"...em uma sociedade como a nossa,
mas no fundo em qualquer sociedade,
existem relações de poder múltiplas
que atravessam, caracterizam e constituem
o corpo social e que estas relações de poder
não podem dissociar, se estabelecer,
nem funcionar sem uma produção,
uma acumulação, uma circulação
e um funcionamento do discurso.
Não há possibilidade de exercício do poder
sem uma certa economia dos discursos de verdade
que funcione dentro e a partir desta dupla exigência.
Somos submetidos pelo poder á produção da verdade
e só podemos exercê-lo através da produção da verdade."
Michel Foucault. Microfísica do Poder.
Avaliações, análises e diagnósticos
na política possuem em si e trazem consigo propósitos. Mesmo em situações de
vitória, as avaliações por mais brilhantes, claras e precisas tem propósitos. Avaliações
apresentam motivações sob a camada retórica e também sentimentos que muitas
vezes não são tão bem analisadas assim por seus autores. É por isto que alguns
autores chamam e confundem discursos políticos com ações. Porque o discurso neste
terreno age, faz algo não somente interpreta, descreve ou conceitua. Dá, este
discurso, realidade a fatos, cria situações e condiciona as ações dos outros. Assim, para traçar um paralelo libertador
aqui, estamos em uma situação em que quando dizer é fazer, se transforma aqui
em dizer com pretensão de fazer.
No caso de derrota nem todos os
discursos e fazeres são bem vindos, porque é exatamente nesta situação que você
não pode dar nenhum passo adiante partindo somente das pretensões ou das ilusões
individuais. A não ser que você pretende andar sozinho ou construir uma
perspectiva particular ou um projeto particular. Mas também é preciso entender
que nem todo discurso é somente individual, pois também ocorre que alguns
discursos aparentemente individuais introduzem de fato pretensões coletivas, ou
seja, pretensões de células ou organizações parciais do partido. Talvez
tenhamos que ser mais rigorosos aqui na nossa discussão e diferenciar “personalismo”
de “espírito de facção”. São, na prática, dois tipos de desvios do projeto
coletivo que geram vários desencaminhamentos. Mas é claro que um partido democrático
deve chegar em uma boa síntese de todos estes discursos e reduzir ao máximo a
ilusão e o auto-engano em seu seio e em suas decisões. Porque é basicamente
isto que leva para uma derrota. Por mais maravilhoso que seja o nosso projeto
ao se acrescentar a ele a hegemonia de personalismos ou o espírito de facção se
engendra a derrota que tivemos. Assim, quando se avalia a coordenação de campanha,
os caciques, os candidatos, o slogan, o projeto e as atitudes individuais de
cada um devemos ser capazes de olhar sim para os erros em todos nós. Na medida
exata de nossas responsabilidades.
Eu adoro falar em renovação também,
aliás creio que todos os quadros intermediários gostam disto por sua própria
natureza, mas a forma como se fala disto e as pretensões que se apresentam ao
tratar disto dizem muito sobre se a renovação é real ou somente de aparência. Não
me serve de nada uma renovação que reproduza os mesmos erros anteriores ou que
engendre de novo ilusões pessoais e fantasias de grandeza. Não me serve de nada
se isto vier a gerar mais degeneração burocrática e maior submissão a uma ordem
externa para a qual pouco importam os resultados locais, mas sim a contribuição
do local nos resultados regionais ou proporcionais. E nós sofremos disto no último
período. Há que se fazer algum esforço para que o PT de São Leopoldo não se
resuma em um curral eleitoral para aqueles que querem apenas lavrar votos
proporcionais em 2014, sem pensar nas consequências da derrota local ou da
dissolução da representação local no cenário estadual e nacional. E percebo
nitidamente estas pretensões aqui.
No nosso caso, em especial, temos que levar em
consideração que a própria derrota foi causada por estes desvios – que alguns
chamam de personalismo aqui e ali. Mas é preciso, como tentei mostrar aqui,
esclarecer melhor o que é o personalismo ai. Não creio que seja possível, como
já disse antes, recuperar os prejuízos e perdas do último período sem fazer certas
avaliações sobre nossos erros para reconstruir – porque já tivemos isto sim – uma
forma de atuação coletiva acertada e que reconstrua a confiança do povo em
nosso projeto e nossa forma de atuação. Para isso é preciso cuidar muito o que
se diz sim. Porque a unidade é mais necessária do que parece. Mesmo aqueles que
olham para a atual circunstância vislumbrando uma oportunidade de ascenção, de substituição
de caciques ou de mera vingança, tem ou não responsabilidade sobre o futuro que
devemos construir. E nós devemos dizer claramente que propósitos e quais
pretensões são cabíveis para o futuro próximo, excluindo sim aquelas que vão
nos levar de novo para o facciosismo e o personalismo.
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