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sábado, 14 de novembro de 2009

1989-2009: SOBRE OS 20 ANOS DA QUEDA DO MURO DE BERLIM - OS OUTROS MUROS E DESAFIOS

MEMÓRIA PESSOAL

Em 1989 eu tinha 24 anos apenas. Estava cursando meu primeiro ano de filosofia na UFRGS, após ter sido aprovado no vestibular e retomava, aos poucos, uma militância estudantil, que havia sido interrompida em 1986. Foi um ano extraordinário para a história, a política e, também, para a minha vida pessoal. Residia em Porto Alegre no bairro Bom Fim, na rua João Telles, e trabalhava na Cooperativa Ecológica Coolméia. Lembro que iniciei o ano num clima de grande expectativa e otimismo e, praticamente, o ano acabou com duas cenas inesquecíveis para mim.

Na primeira cena o preâmbulo é o seguinte: eu voltava para Porto Alegre ao final do dia do segundo turno, num ônibus pinga-pinga da Central, com mais cinco pessoas - fora o motorista e o cobrador - após ter trabalhado o dia inteiro na seção 140, onde voto, como mesário, com alta expectativa de uma vitória de Lula. Naquele dia - lembro bem - coloquei uma calça branca e uma camisa vermelha. Não precisava dizer mais nada.

Viajei no centralão escutando um rádio no fone de ouvido e acompanhando a apuração da eleição. Creio que eram umas 23:11 quando entendi que não tinha mais volta, havíamos perdido a eleição para o Caçador de Marajas da rede Globo e da elite brasileira. Ao chegar em Porto Alegre caminhei com minha mochila verde às costas, no trote, até o Bom Fim e eis a cena: entrei na Lancheria do Parque )ali na Oswaldo Aranha) e já na porta vi a cena mais desoladora que já vi em minha vida: todos os presentes com o olhar baixo, cabisbaixos, muitos chorando e nenhum sorriso nos rostos do garçom ( véio Gerson, Adilar e outros) e até o mais acanhado transeunte chapado tinha tristeza no caminhar e vagar. Era uma desolação total.

Neste dia eu entendi que a esperança que nós tinhamos era gigantesca e extraordinária. Havia feito campanha, mas só vi a medida da nossa empolgação, no dia da derrota definitiva. Até hoje quando entro na sede do PT de São Leopoldo e vejo aquele quadro do Luis Brasil de 1989 - que apoia LULA, que está lá na parede dando testemunho real daquela campanha, lembro de quão grandiosa e generosa foi a doação de todos para aquela campanha.

Também foi 1989, portanto, o ano da primeira eleição para presidente da república após a ditadura militar e, bem entendido, após a eleição de Jânio Quadros, o parlamentarismo com Tancredo e outros, a campanha da Legalidade liderada pelo Brizola, a posse de Jango, o plebiscito e o golpe militar que deu posse aos presidentes militares no Brasil por 20 anos e que embananou a democracia brasileira com Sarney, Roberto Marinho, Antonio Carlos Magalhães, Paulo Maluf e outras criaturas que ainda estão aí seja por seus herdeiros e sombras seja pelas circunstãncias.

Na segunda cena vi aquele Chinês dançando em frente aos tanques na Praça da Paz Celestial naquele protesto por liberdade na China. O que me chamou a atenção não foi a dança, mas o impeto e as respostas sucessivas de quem manobrava o tanque. Todos hoje sabem que a maioria daqueles jovens que protestaram lá foram mortos e que os líderes que, de alguma forma, sobrevivem passam sistematicamente por maus bocados. Toda vez que olho para a China lembro disto e do fato de que lá a Revolução - que não é nenhum pouco questionada no ocidente combina capitalismo com trabalho escravo e coletivismo. Para nós é inimaginável o que lá ocorre hoje. Nauqele momento eu também tinha uma esperança grandiosa. Imagine que eu supunha que haveria alguma forma de revolução mundial por acontecer. Era pura ilusão, nem a leição de Lula se deu e nem o sistema soviético e o sistema chinês sofreram as transformações fundamentais para um processo global. Tudo ao contrário, as coisas ficaram piores pra quem tinha esperança na revolução. E os conservadores surfaram com muita liberdade sobre a história.


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A minha lembrança mais importante da queda do muro de Berlim foi uma ironia desta história. O fato de que o Muro caiu justamente após a grande pressão das pessoas que já saiam dos países da cortina de ferro pelas fronteira com a Polônia e outros países e que na Alemanha o muro continuava ironicamente de pé.

A derrubada do muro, alguns chamam de queda outros chamam de abertura, se deveu simplesmente a uma intensa disposição das pessoas de atravessarem fronteiras, de ultrapassarem diferenças. Penso que esta é uma grande marca do final do século XX. O muro é derrubado em meio a isto. Quando você faz uma pesquisa para ver o que acontecia na literatura, na música e na política da época você descobre coisas interessantes que contrariam a tentativa de alguns analistas de dizer que as posições de esquerda sucumbiam com a queda do muro. Ao contrário, hoje percebo que apesar da esquerda mundial não ter uma grande ideologia pronta para dizer o que fazer, ela já aponta o que não fazer por antagonismo justamente ao receituário neoliberal.

Uma prova disto é que nestes vinte anos, de 1989 a 2009, só no continente latino americano e americano vivemos um processo de esquerdização dos governos nacionais e de ruptura em diversos parãmetros tradicionais de conflito. Foi em Seattle, em 1999, que o movimento anti-globalização e contra o capitalismo promoveu o primeiro grande ato de massa contra os poderosos do planeta. Este movimento desagua em diversos outros atos de luta pelo planeta e vem a dar a luz ao FÓRUM SOCIAL MUNDIAL. Eu gosto de colocar estas duas coisas juntas:

1. o FÓRUM SOCIAL MUNDIAL em Porto Alegre em 2001 - como palco de construção de alternativas e polarização ao neoliberalismo, ao mercado especulativo (vide TAXA TOBIN da ATTAC) e ao capitalismo que se concentravam e se reuniam em DAVOS na Suíça, através de associações liberais do mundo inteiro, grandes empresas, grandes governantes de direita e centro, e diversas atrações do Show Business;

2. a CONQUISTA DOS GOVERNOS NA AMÉRICA DO SUL PELA ESQUERDA, a partir de 1999, começando com Hugo Chaves, inclusive, e passando por LULA em 2002 no Brasil e chegando ao ponto de hoje haver apenas um governo de direita no continente, justamente na Bolivia onde Che Guevara morreu nos anos 60 em plena guerrilha pela libertação do colonialismo tardio e do imperialismo americano. A esquerda tomou conta da América.

Estes dois grandes movimentos tem hoje forte alento, pois a combinação entre eles é justamente o que faz força, em especial no caso brasileiro, frente a crise da economia mundial provocada justamente pelas consequências do excesso de liberdade ao capital financeiro, especulativo e corporativo global.

Na minha visão da época a queda ou derrubada do muro de Berlim libertava os socialistas do ônus de terem que justificar um regime e sistema econômico em que a democracia não tinha vez e em que as liberdades inexistiam. E penso que para o PT - e os trotskistas em especial que fundaram o PT - a queda do muro de Berlim foi um alívio no sentido de construir uma outra opção de socialismo. Justamente aquela que compreende que o socialismo não é possível em um só país.

Assim, na minha opinião já na época era o momento de se construir o Internacionalismo de caráter Socialista com mais força ainda. Mas, infelizmente o que se seguiu foi o contrário. O que se seguiu foi a radical e profunda implementação do programa neoliberal em todos os países para além da Inglaterra, EUA, Chile e poucos outros. O neoliberalismo teve forte impeto de generalização. Aliás chegou no Brasil com fernando Collor de Melo - justamente na eleição de 1989 e governo até o fim do governo de FHC. A receita tríplice: privatizações, redução dos direitos e livre-mercado ( livre-mercado significa mais do que sem fronteiras, para eles é sem regras também, sem restrições, sem fiscalização e sem qualquer forma de coerção ou regulação estatal ou pública e etc.) foi largamente implementada.

E neste período de 1989 até pelo menos 1999 quase todas as estruturas estatais sofreram revezes, enxugamentos, demissões e precarizações. É bom lembrar que justamente após o fim do Socialismo soviético as diversas máfias russas se constituiram e tomaram conta dos espaços e das coisas nos países do antigo bloco soviético. Não há polícia e exército que faça frente ao poder do capital. Este é hoje ainda um dos maiores desafios para as democracias orientais superar a forte influências das máfias sobre os estados nacionais e serviços públicos. Com o desmantelamento das estruturas, dos partidos e das organizações sociais tradicionais do leste europeu tudo tem que ser reconstruído e mais que isto inventado. E não tem sido fácil.

Outro debate é sobre o fim da guerra fria.

PS: continuamos depois.

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