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quarta-feira, 17 de julho de 2013

SOBRE A FALA DO MINISTRO DAS SAÚDE AOS MÉDICOS QUE QUEREM VENCIMENTOS DE JUÍZES E MUITO MAIS

Desculpe Nilson, vou ampliar aqui minha resposta a você, mas creio que você embaralha mais as cartas do que ordena os naipes ao falar assim deste tema. Sobre o salário dos médicos e o tema da dedicação exclusiva dos médicos em relação aos juízes eu tendo a concordar com o Ministro da Saúde Padilha nos seus argumentos sobre a necessidade de se estabelecer uma carreira pública efetiva e com cumprimento de horário e mais compromissos do que como é agora. Reconheço que é uma abordagem dura, mas é na medida exata do que acontece como desvio e habito aceito hoje nestas áreas da saúde que vão desde a gestão até o atendimento. 

Tenho juntado e elaborado diversas anotações diferentes do que significa a atual situação na saúde pública que é talvez a mais grave em todo o serviço público no Brasil. Investigar as suas causas históricas, como ela está assim, como evoluiu de uma situação estabilizada no inicio dos anos 80 para a barbárie em que se encontra hoje. E - em que pese a existência de vários profissionais éticos e qualificados na área da saúde - do danoso resultado do excesso de poder desta corporação par ao sistema público de saúde. Porque o poder desta corporação tem privilegiado uma lógica do lucro do individualismo materialista e os resultados estão ai, com fortes símbolos de uma naturalização e de uma normalidade ao se ver as óticas expressas nas manifestações contrárias às mudanças.

Tal excesso de poder tem funcionado muito em via única ou mão única o que significa, em poucas palavras, poder para determinar as condições e exigir determinadas condições, mas que não tem tido o correspondente aumento de responsabilidade efetiva.

Te dou dois exemplos. Primeiro, basta você investigar o que acontece com as secretarias municipais de saúde, secretarias estaduais de saúde e também no ministério: há um predomínio de médicos na gestão e isto é gritante e o argumento corrente ou subliminar para isto é que os médicos sabem mais do que deve ser feito na saúde do que os outros profissionais. Eu discordo disto – e não discordo porque julgo que os médicos não saibam – eles sabem e muito bem a partir da perspectiva deles – o problema é que isto não torna eles exímios gestores em saúde, e vale aqui o paralelo, do mesmo modo os professores não se tornam exímios gestores em educação simpliciter; sei que o contra-argumento que eles levantam em seguida é de que faltam verbas para a saúde, mas isto é em parte verdade e em parte um engodo.

Em parte é verdade porque se o teu município começar a atender de forma PLENA, da atenção básica até a alta complexidade vai faltar dinheiro sim. Mas toda vez que você abrir o orçamento da saúde vais te surpreender com o que está ali. Não vou falar nos salários, nem nos prestadores de serviços, vais te surpreender com os custos e também se individualizares os pacientes e discriminares melhor os processos vais te dar conta da quantidade de retrabalho e do grande desperdício provocado por um sistema desorganizado e que muitas vezes é desfocado da sua atividade fim. Bem, mas ai você vai se dar conta de que a atividade fim da saúde não é a cirurgia, não é o tratamento, mas sim o controle e a prevenção de doenças. Você vai estudar um pouco e vai descobrir que boa parte dos agravos são sinais não de um agravamento mas sim de ausência de prevenção e de um política de saúde preventiva. Quando o Adib Jatene diz que falta um médico que atende pessoas ele não está somente falando de holismo ou humanização da saúde, ele esta também falando de um médico que conheça as pessoas antes delas ficarem doentes, ele está pensando em saúde preventiva e de educação em saúde. Não está dizendo que não precisamos de especialistas, mas está apontando que o foco excessivo nos especialistas esqueceu do básico. E este foco foi priorizado por uma questão econômica e não por uma questão de compreensão da realidade da saúde no Brasil. Neste caso estamos criando pessoas em bolhas que um dia vão tratar de pessoas que nunca tiveram bolhas quando estas pessoas sem bolhas estarão gravemente doentes e então aparecem os especialistas. Neste sentido a proposta do programa MAIS MÉDICOS é corretíssima.         

Existem ademais outros problemas de gestão que são provocados também por um regime tácito e implícito de compartilhamento entre o sistema público e os esquemas privados de saúde. E quando a gente falar de saúde no Brasil precisamos tratar disto sim. Não dá para o grosso dos custos em saúde pública serem uma espécie de cobertor de proteção para o grosso da lucratividade dos esquemas privados. Chamo de esquemas privados diversos tipos de situação em que ocorre sombreamento de ocupação dos profissionais que tem vínculos públicos, privados e outros, transferência de custos, cobrança dupla, regime de custeio em que sempre o ônus é do público e do cidadão. 

E ainda tem toda a gigantesca pauta da formação em saúde que envolve também aspectos sociais e econômicos. De qualquer modo, assim como está não dá para ficar mais...

Um outro exemplo é o debate sobre os dois anos de serviço público. Não sou contra serviço público para todos os egressos das universidades públicas e creio que muitos precisam mesmo de um choque de realidade. Saindo desta bolha de proteção e da incubadora em que são colocados por interesse e segregação talvez seja possível mudar a forma como tem compreendido o mundo e a sociedade com esta perspectiva classista e também elitista. Eu fico muito impressionado com o mundo próprio em que os acadêmicos de medicina, por exemplo, da UFRGS, vivem desde minha época de estudante e ainda hoje. E não falo assim por mesquinharia ou desconhecimento da realidade. Temos que pensar neste tema de forma mais ampla. O rapaz ou a moça estudam o ensino médio numa escola privada, despendem recursos em cursinho, passam no vestibular, ingressam na universidade pública, se formam e vão trabalhar nas clínicas particulares ou vão para o mercado de trabalho com uma exigência de salário inicial superior a todos os outros profissionais? Assim, sem nenhuma discussão pública sobre isto? Tem uma hora que o povo vai ter que ganhar alguma coisa com isto e o argumento contra isto que eles apõem é que sempre foi assim. Chegou a hora de mudar então.

Sobre os salários e os vencimentos e o padrão de dedicação este é para mim o debate mais importante de todos. Porque é nisto que vai se decidir se vamos ter efetivamente saúde pública no Brasil ou não. Até então o investimentos massivos em saúde são públicos e os lucros com saúde são sempre privatizados e nunca coletivizados.

Você deve lembrar quando se discutia acesso a educação e à saúde em 1987 e 1988 no período da Constituinte e do tema geral da DEDICAÇÃO EXCLUSIVA.

Penso que isso precisa ser retomado sim. Porque tanto a saúde como a educação requerem mais e mesmo a legislação que permite mais de um vínculo também precisa ser reformada. Eu tendo a defender um vínculo somente e uma carreira única de estado para todas as profissões de nível superior indistintamente. Com vencimentos salariais isonômicos em todo o serviço público, em seus níveis, esferas e poderes. Assim,  também o tema da ISONOMIA NAS CARREIRAS PÚBLICAS deve ser retomado. O que vai impor também a construção de um fundo salarial e previdenciário único para todos os servidores.

Ora, isso que você sabe bem que envolve professores, médicos, juízes e diversos profissionais de nível superior. Para os profissionais de nível médio ou técnico também t6emos que pensar nisto. Não dá para termos um sistema em que o jogo de ganha ou perde é a loteria ou a corrida maluca do concurso público em carreiras mais valorizadas e não é valorizado o desempenho melhor de determinada função. Neste regime atual desperdiçamos recursos, remuneramos mal e de forma desigual trabalhadores qualificados por escolaridade comum mas com envolvimento, dedicação e desempenho diferenciados

Não dá mais para o estado brasileiro pagar o grosso da conta e transferir renda somente para as camadas superiores da sociedade que é o que tem acontecido neste nó das corporações no serviço público e nas formações das universidades federais. A mera reprodução de classe e a manutenção de privilégios também se perpetua assim, desta forma, e  tem que acabar em uma democracia como a que nós estamos construindo..    

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