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terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

A DUPLA SARTRE E SIMONE DE BEUAVOIR: ISSO NÃO É AMOR?

(Boa tarde - - - terminei a revisão e reescritura de um texto sobre SARTRE  & SIMONE- ISSO NÃO È AMOR?..e gostaria que alguns amigos - por afinidade temática, dessem uma olhadinha, então vou citá-los aqui - - - se quiserem excluir da TIMELINE DE VCS fiquem á vontade: Giane Portal , Alexey Dodsworth Magnavita,  Renato Janine Ribeiro , Suzana Guerra Albornozi é para vcs...)


O comentário fino e arguto do professor Renato Janine Ribeiro sobre a mais nova polêmica em torno do casal Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir, despertada pelo lançamento em português da biografia “Um Relação Perigosa” sobre os dois, de Carole Seymour Jones, me leva a desaguar uma pitadinha só de algo que estou ruminando a alguns tempos sobre amor, relacionamento intelectual, fidelidade e confiança, culpa e liberdade..

Este é um dos temas no qual ando circulando e arrodeando desde o ano passado. Tinha planos de publicar um ensaio específico sobre Sartre e Simone, junto com o outro sobre o par Heidegger e  Arendt aqui, mas não saiu. Meus planos sobre isso se frustraram e também em  muitas outras coisas a partir da Páscoa do ano passado. O mundo não acabou por isso e nem deixei de pensar ao longo do ano sobre isso, com algumas leituras aqui e ali. Além disso, alguns filmes tem abordado este tema aberto durante todo o século XX. Constatei rapidamente ao dar mais atenção para este tema que “quase tudo” que é possível pensar, viver e tratar sobre relacionamentos já foi praticamente encenado também em diversas outras linguagens e teatro, seja na forma de comédia ou tragédia, drama ou novela mas não fiz isso que eu queria fazer. Na literatura, na poesia, na música e também na pintura e fotografia temos um acervo gigantesco que tende a ser aumentado porque este tipo de conteúdo parece ter certa perenidade, mudando apenas a forma e a concepção moral ou cognitiva ao longo do tempo.

Acabei publicando um esboço sobre Heidegger e Arendt, cheio das minhas velhas imperfeições de abordagem e revisão, mas publiquei para um dia retomar melhor isso, em melhores condições.

Mas no caso destes dois pares, me salta aos olhos a necessidade que muitos analistas, versionistas e biógrafos, tem de buscar uma condenação moral seja de um seja de outro. E o caso da obra de Carole já nas resenhas, no excerto publicado pelo Estadão e nos releases é gritante. Isso já começa no título do livro que faz paralelo com Ligações Perigosas de Cloderlos de Laclos e prossegue na narrativa construída a partir de testemunhos das “vítimas”.

Para mim se instalou uma profunda resistência e aversão a este tipo de “curiosidade” que me parece satisfazer somente como desvio e tentativa de impugnação das idéias destes intelectuais. Assim, tendo a não aceitar ou julgar o lado podre das relações. No fundo parto de  uma posição que não aceita nem isso e nem aquilo sobre os dois casais.

Sartre, para começar, era tão machista  e tão vil como a autora do texto, que gerou esta discussão, aponta? Para mim não! Eu fico imaginando que ele foi praticamente o único homem do século XX que efetivamente tolerou uma relação aberta, com os dramas todos que isso pode gerar. Mas não abriu mão um milímetro do seus desejos, assim como não impôs a usa companheira necessária de travessia isso também.

Mas é claro que esta sociedade conservadora e repressiva tem que encontrar um traidor neste homem e é claro que um feminismo decadente como o que se vê muito hoje por ai também precisa condenar ele e elogiar ela. Eu sou um homem e entendo perfeitamente a maravilhosa Simone em sua profunda admiração intelectual e afetiva, com os aspectos críticos e não tão elogiáveis de Sartre e dela mesma. É preciso ver que, sobretudo, ela tinha alta estima por Sartre e muita confiança e que provavelmente a questão fundamental entre os dois não foi corporal ou física.

E devo dizer - porque é assim que percebo todos os sinais dos dois, mesmo aqueles distorcidos, por interpretações bem tendenciosas, que o amor ou estima dos dois não tinha nada de simulação e tinha os mesmos altos e baixos que toda relação real e duradoura possui, seja ela aberta, seja ela encerrada  numa fidelidade verdadeira ou num castelo de mentiras cujas cartas tem todas valor trocado...

Algumas relações inclusive migram para uma zona intermediária entre a paixão e  o amor e são mais cultivadas como amizade e companheirismo hoje em dia.

Sobre os jogos de gato e rato entre Sartre e as outras mulheres e as ardentes paixões de Simone por dois homens e uma outra mulher, eu penso que seria difícil não encontrar o mesmo enredo em diversas outras pessoas da contemporaneidade. E não é por perversão que isso acontece, como uma mente repressiva ou reprimida poderia pensar. Isso acontece simplesmente, porque a pessoa não tem esta tão almejada fixação sentimental que faz com que somente uma pessoa seja objeto de seu desejo, que faz com que o afeto seja cativo e tenha certificado de propriedade.  Já a sociedade não aceita com tranqüilidade ou como uma normalidade tais idas e vindas e isso é introjetado na mente das pessoas, seja como uma culpa dolorosa ou vergonhosa, seja como um segredo precioso e delicioso. É numa sociedade como a nossa que estas coisas acontecem.

Assim, provavelmente a “reinvenção do casal” de Sartre e Simone, foi uma atitude não somente experimental e conveniente para eles, mas pioneira e de vanguarda para alguns de nós que precisam dar outra solução para seus afetos, desejos e etc.

O Renato aponta que eles falam de "amores necessários e amores contingentes". E é meio que bem assim que muitos hoje se comportam não somente entre os solteiros. E o que determina o status de necessário ou contingente deve ser um afeto que se desenvolve ou s e desenrola. Assim, pode mudar também o status de necessário para contingente e vice versa. Mas o que há de errado nisso afinal? Que pecado é este meus amigos e amigas?

Isso tudo leva para a pergunta de fundo nestas relações de amizade, namoro, casamento e nestes tipos de relações: porque você fica com esta pessoa?

Todos gostariam de dizer que é por amor, mas, pelo que tenho refletido, às vezes isto é apenas um ingrediente entre vários outros. E em outros momentos se fica só por desejo mesmo. Mas para quem estas opções dizem respeito para além dos dois?

Poderia fazer a analogia crítica de que cada um  é responsável pelo que cativa, mas nem sempre, porque na maior parte das vezes a relação só evolui se você não é responsável pelo outro, mas apenas que os dois colaboram e realizam alguma forma da ajuda mútua.

Às vezes parece haver uma tentativa de impugnação da possibilidade de uma eterna busca de afinidades eletivas, ou de uma eterna busca da melhor afinidade eletiva. Porque?
 
Penso que Sartre conseguiu ser “a pessoa mais importante do mundo para” Simone, mas que este título ou status foi posto à prova várias vezes. Em especial com os casos de Simone com Nelson Algren e Claude Lanzmann.

A acusação de "manipulação" me parece que pode ser feita à muitos outros. E isso não torna Sartre inocente, mas também não o torna culpado, salvo que todos recebessem algum tipo de atestado ou certificação de ausência de manipulação em seus afetos o que não ocorre, por mais sincero, honesto e verdadeiro que se seja. Aliás, o afeto parece ser tão dissociado disso e de outras coisas, ainda que componha com elas e que seja às vezes difícil de discriminá-lo. Mas aqui eu fico sempre pensando na dialética do senhor e do escravo. E em muitos casos não consigo visualizar quem é o senhor e quem é o escravo nestes affairs. Vendo, inclusive, que estes papéis podem ser trocados ao longo do tempo e em relação a outras coisas.

Aqui abro uma outra dúvida sobre estas coisas. Tenho desconfiado e muito que a combinação entre duas pessoas tem certa singularidade que independe do perfil da pessoa com outros. Isso pode parecer – e de certa forma é – uma abordagem relativista da questão, mas é exatamente o que tenho percebido. Que algumas combinações de pessoas são variáveis de uns para outros e que como na química ocorre que certas combinações de elementos que isoladamente são inofensivos são muito perigosas ou mais intensas o que com outros elementos. E assim ocorre certa variância e alteração contingente no perfil das pessoas na dependência de frente a quem, como e quando, tais relações se dão. Assim como me dou conta recorrentemente que cada um de nós está num tempo próprio e que os encontros, os afetos e também as trocas dependem também desta relação pré-experiência, na experiência ou pós-experiência. Esta variância coloca uma dimensão muito singular para mim sobre este tema específico. Assim a alegada manipulação pode ter só uma dimensão aparente, como pode ser simulada mais facilmente ou mais oportunizada pelo perfil, pelas carências e pelo tempo de cada um.

Eu vejo neste tema uma espécie de atribuição excessiva sobre Sartre de uma performance de um intelectual onipotente e superior aos demais seres humanos. Mas daí a pergunta deveria estar focada no que mesmo que ele fazia, dizia ou tinha que seduzia as mocinhas e não mais no seu caráter. E como ele recebia a colaboração de Simone. Eu acabo tendo dúvidas sobre qual é mesmo o lugar do Pathos nestes circuitos de relações que os dois desenvolveram. Mas lembro de um filme em que justamente se imagina que ter uma relação com este ou aquele pode ser atraente, confortável ou lhe dar prestígio. E não sei da conta, mas parece que havia mais de uma personalidade que ostentava nas horas boas o rótulo “da amante de” ou “do amante de” e nas horas más a peia de sofredor, manipulado ou capturado pela armadilha desta dupla de aranhas perversas. Isso é de doer de engraçado sinceramente, não somente pela metáfora, mas pela possibilidade de alguém se sujeitar a isto e o tipo de satisfação que obtinha combinada como desprazer que vem junto e é inerente na natureza desta aposta relacional. 

Eu escrevi tudo isso agora após revisar meu impulso matinal na questão.

E tendo a fazer um par nesta longa reflexão com Heidegger e Arendt, que sofrem a mesma vigilância moral e mesquinha, o mesmo patrulhamento. Creio que temos que compreender estes existencialistas no seu direito de escolha e no fato de que todos eles arcaram completamente com suas escolhas, bem ao contrário de outros antes e depois deles que ficaram dando curvas e culpabilizando o outro ou os outros.
E isso para mim - com o ônus e o bônus em um ou outro - é libertário, é saudável e me gera mais compreensão do que confusão.

E eu não vou, como deve ter ficado claro acima, tratar as "outras" ou os "outros" nisso tudo como vítimas e coitadinhos como ocorre geralmente nestas narrativas sobre estes dois pares. E te digo que a relação entre Sartre e Simone, me parece tão verdadeira que boa parte da verdade dela se encontra na esfera da intimidade de ambos, por mais que tentemos interpretar, deduzir ou revelar a partir de cartas, biografias e testemunhos deles e de outros. E ao estar na esfera da intimidade se torna indevassável.

A verdade nunca sai inteira em um depoimento ou em um texto, e aqui também entendo o que Platão queria dizer com a vantagem arriscada da oralidade em relação ao texto. Tem muito mais coisas para se discutir nesta relação destes dois como diz a professora Suzana Albornoz Stein.

O problema mesmo é que alguns querem lançar interpretações absolutas e serem os portadores de uma verdade que escapava até mesmo a eles. Sim estou dizendo que o mundo de Sartre, Simone, Arendt e Heidegger não era mesmo absolutamente interpretado e refletido e esta é uma ilusão de quem olha para a vida de um filósofo buscando uma coerência integral entre idéias e ações, fatos e versões, emoções e razões.

Isso pode servir para muitas coisas sim. Para vender livros? Para ser a mais nova revelação de veleidades e banalidades, segredos e intimidades dos outros? Eu acho isso muita pretensão e uma tremenda falta de respeito com a vida que o outro conseguiu realizar, pensando e trabalhando, com dilemas e problemas que ele encarou. Falar depois é fácil...

Agradeço, de novo, ao Professor Renato porque com esta finesse e delicadeza no tratamento de todos os debates ele faz um belo ponto médio que permite com que as diferenças importantes sejam vistas e compreendidas. E isso também permite que se saia do maniqueísmo monotemático e irrefletido, tão freqüente nisto tudo aqui. Como se a responsabilidade ou culpabilidade fosse resultado de uma análise, opinião, vivencia ou experiência.  O facebook também não é o tribunal de condenação e nenhum de nós é juiz do outro, ainda que alguns tentem sistematicamente cumprir este papel em sociedade, nas comunidades científicas e neste mundo. E isso é feito com muita freqüência contra aqueles que não tem mais nenhuma possibilidade de se defenderem ou argüirem ao contrário. A fantasia de onipotência e infalibilidade gera este tipo de monstruosidade e perpetra o pior fruto do racionalismo para mim: esta vã idéia de ter um ponto absoluto sobre este ou aquele episódio.

Entendi, enfim, que a cobrança é com eles...e o fundamental - de um ponto de vista moral ai - fica guardado para a situação de consentimento ou não no jogo de sedução - o desejo é um dos principais expediente para provocar uma traição da moralidade...Porque seria assim?

Talvez o desejo seja uma espécie de grau zero da moralidade - para usar uma figura – quer dizer para desejar o outro fisicamente é preciso certa liberdade que a moralidade não deveria permitir, e isto me aprece algo no que devemos pensar aqui - e vale na reciprocidade.

Por fim, tentei explicitar aqui que eu tendo a ver isso tudo de uma forma diferente, mas confesso que ainda estou elaborando muito sobre isso e não há nada de muito maduro que possa ser exposto sem ser completamente incompreendido ainda...


Mas penso que ousei me arriscar um pouco aqui...

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