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quinta-feira, 30 de julho de 2015

MINHA MEMÓRIA


Desde muito tempo entendo que a memória se constitui de experiências e conteúdos cuja significação e afetividade andam entrelaçadas. A ciência ou, melhor, as neurociências tem confirmado isso: que um conteúdo fica impresso na memória por uma espécie de cola afetiva. Mas também tem apontado que a memória tem um sistema de partições e gerenciamento que deixa disponível apenas o que está em uso, o resto vira remoto.


Tenho muitas lembranças e suponho que quem as tem também deva ficar se perguntando, não somente sendo perguntado pelo outros ou distinguido - como é que consegue armazenar tanta informação. Bem, eu descobri que uma forma de aliviar os arquivos da memória é escrever e registrar, desde então tenho feito e adotado uma postura de memorialista, e isso envolve diversas formas de narrativas desde uma reflexão sobre determinado conhecimento, experiência e até mesmo sobre como e em que momento e de que forma tal ideia, conceito, obra ou temática me chegou. Minha experiência de vida tendeu – após certa distensão e abertura de um fluxo indomável de escrituras - a ser transformada em palavras com muita facilidade. Durante um tempo, em que me colocava a tentar explicar a causa disso, imaginava que possuía uma memória prodigiosa, me ironizava referindo a mim mesmo como o Enciclopédia, cheguei até mesmo a absorver a metáfora da esponja – no caso não o Bob Esponja – mas sim que eu era uma esponja muito poderosa que absorvia e armazenava tudo que lhe passasse pelos olhos. Na astrologia haveria até uma boa explicação por ter nascido com a Lua em Peixes e portanto apreender com excessiva sensibilidade tudo que haveria no meio em que eu vivia. Imagina minha aflição quando alguns anos atrás passei a ouvir, ler e presenciar certos expedientes de negação da memória, da história, do conhecimento que sub-repticiamente passaram a ser esgrimidos como crítica ao modo como nossa educação era realizada. Para mi foi difícil pois parecia estar sendo condenada justamente a minha melhor habilidade e que era a base, hoje sei isso, da minha expressividade e grande interlocução com o mundo, as pessoas os seres  e as coisas.  A crítica à decoreba na educação sempre me caiu como uma bomba, porque eu sabia que se tinha algo que eu possuía como fonte do meu pequeno, mas para mim precioso capital cultural, era um conjunto muito vasto de informações úteis e inúteis , pertinentes e impertinentes, acumuladas ao longo da infância, juventude e anos acadêmicos. Isso passava por processos desde a capacidade de decorar a estrutura inteira do que eu lia, até mesmo decorar roteiros de filmes e textos de poemas que eu gostava. Confesso, porém, que poucas pessoas que me conhecem viram eu me exibindo por conta disto, na verdade nunca dava muito tempo para isso, porque minha memória em geral é mais usada, aplicada e não apreciada, pois em geral o máximo que eu fazia era trazer uma informação pontual ou elucidar um quesito de palavra cruzada aqui e ali, sem muita cerimônia ou sem fazer muito mistério glorioso nisto. Claro que isso – esta habilidade de associação, busca de informação, registros e informações disponíveis em certa abundância também envolve certa tendência a completar as frases ou assoprar palavras para alguém que esteja proferindo um discurso ou comentário e que, no mais das vezes estanca e  entrementes se vê ali a falta daquela palavra específica, cuja lembrança, dicção ou mera fonética parece ter sido esquecida que meu impulso socorre.  Em certos momentos comecei, após aventuras e certos prodígios de memória, a observar que o gosto, um sentido afetivo e de prazer, eram a base de fixação da memória. O gosto pela informação e por curiosidades, o prazer no uso da palavra e também a apreciação por etimologias, verbetes, listas e etc, e o afeto associado a certas palavras, conceitos, experiências e suas relações e evocações sentimentais acabavam fixando estas expressões e que, inclusive, em virtude disto analogias, metáforas, ironias, tiradas e determinadas imagens começaram a abundar e estar disponíveis para o meu uso. Devido ao acervo disponível e a uma espécie de jogo com as palavras acabei criando mais tiradas, notas, metáforas e analogias que são já habituais em mim. Tendo a ser mais parcimonioso e a não proferir tudo que penso, nesta matéria, para não ser ou parecer pedante e chato ou excessivamente gracioso com assuntos sérios ou de difícil solução. 

Em virtude disto também virei um acervo ambulante de personagens de desenhos animados, colecionador de apelidos e de expressões regionais, técnicas, eruditas e etc. para distrair e não cair na tentação de me levar a sério em demasia. E como agora já comecei a brincar, vou parando mesmo por aqui, no meu relato pessoal de hoje sobre como vejo a minha memória. 

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