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domingo, 22 de janeiro de 2017

AS PALAVRAS - SARTRE - RECOMENDO - em especial para quem gosta de autobiografia

SARTRE, Jean Paul. As Palavras. Tradução de Jacó Guinzburg. 3ª Edição. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1967, 159p.

“Naturalmente, não sou trouxa; bem vejo que nós nos repetimos...” (p.151)

“O que eu amo em minha loucura, é que ela me protegeu, desde o primeiro dia, contra as seduções da “elite”: nunca me julguei feliz proprietário de um “talento”: minha única preocupação era salvar-me – nada nas mãos, nada nos bolsos – pelo trabalho e pela fé. Desta feita, minha pura opção não me elevava acima de ninguém; sem equipamento, sem instrumental, lancei-me por inteiro a ação para salvar-me por inteiro. Se guardo a impossível salvação na loja dos acessórios, o que resta? Todo um homem, feito de todos os homens, que os vale todos e a quem vale não importa quem.” (p.159)

Este livro é simplesmente a primeira biografia de filósofo que eu li na vida. Eu adquiri ela por tostões com a minha consciência de certa incapacidade econômica de adquirir, pelo valor que tinha na banca, a biografia de Sartre recém lançada em 1987 de Annie Cohen Solal pela editora L&PM, e eu namorei esta biografia muito tempo na feira do livro. Nos últimos anos fui ler e bem me vi nas peripécias e na coragem que agora nesta hora da minha caminhada tenho muita vontade de cometer. ...e creio que fará muito mais sentido viver com uma consciência plena e assumida do que fazer papel de desorientado como alguns que nunca estiveram nem perdidos e nem muito menos desamparados. Estes dias li um texto de uma raposa que atacou mais de cinquenta galinheiros fazendo Cocoricó. Me senti tocado pela lamentação moral tardia de alguém que nunca considerei levada de Roldão por coisa, causa ou pessoa alguma. Como também vi um pusilânime a falar de certas fidelidades que ele não entendia simplesmente porque ele nunca foi leal à outra coisa do que sua própria vantagem ou vaidade pessoal. E lembrando também da questão da virtude ou dá honra como ficamos discutindo ontem que mesmo entre rivais, adversários ou até inimigos nos leva até o final da peleia e dá vida com firmeza, lado e muita perseverança mesmo sob o pior quadro.

Mas há algo de maravilhoso para mim nesta pequena autobiografia de Sartre porque ela substituiu com ganhos para mim a biografia de Annie. Nela ele conta com ironia e muitos detalhes a sua formação e influências familiares, culturais e políticas e também de suas resistências que de forma muito reveladora se constituíram de tal modo que desde a sua infância, ele tenta ensejar seu próprio caminho apesar de...por exemplo, ser sobrinho de um piedoso Albert Schweitzer e resistir a fortíssima influencia da igreja em sua família. E ela me serviu muito no sentido de construir também em mim certa autoconsciência e um processo de diferenciação semelhante. Nada disto é feito por vaidade, mas sim por um sentido de responsabilidade sobre s própria vida, destino e projeto.

Esta passagem, por sua vez, representa algo muito importante para mim em minha formação e em minha trajetória porque apresenta a necessidade permanente de tentarmos resistir à certos papéis que alguns conselheiros ajuizados tentam nos atribuir e que são melhores para o que os outros querem de nós, do que, para o que, cada um de nós, pode ser por decisão própria e escolha refletida, ainda que sem o consentimento ou aprovação de outrem.

O texto da contracapa, enfim, desta tradução de As Palavras é este:

“Jean Paul Sartre inicia uma nova tarefa comunicar o sentido que, para ele, tem a sua vida. AS PALAVRAS abrange o período da infância. Não se deve esperar desse pequeno livro o relato saudosista de um velho senhor que rememora episódios encantadores do mundo da criança, ou rostos amados e desaparecidos. Nada disso. Aqui o leitor encontrará um requisitório contra o mundo da criança e, honesto, não poderá deixar de examinar, por conta própria, o que foi a sua infância.”


E assim de muito me serviu esta leitura preambular à minha formação acadêmica em filosofia.

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