Um dos maiores desafios de gestão e de qualquer tipo de associação é como fazer uma leitura adequada das circunstâncias externas e combinar isto com um conjunto de ferramentas adequadas para enfrentá-las e, também, definir as crenças que podem contribuir para o êxito neste empreendimento.
A relação entre estes elementos pode parecer simplista até, mas não parece razoável subestimar a dependência entre uma ou outra destas três variáveis, seja na definição de mais ferramentas, seja na definição de crenças mais fortalecidas.
Podemos até supor que a arte da liderança consiste justamente nisto, nesta equação que muitas vezes só pode ser atingida coletivamente, se o debate for franco, honesto e com o menor índice de fantasias subjetivas.
A tradição clássica e a tradição moderna supunham que a liderança só perfaz este raciocínio individualmente e esta é a tradição dominante ainda hoje. Mas, bem entendida a filosofia do século XX, é passada já a época ou o século em que se descobriu que pensar sozinho pode ter eficácia reduzida e pode ser mais aberto ao erro de abordagem e ao preconceito.
Não há como negar que o debate coletivo, o conselho de opiniões e conhecimentos diversos ajudam em muito na deliberação política e gerencial. Não dá mais para fazer política pensando sozinho, não dá mais para gerenciar uma empresa com um único conselheiro, não dá mais para observar uma associação ou algum movimento com um mínimo de eficácia nos seus empreendimentos que depende exclusivamente daquela cabeça iluminada ou daquele gênio da lâmpada.
Bem vistas as coisas qualquer liderança que se preze - que consegue fazer o jogo hábil e racional com as crenças internas das organizações, tem há muito tempo um conselho atrás de si, ou junto consigo ou à sua frente.
Claro, ainda vemos, em muitas circunstâncias, pessoas que exercem lideranças quase como que se fossem gênios da argumentação, da análise e da política. Seja na capacidade de promover as crenças certas dentro das organizações, seja na capacidade de projetar para fora delas um discurso de alta performance e de grandes resultados. Não vou apontar nenhum exemplo porque a busca de exemplos também é uma experiência importante na compreensão do que estou a dizer aqui.
Neste sentido, vale aqui ressaltar, estes personagens tornam desafios superáveis a escassez de ferramentas ( o que inclui aí, regras, recursos, meios e técnicas), ou o ambiente externo desfavorável e eventualmente muito desfavorável.
Se estivermos corretos neste raciocínio, nesta análise de caso, então, definir com mais qualidade o que são estas crenças, como produzí-las, encontrá-las e reconhecê-las dentro das organizações é um caminho importante na arte da liderança que torna capaz a superação de dificuldades. Mas devemos aqui salientar que algumas destas crenças são, inclusive, invenções. Não são descobertas pelo caminho tradicional de busca e investigação da realidade da organização ou instituição.
É aí que um aspecto interessante da liderança de perfil tradicional entra com aquele componente fundamental da liderança: a visão de futuro. Digo com isto e com mais coisas que a visão importa numa capacidade que não é inata - mas que muito nos parece assim - de perscrutar o futuro, visualizar uma perspectiva e um estratégia que aponta para o caminho certo.
Muitas vezes isto é visto como somente uma crença como qualquer outra, mas temos que prestar mais atenção aos sonhos de alguns visionários. Muitos deles não conseguem apresentar adequadamente o que vislumbram quase como uma mágica. Aquilo que exerce um fascínio aparentemente absurdo para aquele indivíduo da organização pode ter mais valor do que aquela anedota sobre a fantasia que muitas vezes acompanha este indivíduo.
Só devo observar que muitos não entendem o que chamamos de "crenças". Porque parece que estamos reduzindo a importância das fortes convicções e dos conhecimentos consolidados deste ou de outros indivíduos. Mas não é o caso. Trata-se de atenuar o valor de verdade e tratar melhor o papel da disposição e das intenções subjetivas nas organizações
Não tem nada que ver com aquele papo de igreja ou de filosofia de vida. Não é o caso de ver melhor qual a filosofia desta ou daquela instituição.
Veja bem - isto talvez nos ajude a lidar melhor com as crenças em diferentes grupos de trabalho e ambientes internos e externos.
Se tomarmos isto como uma lição de administração podemos ficar aborrecidos e vir com aquele papo de que já pensamos tudo sozinhos e já sabemos tudo. Mas não é disto que eu estou tratando aqui não.
Veja bem estou definindo crenças como aquele conjunto de opiniões que circulam nos ambientes da empresa, para alguns isto é a filosofia da empresa mas isto não vale porque a empresa pode ter uma filosofia e no entanto o que habita o ambiente interno é outro discurso bem diferente. Crenças aqui envolvem expectativas de futuro, avaliações sobre as qualidades, virtudes e problemas da empresa, inclusive aquelas receitas já adotadas ou a adotar que parecem trazer consigo alguma aura de eficácia, eficiência e precisão. Os membros da equipe passam a acreditar ou continuam acreditando naquilo que dá sentido as suas atividades.
Muitas vezes as crenças internas são mais importantes que a hierarquia da empresa porque nelas a noção de poder é mais forte do que na hierarquia do organograma da empresa. E neste meio que circula também o reconhecimento aos mais experientes, aos mais antigos da empresa e também aos garotos prodígio e aos talentosos. Muitas vezes as crenças organizam efetivamente o cotidiano dos grupos e das equipes.
Por isto alguns autores chamam especificamente esta família de crenças que precisamos descobrir de crenças dominantes ou de idéias hegemônicas, pois elas podem não ser compartilhadas pela maioria dos indivíduos e podem inclusive serem desconhecidas por muitos, mas ditam as ações e as condutas produtivas e interativas dos indivíduos.
Descobrir esta crenças é quase como descobrir o que mantém uma instituição com sua vitalidade - para além da marca e do seu capital - e o que pode permitir o impedir propostas de mudanças ou de transformações, seja nos objetivos da empresa ou instituição, seja na sua própria forma de organização. São estas crenças que são mobilizadas para impedir a mudança na instituição e nas sociedades, elas são portadoras de uma verdade tradicional, geralmente aceita e que dificilmente é posta em questão.
E é do conhecimento e do manejo delas que se constitui parte fundamental e decisiva da liderança e ou das lideranças nas instituições e grupos sociais. Não é muito difícil percebermos que em instituições democráticas - tipo partidos de forma democrática ou associações com participação democrática - que todas as pretensões de liderança devem passar por algum tipo de processo em relação às crenças dominantes ou tradicionais e que deve ser capaz de apresentar novas crenças para os demais membros da instituição. Novos objetivos aparecem nas organizações desta forma também.
Claro que não podemos esquecer que a pressão do ambiente externo e as ferramentas disponíveis são, ao fim e ao cabo, justamente os desafios que as lideranças devem superar na constituição destas novas crenças, pois elas podem, fazer isto reconhecendo a sua origem ou apresentando-as como forma de evitar a rendição ao elemento externo.
E é justamente esta a atitude frequente nas organizações políticas. Assimila-se o elemento programático do adversário porque este se tornou dominante junto à opinião pública. No Brasil e aqui no RS o Orçamento Participativo passou por isto, após sofrer forte resistência dos partidos adversários hoje é um elemento assimilado.
Antes de continuar, mais uma pausa....in progress
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