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sexta-feira, 24 de julho de 2009

EUCLIDES REDIN NO OLINDO FLORES

EUCLIDES REDIN no OLINDO FLORES

Quando a gente pensa que mais ninguém vai ser capaz de retomar a luta lá na escola onde eu trabalho aparece uma fagulha que incendeia as consciências e faz a roda da vida girar novamente. Inda bem...

Na última quinta-feira (23/07/09), o Professor Euclides Redin esteve lá no Olindo Flores fazendo uma atividade de formação com 31 educadores da escola. Vou resumir com as minhas palavras, algumas anotações e comentar o que ele veio trazer para nós e reapresentar para os professores.

Falou sobre Debates em Educação e iniciou a partir do fato de que há uma teimosia nos debates educacionais de colocar a culpa em alguém pelo fracasso escolar, ou são os professores, ou são os alunos, mas nunca é o sistema. A teimosia em culpar o aluno persiste muitas vezes entre os professores também. Mas nós temos que olhar para a crise da escola no mundo e também para a crise da sociedade.

Os alunos, segundo ele, querem aprender algo significativo. Algo que encontra conexão com a realidade deles. Não é difícil concordar com o professor Euclides, pois é já um princípio da pedagogia progressista a idéia de que a aprendizagem precisa ser significativa. Ele nos pergunta em que sentido podemos dizer que saber o nome de todas as ilhas das Antilhas é importante, ou saber o nome de todas as Ilhas Virgens.

Neste sentido, fica claro porque o ensino profissionalizante é atraente e desafiador para os alunos ele tem uma conexão direta com a perspectiva da vida do jovem.

Há também um efeito sobre a educação proveniente da Crise do Estado. Faz um tempo já que é afirmado por aí que o estado faliu. Claro este discurso parte de uma abordagem submissa à lógica de tirania do mercado. O mercado pode tudo e o estado está atrasado ou atrasando o desenvolvimento das forças produtivas (para usar uma linguagem do velho barbudo Marx). Mas as coisas não são bem assim. De certa forma havia uma ilusão de que tudo que era privado era mais eficiente, mais competente e melhor.

Havia um discurso das competências que é fortemente ideológico, a saber, procura transformar em real uma opção política e ao fazer isto procura interpretar a realidade a partir desta interpretação. Isso já sabíamos de certa forma. Daí Redin dá um passo interessante: ele aponta que o famoso e generalizado discurso das competências e das habilidades esconde um viés também ideológico. Como se sabe a idéia é que o aluno tem múltiplas ou algumas competências e que o professor deveria ser capaz de desenvolvê-las. O problema aí é que se estas não aparecem voltamos à realidade antes apontada, ou o professor é incompetente ou o aluno é incompetente, e continuamos olhando para a escola e o sistema sem questionar a sua lógica e os seus objetivos.

Nós todos lembramos que este discurso das competências dizia “privatizando as coisas se equilibram ficam melhores”, ou seja, o mercado resolve. E sabemos também que este discurso encontrou o seu limite na crise do ano passado. Assim, de repente, não mais que de repente, na crise, o dinheiro para salvar as empresas apareceu. Bilhões para os bancos, indústrias e etc. Antes não havia dinheiro para a educação, para o sistema de saúde, para a paz. (É bom lembrarmos que o sistema de saúde americano está falido, porque a saúde privada não inclui quase 47 milhões de cidadãos americanos que não tem nenhum tipo de cobertura – ao contrário do Sistema Brasileiro que é universal)

A pergunta em relação a isso é: afinal, a crise da escola é crise de quem então?
Nos parece que é uma crise política – com todas as letras POLÍTICA – pois de fato o que temos hoje é um excelente sistema legal respaldando a educação, mas as leis não são cumpridas. Existem governantes que não cumprem as leis educacionais e nem os Planos educacionais decenais são respeitados por muitos governantes. Assim, segundo Redin, participamos dos debates para a construção dos Planos Nacionais, mas os planos nacionais não são cumpridos. Ele aponta diretamente para a situação aqui no estado inclusive com o assentimento da maioria dos colegas.

Redin também traz a tona o debate sobre a avaliação da educação. Todo mundo avalia a educação tem Enem, Provinha Brasil, Saers e etc. Ele afirma que tem um equívoco por traz disto porque estão avaliando profissionais e cidadãos que não tem as melhores condições de vida, estudo e trabalho. Ele considera – e devo concordar com isto – um crime avaliar crianças. Tudo se passa como se as crianças já tivessem que se submeter a uma avaliação que ao fim e ao cabo avalia um professor sem condições de trabalho. É um sistema cruel este. Não perguntam para os professores e professoras o que eles precisam para fazer uma educação melhor. No final a avaliação diz que os brasileiros vão mal em matemática e em linguagem. Esta pesquisa e avaliação só responde aos interesses de quem a encomenda. Assim temos hoje uma crise neurótica das avaliações. A escola vai mal e a culpa é dos alunos que não querem aprender e dos professores que não sabem ensinar. Temos dúvidas sobre isto porque não é ponderada aí as condições das escolas que sofrem as avaliações. Assim é feito todo um planejamento que não leva em conta os sujeitos dos processos. O planejamento precisa levar em conta o para quê? Precisamos problematizar mais isto nas nossas atividades para ver se os nossos objetivos não estão errados sem não estamos seguindo cegamente um objetivo que serve a uma outra causa que não a causa da educação pública.

Redin fala mais sobre planejamento, pois está concluindo um curso que está ministrando na EST (Escola Superior de Teologia – no Morro do Espelho de São Leopoldo) cujo título é Planejamento Estratégico, Movimentos Sociais e Redes. Um bom planejamento depende de para quê e para quem ele é feito. Daí ele cita o exemplo de um projeto feito no nordeste. Um projeto americano para melhorar a educação do nordeste – o Projeto Saci. Foi concebido de tal modo que tinha tudo previsto: fatiota, cartilhas e etc. No começo o problema era os nordestinos usarem terno, gravata e camisa de maga comprida. Foi feita uma adaptação, aceitaram depois de muita luta cortar as mangas das camisa e tirar o palito, a gravata ficou. Por fim foi indo a coisa de tal modo que no final não deu certo. A conclusão dos organizadores foi que: os nordestinos não tinham condições de aprender, eram incapazes, incompetentes. Rssss. Assim; não deu certo e a culpa é dos nordestinos, pois, afinal era um projeto americano cheio de técnica, consultores e etc. Pressupunham que os nordestinos bem treinados conseguiriam. Esqueceram de considerar qual é a vida dos nordestinos.

Não funciona estas coisas porque aqui o problema real também é político. As leis, as decisões políticas fazem parte de decisões trágicas. Pois, decidir é excluir outras prioridades. E comento, muitas vezes as outras prioridades é que são o principal.

Um exemplo disto é a COPA 2014 – bem agora vai sair uma pista de mais 1800 metros para o Aeroporto Salgado Filho. Mas isto vai desalojar cinco vilas populares que serão transferidas para a região do Porto Seco. Parece fácil, mas como é que eles vão levar a vida lá adiante. Como vão se adaptar lá? É um processo bárbaro este. Como se a copa fosse mais importante que a vida e as relações daquelas pessoas.

Vemos o exemplo da Constituição de 1988. Ela foi ardentemente disputada por nós educadores e foi uma luta árdua. Lá ficaram inscritas as bases para a criação dos diferentes estatutos de direitos, por exemplo, o direito a proteção da infância e da adolescência que ganho um estatuto com o ECA. Uma política pública depende fundamentalmente do fato de que para além do expediente legal haver uma continuidade. A garantia de continuidade é fundamental para toda a política pública ganhar concretude. A lei precisa ser operacionalizada. Ela precisa de recursos públicos e um plano de execução. E precisa ser cumprida por todos os entes federados senão...

Um exemplo importante é agora o CONAE 2010 em que somos convidados a discutir um novo plano para a educação nacional. Redin afirma que tem participado das discussões, mas se preocupa porque segundo ele de plano em plano vamos perdendo a esperança.

Daí ele enfoca aqui no Rio Grande do Sul, lembrando que os professores estaduais devem se orgulhar muito porque foram os primeiros professores a fazer greve lá em 1979. Pergunta quantos participaram disto e aí a nossa colega Maria Ivani lembra de ter recém ingressado na educação e ter feito aquela greve. Redin diz que a educação estadual é e era já a melhor do Brasil e que isto deixava muitos intrigados. Como é que estes professores que fazem greve conseguem isto? Ele afirma que é justamente por isto que a educação gaúcha é a melhor; porque os gaúchos lutam e levam a sério o seu processo histórico. Ele lembra do tratamento dado pelo governo Yeda aos educadores com a violência policial e várias outras coisas. E que é um grande desrespeito o que ocorre hoje em que temos uma governadora que faz o que faz e tem a peia de chamar os educadores de torturadores.

Ele diz claramente: precisamos de respeito! Temos que reconquistar isto! E que o caminho para isto é os educadores tratarem os alunos como seus companheiros. Isto tudo começou quando os educadores assumiram a sua condição de trabalhadores como todos os demais membros da sociedade. Foi algo fundamental que foi produzido através de muitas caminhadas, debates, protestos e greves. Assim ele afirma que temos que nos rearticular em torno do nosso trabalho.

É preciso quebrar também esta lógica competitiva que vem para a educação junto com o objetivo de produzir Ranking das Melhores Escolas. Como é feito no ensino superior como se houvessem parâmetros globais aplicáveis a todas as instituições e escolas. Assim vem à tona de novo o discurso das competências e o problema é que este discurso leva a culpabilização do indivíduo e não olha para o sistema.

Nós do RS que construímos através de uma longa caminhada a escola cidadã temos que retomar nossa caminhada.

Ele cita Paulo Freire: “Utopia é o inédito viável, o sonho possível”

E conclui com um poema sonoro de Oswaldo Montenegro que vou transcrever aqui:


METADE

Composição: Oswaldo Montenegro
Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio

Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso mas a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste, e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.

Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
A outra metade eu não sei.

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.


PS.: Redin tem um blog em que muitas destas idéias são apresentadas também: http://euclidesredin.blogspot.com/

Gostei muito da palestra de Redin e por isso a transcrevi aqui. É um alento saber que não estamos sós no modo como compreendemos as coisas da educação.

Prometi ao final dos debates ser breve e colocar em outro espaço minha opinião. Na próxima postagem colocarei aqui minha intervenção e um texto que estou construindo sobre um foco que creio ser fundamental CONHECIMENTO DO ALUNO COMO CONDIÇÃO PARA A SUPERAÇÃO DA VIOLÊNCIA, DA EVASÃO E DA DESVALORIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO. Aguardem..

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