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terça-feira, 30 de dezembro de 2014

CARNAVAL DO ARLEQUIM - PANORÂMICA INTRODUTÓRIA EMBEVECIDA DE 1924

- Quando este surto de sabedoria opinativa, rebarbativa e contemplativa passar, e Paulo Santana é só a pontinha solta de um gigantesco Iceberg de insensatez e tolice quase generalizada que assistimos, e tenho a suave impressão que – apesar de tudo - isso e o que vem vindo junto disso, também vai passar, e, ENTÃO, quando isso ocorrer, talvez eu fale com mais gosto e com mais reflexão de política e comunicação social. Por enquanto, me dedico a terminar uma panorâmica propositada e indutiva sobre o ano de 1924 que só me faz ficar embevecido no que vai sair mais disto dai:

CARNAVAL DO ARLEQUIN – JOAN MIRÓ
& AS FROTEIRAS DA REPRESENTAÇÃO

Para talvez compreender melhor um acontecimento, parece desejável ver melhor a situação em que este algo se encontram. E não se trata somente de contextualizar mecanicamente por uma lista de fatores alheios ou próximos, nem de vasculhar mecanicamente um panorama, mas sim de compreender uma dinâmica, uma certa topologia que por traz de suas aparências difusas dialoga aqui e ali com algo que pode ganhar alguma inteligibilidade, ser interpretado em suas partes e quem sabe receber uma síntese qualquer que satisfaça nosso desejo de gosto e inteligibilidade. No ano de 1924, já vivíamos este tempo agitado que conhecemos hoje, muitas coisas aconteciam ao mesmo tempo, elas se entrecruzavam na história dos homens, das idéias e das coisas, mas isso não me levará a dizer que havia uma sincronicidade, nem alguma conspiração superior ou inferior contra este mundo. Não é da ordem do destino ou do determinismo que estas coisas aconteciam. Elas nos mostram muitas direções e situações que eram decisivas, transitórias ou apenas iniciais na ordem das coisas e de uma causalidade qualquer de fatos. Nós tendemos a ver elas como determinantes, mas sempre é bom lembrar ao homem finito que por menor que ele seja elas podem ser ainda diferentes, ele ainda tem suas escolhas a fazer. Coisas que podem representar algo importante aqui e ali. Eu mesmo dou extremo valor e julgo relevante muitas coisas daquele tempo, as quais de certa forma fizeram em um dia ou outro parte de minha vida até o tempo atual e de meus estudos e investigações, curiosidades e reflexões.

1924 é, porém, aos olhos de outros leitores um ano que poderia não ter nada de incomum, mas que é somente um ano bissexto, um ano com 366 dias que, portanto, com um dia a mais que os outros, mas é mais pois, visto desta distância e com os recursos atuais e minhas associações livres aqui, sabemos que muitas coisas aconteceram naquele contexto e naquela época. E isso pode ser desfiado como que em cadeia e com uma vista da distância que possuímos hoje e com a possibilidade que temos hoje bem fácil de traçar ou fazer uma panorâmica, cujo valor literário até 1990 seria razoável.

E é mais ou menos assim: enquanto o Império Otomano de mais de 1400 anos sucumbia, sendo deposto o Califa, enquanto George Mallory e Andrew Irvine desaparecem tentando atingir o topo do Monte Everest, enquanto Lenin (falecido em 21 de janeiro) era embalsamado e posto em um Mausoleu em Plena Praça Vermelha e com isto Petrogrado é renomeada de Leningrado  – e o pai de uma utopia que se tornava real é substituído por seu seguidor mais sanguinário e impiedoso, sendo um pesadelo para alguns e a máxima realização política para outros, enquanto Hitler era solto de sua prisão por ser considerado relativamente inofensivo, enquanto Mussolini e seus Camisas Pardas venciam com diversas manobras e recursos estatais as eleições italianas consolidando uma maioria facista de 2/3 no parlamento italiano, enquanto nos EUA, o jovem ambicioso e inescrupuloso J. Edgar Hoover era apontado como cabeça para dirigir o FBI, enquanto Franz Kafka falecia solitariamente após pedir a Bröd  que queimasse seus rascunhos e textos, enquanto Virginia Wolf volta a morar em Londres com seu marido e saiu de uma espécie de exílio auto-infringido e cuidadosamente anotava em sua caderneta as idéias que a levariam a escrever Mrs. Dalloway, enquanto Ernst Hemingway bordejava por toda Paris e Europa a procura de suas letras, enquanto Wittgenstein após passar uma temporada isolado dedicava-se a lecionar em uma escola primária de Puchberg – não sem conflitos com os pais dos alunos e os seus alunos, passa a pensar seriamente a cair fora dali e segue para lecionar em outra cidade um pouco antes de aproximar-se do Círculo de Viena por intermédio de contattos com Moritz Schlick, enquanto isso Heidegger, após perder seu pai no ano anterior, lecionava atraindo muitos alunos em Heildelberg com suas lições sobre Aristóteles como preparatórias para leitura de Platão, gerando nestas lições a bem conhecida já hoje paixão da jovem Hannah Arendt por ele e impressionando Hans Georg Gadamer, neste tempo, enquanto Edwin Hubble descobria a partir de uma observação mais acurada de algumas imagens que eram então chamadas de nebulosas, e que de fato para sua surpresa que a Via Láctea era somente mais uma constelação ou melhor, somente uma entre muitas galáxias do universo, enquanto Freud dedicava-se – não sem um misto de incredulidade e ceticismo – a escrever um pequeno artigo de cinco páginas sobre a Negação – que hoje é visto como essencial e fundamental por muitos estudiosos e escolas de psicanálise e, ao mesmo tempo, prepara sua ruptura com Otto Rank por este considerar que o trauma do nascimento é mais importante do que o conflito edípico, enquanto a  Rhapsody in Blue, de George Gershwin, tem sua primeira apresentação em New York City, enquanto o Capitão de Engenharia Luis Carlos Prestes em outubro liderava um levante de tenentes em Santo Angelo que levou à Coluna Prestes a andar por mais dois anos no Brasil até fevereiro de 1927, enquanto aqui em São Leopoldo ao inicio do ano – o ex-secretário de Borges de Medeiros, Prefeito e interventor indicado pelo Presidente do PRR e eleito Mansueto Bernardi tomava a difícil decisão pessoal e política de abandonar a Prefeitura Municipal, voltar ao serviço público estadual e dedicar-se mais ainda à Editora do Globo e mais às letras do que à política.

Fico imaginando indutiva e insensatamente que, então, logo após a publicação do Manifesto do Surrealismo por André Breton, e a divulgação dos primeiros números de La Révolution Surrealiste, em que o mesmo defende o surrealismo como um “puro automatismo psíquico”, e, então, só para contrariar o ditado, com pitadas claras de dadaísmo e cubismo e passando fome cujos delírios não eram de um sonho e que provavelmente Joan Miró avançava o sinal a partir de seus esboços para pintar um quadro que virá a ser conhecido como Carnaval do Arlequim e que expomos aqui – que na minha modesta e nada especializada opinião talvez seja a obra inaugural de sua longa e bela trajetória de produção, inovação e criação de uma estética própria e original que seguirá até sua morte em 1983.   


   
“A natureza generosa deu ao artista a capacidade de exprimir seus impulsos mais secretos, desconhecidos até por ele próprio, por meio dos trabalhos que cria; e estas obras impressionam enormemente outras pessoas estranhas ao artista e que desconhecem, elas também, a origem da emoção que sentem.”


SIGMUND FREUD - O sonho de infância de Leonardo da Vinci, 1910.

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