dois. Creio que muito se deve a uma fama projetada pela imprensa que transformou os dois em notoriedades. Quando eu era jovem eles tinham uma fama absurda e sou daqueles que viu pela tevê o enterro de Sartre abismado pela grandiosidade da sua despedida em 1980. Já disse antes que talvez Sartre tenha sido o filósofo com maior fama da história. Confesso que Simone quando faleceu parecia ainda estar encoberta pela fama de Sartre. Hoje vejo isso de forma muito diversa.

O casal existencialista, porém, conquistou a fama no pós-guerra e não dá mesmo para se esquecer disso. Expressavam uma espécie de ideal de liberdade em muitos sentidos. Fizeram escola e tiveram milhares de seguidores pelo mundo em diversos aspectos de suas obras e vidas. Isso não aconteceu mesmo sem os méritos próprios de ambos. O casal existencialista tinha um pacto ou acordo que ficou conhecido como uma autorização a liberdade de relações livres de ambos. Para a posteridade ficou a ideia de que eles tinham uma relação essencial e necessária e que as demais relações eram acidentais ou contingentes. Não parece ter sido exatamente assim. Isso gerou alguns rolos consideráveis, mas também constituiu uma família em torno de ambos. Essa "família" era não convencional e grandiosa e envolvia em torno deles, entre amantes e dependentes, muitos que precisavam e que gozavam de novos laços não tradicionais para dar sentido às suas vidas e sobreviver a um mundo pós holocausto, pós bomba atômica e que, no auge da loucura, já ensaiava uma guerra nuclear num mundo bipolar. 

Eles se posicionaram em tantos debates públicos e controvérsias no tempo deles que davam a impressão de não estarem dormindo para nenhuma questão. Hoje quando vemos alguns intelectuais se posicionarem, temos a impressão que fazem isso e que logo voltam ao fundo de suas cavernas para preservar suas imparcialidades isentonas e que vão continuar se omitindo para as regressões terríveis que vivemos. Parece que voltam a dormir para não se perturbarem com engajamentos ou responsabilidades coletivas.

É interessante observar também o paralelo estranho entre eles e a cultura americana do pós guerra. Na América, começam a surgir movimentos culturais indesejáveis também. Logo tem o surto de macartismo nos EUA e se inicia aquela perseguição hodienda a qualquer um que pareça de esquerda na cultura, na política e na sociedade americana e um pouco depois explode a geração beat (On the Road é de 1957, mas seu movimento é do pós guerra) - que é a antecessora dos hippies, mas que naquela época com o jazz também nos subterrâneos da sociedade - que é com os blues e o gospel o pai do rock - tudo que é contracultura ou que expressava alguma forma de rebeldia ainda fazia parte dos subterrâneos da América.

Sartre era razoavelmente suscetível a impulsos e paixões. Tão suscetível aliás quanto a maior parte dos homens das gerações posteriores a ele, ainda que não confessem ou mantenham esse aspecto sob segredo ou sigilo, mas exercia isso com destemor e liberdade. Procurem alguém como ele em sua geração (nasceu em 1905). Picasso ( mais velho porém) talvez, mas quantos homens mais? Salvo alguns atores mais ousados do anos 50 e algumas poucas atrizes, no geral esse é o império da repressão sexual e da imposição da moralidade conservadora.

Como sabemos nos anos 60 tudo isso vai para o espaço com as naves que tomaram a Lua e a liberação ou revolução sexual. As apolos levam não somente o homem a lua diga-se de passagem. Mas também o imaginário de conquista da humanidade. A vontade de poder vai ganhar uma realização explícita. Voltando a Sartre, este tinha uma espécie de liberdade auto-conferida de assédio e sedução e cortejou muitas mulheres. Simone, por sua vez, era bissexual e muito assumida nisso. Não se pode dizer que era tão polígama quanto Sartre, mas fazia pouco caso disso. Ambos pagaram um preço por isso que só não foi tão alto, por que Jean-Paul Sartre recebeu uma herança e logo em seguida estoura nas vendas de livros e com um sucesso estrondoso em filosofia, literatura, teatro e até mesmo em muitos roteiros de cinema, se sustenta tranquilamente ao ponto de dispensar um prêmio Nobel nos anos 60.

No filme Os Amantes do Café Flore se exibe um período importante de ambos, desde o primeiro contato deles na École Normale Superieure (1928) até a partida de Nelson Algren (1952-53-ou 54, tendo em vista que consta, logo após essa ruptura com Nelson, um romance e praticamente um matrimônio com Claude Lanzmann de 1952 a 1959), descontente com os persistentes compromissos de Simone com Sartre, apesar do amor recíproco entre ele e Simone (as Cartas de Amor, já publicadas, se iniciam em 1947 e prosseguem até 1964, mesmo após a ruptura do relacionamento).
Eu gostei muito mais da segunda parte do filme quando o romance com Algren é apresentado de um modo mais intimista e com um roteiro mais estético por assim dizer. Base desse roteiro é o relato dela na obra Os Mandarins. Não é pouca coisa ele ter sido o homem que proporcionou o primeiro orgasmo sexual a ela, mas mesmo assim ela manteve e disputou a supremacia dessa relação necessária com Sartre. Aqui cabe minha digressão sobre atração intelectual e o modo como tal tipo de vínculo tende a ser sempre muito mais forte - para aqueles e certos intelectuais - do que o sexo ou as relações carnais. Disputou, a partir desse momento, porém, Sartre com todas as demais amantes e donas que ele se deixava e procurava ter. Não se tratava de uma relação carnal, mas sim altamente intelectual. Creio que a designação correta é de que eles tinham uma relação fraterna e parte dessa mitologia de casal fazia mais parte de um dispositivo de marketing de ambos que mantinha ambos sob a s luzes do movimento que representavam. Nesse sentido, devemos reconhecer com mais força ainda a contribuição à filosofia, à política e ao feminismo articulado e sustentado pelos dois.    

Talvez esse tenha sido o segredo de Sartre, ele transferia a posse machista para as mulheres e ao fazer isso tornou nelas possível a fêmea alfa. Em todos os casos ele deixava as mulheres terem esse sentido de posse que em Simone também pode ser observado. Pouco importava se elas possuíam ele de fato ou não, se ele se entregava de fato ou não. Já Simone parece o tempo todo ser a enigmática, a esfinge a ser decifrada e mesmo com seu sucesso se manteve como a mulher silenciosa, sob sombra do filósofo. Uma dialética estranha essa, porque não nos damos conta facilmente das diferenças entre os dois que aparentemente se movimentam sempre juntos como um par complementar. Mas quando se olha mais de perto se percebem diferenças não somente de gênero, para além dessas aparências Talvez por isso transmitiam essa imagem de um casamento perfeito ainda que não convencional.

Gosto muito das narrativas auto-biográficas de Simone. É parte relevante da sua obra para um leitor das demais peças que lavrou. Entre romances, peças de teatro, o Segundo Sexo, existem duas memórias cerzidas quase a exaustão de detalhes e na perfeição dos enredos antes escondidos nos bastidores e que são revelados. Leio nelas uma narrativa muito franca e despida de um senso burguês de preservação da verdade aos desconhecidos. Não há auto-censura. Ela escancara. Bota os lençóis da lua de mel na janela da ville. Ambos eram muito despidos de censura e não davam à mínima para a moral convencional. Por isso conviveram tranquilamente com a poligamia de ambos e a bissexualidade de Simone. Os amigos ou amigas que sofriam com isso se afastavam, os amantes que não suportavam isso se afastavam ou reprovavam apenas. A maior parte deveria olhar para eles e exclamar: não há nada a fazer. Eles querem assim e são livres para isso. As obras dela, que comecei a ler no último período, A Força das Coisas - em dois volumes - e Cerimonia do Adeus são notáveis para mim. O que muitos não gostam de fato é da franqueza dela. Ela revela em detalhes tanto os riscos que correram com seus envolvimentos quanto os mal-entendidos, os abusos e os acidentes de percurso. Não vou listar isso aqui. Me parece muito relevante que ela tenha sido a narradora de tudo e de todas aquelas relações do período. Em A força das coisas, dá detalhes de diversas controvérsias de bastidores numa narrativa plena e que me parece muito honesta. Talvez, além de suas outras obras ficcionais ou teóricas, ter esses depoimentos nos ajuda a compreender melhor a ambos, compreender com uma descrição biográfica, sociológica e ideológica o jogo intelectual importante em que eles estavam envolvidos com muitos outros personagens importantes. Os laços políticos e as diferenças são explicitadas.

Por fim, a cada dia que passa me dou mais conta da grandeza de ambos para o seu tempo, tanto pela ousadia quanto pelas ideias que formularam e transacionaram para o resto da humanidade. Meu comentário mais extenso que escrevi no fim da manhã se perdeu num lapso do smartphone, parte dele está aqui. Outra parte deixo para o tempo e a oportunidade de comentar ou debater.

Obrigado ao Renato Janine Ribeiro pela foto de Simone e Sartre nas Dunas de Nida e pela sua abordagem do “casal”. Essa foto e seu contexto é narrada em A Força das Coisas e me lembra o que significativa deve ter sido a grande travessia de ambos no deserto espiritual do século XX.





Nos lembramos também, ao ver essa imagem, o quanto Castor ia muito mais à frente de Sartre, o que para mim hoje parece muito mais evidente, ao ponto de pensar que a proposta do tal acordo era dela e não dele.

P.S.: As Dunas de Nida ficam na Lituânia. O passeio dos dois foi em julho de 1965. A foto é de Antanas Sutkus, fotógrafo que acompanhou os dois e tirou muitas fotos de ambos.

sexta-feira, 18 de maio de 2018

DEMOCRACIA, PASSADO E FUTURO, EFEITOS RETÓRICOS E A BOA LUTA DA PALAVRA


A ideia de entrelaçar passado e futuro quando é erguida, pode aparecer como um efeito retórico de valorização do encontro em um tempo presente de potenciais e possibilidades virtuais de um futuro ainda não realizado. Mas este encontro não se realiza no relógio ou numa ampulheta. Ele se dá na palavra, nos discursos e naquelas expressões e argumentos que atingem performativamente seus objetivos. Em ideais expressos ou em cursos de ação propostos no discurso temos um efeito retórico. 

Assim se deu com a democracia, onde a liberdade, a igualdade e a dignidade passam a ser não somente valores ou ideais, mas ditames práticos e regras nas relações entre os desiguais numa sociedade que quer superar o passado e lançar-se ao futuro, abrindo novas possibilidades para todos.

O ato de fala fundacional desse processo constrói um novo tempo em que o passado e o futuro se encontram virando uma página da história. Torna fato ou lei, a expressão de um ideal ou de uma proposta de ação que é levada a cabo motivadamente, conscientemente ou não. Nesses momentos, nem sempre se realiza plenamente o que é expresso, mas se inicia ali algo que leva naquela direção proposta, antes inédita ou somente vislumbrada. Por isso, é preciso atualizar essas possibilidades.

Alguém poderia objetar que isso é só um elemento retórico ou o suporte da dominação modernizada. 

Em parte sim, pode ser só um efeito retórico, mas a medida da retórica na história não pode ser subestimada por que muitos fatos históricos e de dimensão superior tiveram como fagulha inicial apenas algumas palavras, alguns discursos e argumentos postos no centro das relações políticas e sociais humanas. Em muitos casos, eram reapresentações de velhas palavras em um contexto mais favorável. Em outros, elas chegavam na hora certa, em meio de argumentos já reconhecidos e coroavam um ato de fala em que os efeitos pareciam estar prenhes na consciência da audiência de uma assembleia.   

Vejo Clístenes – como narra Vernant e muitos outros - erguendo mais uma vez na sua voz a ideia de igualdade, que já tinha sido esboçada por Solon, mas dessa vez consolidando na assembleia um novo valor que se transforma em modelo de todas as democracias posteriores. Ele defendeu que o princípio da igualdade é direito de todos, e que a participação ativa de todos os cidadãos na vida pública deve ser favorecida. Para aqueles que consideram isso idealismo, que nada de prático resultou desse idealismo posto em palavras e na lei, é bom  lembrar que foi a partir disso que Atenas passou a se transformar na maior potência econômica grega.

Vejo ainda e também, o Abade Syeies declarando na Assembléia que os Estados Gerais estão reunidos e deflagrando a verdadeira revolução que não consiste apenas na tomada da bastilha, mas sim na abertura das deliberações contra a monarquia decadente. Mas também vejo atos de fala em que simplesmente uma sentença declarativa é expressa mais uma vez e nesta oportunidade causa mais efeitos do que quando foi expressa em outras tentativas de causar os mesmos efeitos. Isso vale, também, creio eu para outros ensaios.

Poderíamos listar aqui muitos outros, nessa senda de construção histórica sob um mesmo espírito. Quantos dos leitores atuais deles, já não ouviram odes que não surtiram os efeitos desejados? No atual caso e talvez em muitos outros exemplos para os quais devemos estar abertos e atentos, procura-se ressignificar ou revalorizar a palavra e o sentido da proposição de tal modo que seus efeitos sejam benfazejos e renovados. Ser capaz de acolher de novo a palavra pode nos libertar do bloqueio histórico em que vivemos. O ato retórico pode ser o invólucro de intenções, mas também pode ser a revelação e a expressão de uma consciência que deixa de ser individual e passa a ser compartilhada e querida, desejada ou estimada por mais pessoas do que o seu autor. 

Hannah Arendt problematizou este tema da ruptura ou do reencontro com o passado por um presente que ainda se quer manifesto, mas não realizado, por que ainda não tem ou não possui o estatuto completo de sua realização, mas que procura alcançar persistentemente este efeito que deixa, então, de ser apenas retórico e produz a mudança. No mundo atual ocorre uma desvalorização da palavra e do discurso, mas isso é um grande erro, pois é através delas que a história e a roda do mundo podem girar na direção do futuro e não retrocedendo 20 anos em 2.

domingo, 13 de maio de 2018

SOBRE O TOMBAMENTO DA PRAÇA DO IMIGRANTE DE SÃO LEOPOLDO JUNTO AO IPHAN

Retomei neste mês o texto do Memorial de Tombamento da Praça do Imigrante de São Leopodo.

Esta retomada tem o objetivo de complementar e qualificar o texto original tendo em vista fazer revisão e complementação de dados sobre a Praça do Imigrante para efeitos de avançar no tema por interesse histórico e intelectual.

De maio de 2012, em que o Memorial foi entregue ao IPHAN até os dias de hoje, o processo foi efetivamente retomado.

No IPhan está em andamento o processo que deve receber mais um parecer ainda neste ano. Pelas informações que recebi do Professor Joel Santana, que atualmente dirige a área de Patrimônio Histórico da Prefeitura de São Leopoldo, o andamento está seguindo favorável.

Parte desse avanço se deve a iniciativa da administração municipal de 2009-2012, dirigida pelo Prefeito Ary José Vanazzi, com o Secretário da Cultura Pedro Vasconcelos, por ter construído e dado as condições para o trabalho do memorial que dá início ao processo de minha autoria.

De lá para cá os representantes do Instituto 2024, em especial o Sr. Airton Schuch que me procurou em 2015  para ter conhecimento do processo e do memorial. Isto foi feito por orientação do Prof. Dr. Martin Dreher e prontamente lhes passei tudo que possuía sobre isso, o que incluía a memória digital do trabalho e o número de registro no IPHAN.

No mesmo ano, o trabalho passou a ser divulgado no site do Instituto 2024 inserido com cópia dos oficios e despachos do processo.

Agradeço a continuidade do movimento de tombamento e também tenho certeza que a atual administração - em que Ary Vanazzi é o Prefeito = Gestão 2017-2020 - e Pedro Vasconcelos Secretário da Cultura e das Relações Internacionais, não vai poupar esforços para concluir esse processo da melhor forma possível e, se tudo correr bem, em 24 de julho de 2024, a Praça do Imigrante já fará parte do Patrimônio Histórico Nacional Brasileiro.

Dou link a seguir do trabalho para os amigos e amigas dessa luta e os parceiros e parceiras dessa história:

ISL2024: MEMORIAL DE TOMBAMENTO DA PRAÇA DO IMIGRANTE

sábado, 5 de maio de 2018

Do Pessimismo para a Graça 2



“Apesar de você, amanhã há de ser, outro dia...”

Agora entendo melhor a dedicação de muitos a fazer graça e usar do humorismo na ditadura militar brasileira (1964-1985). Esse espírito habitou e vivificou a resistência de forma tão eficaz ou mais eficaz do que outras medidas. Na música, no teatro, na literatura, poesia, jornalismo alternativo, nas escolas e igrejas. Poderia dar aqui milhares de exemplos do uso bem dosado do humor para suportar aqueles dias.

Não é – vejo hoje muito bem - uma forma de desprezar ou não reconhecer a gravidade da situação, mas é uma forma de sobreviver ao desalento e ao desespero que uma situação dessas implanta. Porque, mesmo num horizonte nebuloso, no fundo escuro das trevas de um país mergulhado em autoritarismo, é preciso sorrir. Ou seja, entendo porque muitos fizeram graça ou pirraça no meio de uma ditadura militar. Não é por cinismo não. Essa foi uma forma de debochar perante o fascismo e de manter a erguida a bandeira da esperança, em meio aos horrores e às piores tempestades. De fato, tratou-se de uma estratégia de sobrevivência psíquica. Um recurso para preservar a sanidade em meio à loucura, à insanidade e à decadência de um país mergulhado nas trevas, isto é e foi, um meio para sobreviver no reino da burrice, no reino da censura e do autoritarismo. Digo burrice, porque só a ignorância histórica faz hoje o elogio daquele tempo e mortificar-se em meio a uma tragédia, é somente aumentar o sofrimento e esticar a corda para além do limite necessário.

Não embarcar, então, no pessimismo generalizado que sempre acompanha os momentos difíceis – que vem travestido de um extremo realismo, mas que, de fato, é pura depressão causada pelo desespero de causa, é uma forma de abrir os horizontes e garantir o ânimo necessário para a ação e a reação que vão construir a luz no fim do túnel e a saída desse tempo tenebroso. Ninguém como a esquerda que tantos reveses já sofreu na história – cujo balanço detalhado inclui mais derrotas do que vitórias – tem mais necessidade de fazer isso de ter essa atitude e espírito de bom humor.  

Dura demais é a vida para qualquer inteligência mediana e bem informada neste país, que não seja capaz de rir e debochar com riso alargado dos que promovem os atuais retrocessos na nossa história. Penso que precisamos fazer isso muito mais. Lendo os compartilhamentos que fiz nos anos que antecedem ao golpe/impeachment no passado e tendo sempre a capacidade de pensar na perspectiva pior em qualquer direção que as coisas sigam – apesar de não externar isso jamais - me dei conta do todo da obra golpista, do alcance e das implicações do ridículo que vivemos. Porque todas as vitórias contra nós são produto de manobras, burlas, fraudes, conspirações e usurpações. Não é a justiça que nos condena, mas sim a injustiça togada, não é a sabedoria que nos julga, mas sim a estupidez diplomada, não é a moral que produz juízos sobre nós, mas sim a imoralidade mal disfarçada. Os exemplos vergonhosos do que digo são assombrosos. Nenhum dos nossos acusadores sobrevive ao teste da verdade ou a prova criteriosa da defesa do interesse público, do bem comum ou da soberania nacional. É cômico ver e ouvir as arguições de nossos adversários em qualquer palanque, tribuna, sob as câmaras da tevê, nos microfones das rádios, nas colunas dos jornais, na mesa de bar ou do cafezinho no ônibus ou nas ruas. Veja que simplesmente não tem a razão, nem boas razões e os argumentos que usam provam isso ao limite do ridículo. Nos resta mesmo rir deles, além de lutar, fazer passeatas e erguer a nossa voz nas ruas contra o golpe e a agenda golpista, porque tal coisa não poderá sobreviver impune à nossa capacidade de fazer graça.        

Se pode ficar muito pessimista sim, eu compreendo perfeitamente isso, mas é preciso encarar o pessimismo com altivez e bom humor. Este é um modo de usar o pessimismo de modo racional de certa forma, na dosagem certa, como a base sobre a qual invertemos a chave do humor e atacamos impiedosamente e sem temor os absurdos que vivemos. Não vamos sair mesmo desse estado que parece ser o pior dos mundos possíveis, sair do muro de lamentações e dos prejuízos sociais e culturais que se vão acumulando, sem acusar com a ponta do lápis o ridículo disso tudo.

Alguns dizem, porém, como forma de alerta e de advertência, que vamos viver isso tudo ainda nos próximos dez ou vinte anos, mas eu creio que isso só pode aumentar, se nós não enfrentarmos esse processo com a audácia, ousadia, galhardice e a coragem necessária. Vamos fazer graça. Vamos fazer tudo aquilo que pode envergonhar esses canalhas, porque de fato o que lhes falta é mesmo a falta de vergonha e o senso do ridículo. Vou virar um pouco mais humorista. Acho que é no modo de ação e de reação a única saída mesmo. Muita ironia e garbosidade. Bom humor e informação precisa ajudam muito na sobrevivência psíquica da gente e de muitos de nós. Mantendo, então, a ternura, mas endurecendo nas tintas. Fazer então graça, manter o humor elevado nos fará sobreviver e ao mesmo tempo constranger esses canalhas.