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domingo, 14 de junho de 2009

resposta ao DAVID COIMBRA DA ZH sobre os professores

Da admiração e da maestria

Boa tarde David Coimbra

Devo te dizer que admiro muito teus textos e te considero um excelente escritor.

Não li ainda nenhum livro teu, mas vez ou outra, tenho sob os olhos tuas crônicas do jornal. Sempre atraído pelos títulos menos apelativos, devo confessar. E às vezes atraído pelos apelativos também. Quando a propaganda é excessiva talvez o produto não seja tão bom. Rsss.

Hoje pela manhã li tua narrativa confessional e de observação sobre a educação. O título Velhos mestres evoca bem aquilo que a gente sente com nostalgia e com aquele ar de admiração tardia pelos educadores que tivemos. É uma bela memória esta da experiência de formação, talvez a nossa gratidão aos nossos mestres seja sempre menor que o verdadeiro merecimento deles. Pois a gente vai descobrindo e retomando lições ao longo de toda uma vida. E algumas lições são repletas de sensibilidade ou de beleza muito mais do que de um conteúdo ou de uma regra especial.

Você falou no Brizola e eu devo admitir também que, apesar de algumas discordâncias pontuais com ele, eu sempre tive muito carinho e reconhecimento por sua figura corajosa e altiva. Tinha 14 anos quando ele voltou do exílio e balancei inclusive em ingressar no PDT mais tarde. Acabei no PT e na política estudantil iniciei a minha militância, fui liderança estudantil em minha cidade e já tive tarefas junto ao DCE, Diretórios acadêmicos e, por fim, já fui também dirigente do CPERS 1999-2005.

Minha mãe não era professora, mas era esclarecida e tem até hoje uma das letras mais bonitas que já vi escrita em papel. Assim compartilho com você, nestas linhas, também um sentimento de muita gratidão ao educadores que tive em casa, na escola e no mundo. Bem, imagino que tua mãe deva ter te ajudado muito na tua aprendizagem também. E que deva ter sido muito dolorosa a decisão de abandonar a sala de aula.

Hoje sou um Professor de Filosofia, casado com uma Professora de Matemática e não por acaso ou acidente, nos encontramos, os dois, em greve. Trabalho dez anos na rede estadual e tive uma pequena experiência na antiga Escola Técnica da UFRGS – a qual, aliás, a Mariza Abreu de passagem junto do Governo Federal em 1996, tratou de transformar em escola sem oferta de vagas para o ensino médio. Você deve saber ou imaginar bem porque faço greve e que, te garanto, não é por paixão partidária. Sou um militante, mas devo confessar que não gosto nenhum pouco de fazer greve. É um estado de tensão permanente, a gente tem insônia, a gente se preocupa muito e no final a gente recupera as aulas com muito sacrifício do nosso período de férias. Neste ano, por um acaso e um impulso apaixonado, estava com um trabalho intenso com as minhas turmas, nas disciplinas de Filosofia e Sociologia. E penso no sacrifício do desenvolvimento de meu trabalho que a descontinuidade das aulas pode provocar

Eu gostaria muito de expressar aqui algumas diferenças entre os governos que você citou em seu texto, no que toca ao tratamento dado ao magistério e à educação. Em vez disso quero somente te solicitar que imagine um pouco que a tua nostalgia um dia vai ser expressa pelos adolescentes que hoje são alunos da rede estadual. Pois quando estiverem fora de aula terão lembranças meritórias e muito agradáveis dos seus educadores. Já tive o prazer, e tenho certeza que muitos educadores tem o mesmo prazer e satisfação de reencontrar ex alunos embevecidos, agradecidos que reconhecem o nosso trabalho, a nossa dedicação e a importância das nossas pequenas e modestas lições.

Aliás, devo admitir que minha esposa é muito melhor do que eu e agora entro na razão pela qual estou realmente te escrevendo. Eu fico imaginando como as extraordinárias educadoras devem se sentir ao ler tua crônica. E penso que você forçou a mão. Poderia te indicar muitos educadores que merecem a nossa mais alta admiração e o nosso maior reconhecimento. Confesso que alguns deles estão em greve e alguns deles nunca fizeram greve ou, se fizeram um dia, já desistiram. E me preocupa você não tocar na dimensão positiva do trabalho de milhares de educadores que como a minha esposa, vão freqüentar a crônica de um saudoso aluno daqui a alguns anos, mas podem, se você gostar, já serem reconhecidos agora. Eles merecem tanto quanto os do passado e precisam agora. Até porque eles de uma forma ou de outra resistem a trabalhar com educação um tanto por gosto e um outro tanto porque afinal é uma profissão muito digna, apesar das dificuldades e da falta de reconhecimento corrente. O resultado do ENEM deste ano deveria evocar uma maior reflexão a respeito disto. Porque é de supor que uma valorização da educação e dos educadores vai resultar em melhores coisas para todos.

Aliás, quero agradecer o teu alerta de que a educação estadual está perto do fim. Mas eu vejo isto muito mais como uma conseqüência ruim de uma sucessão de maus governos do que como o resultado da luta ou das greves dos educadores. O ponto crucial aqui, no meu ver, é justamente a nossa situação política no estado. E a democracia, infelizmente, tem esta única desvantagem: a saber, assim como ela permite que Obamas e outros sejam eleitos, ela permite com que Buchs e outros sejam eleitos. Ou seja, podemos avançar num processo de afirmação da esperança e de democracia, assim como podemos retroceder elegendo governantes que provocam profundos retrocessos na sociedade e na gestão do estado. O Déficit zero está sendo alcançado com um sacrifício muito alto na educação, na saúde e na segurança – para não falar em meio ambiente e outros temas importantes em um estado sob gestão responsável.

Pois este problema que você aponta de buscar outros caminhos para a educação pública buscar suas melhorias é sim uma boa questão. Eu tenho uma sugestão sobre isso e outras coisas. Penso que nós precisamos muito mais apoio para começar. Não somente em salários, mas também em um debate franco e aberto em toda a sociedade sobre a educação que queremos construir. Mas não há uma receita para isso.

Penso que o instrumento de greve está sendo bem utilizado. O problema é que agora não querem que os educadores usem mais este instrumento. Porque agora este instrumento gera muito desconforto para um governo repleto de desconfortos. Devo te dizer que não há uma questão sequer apontada pelos educadores nesta greve em que eles não tenham razão. Basta você analisar as manifestações do sindicato e compará-las com as posições do governo. E o governo está completamente vazio de razões. Mas suponho que o jornal – como é de sua tradição – não vai permitir que um colunista seu tome posição contra este governo.

Te listarei alguns exemplos: a recuperação das aulas sempre foi ponto de acordo de final de greve. E este governo teve a oportunidade de ficar com uma greve de no máximo uma semana não fora isso. Aliás, a Yeda ia fechar o seu governo com a menor quantidade de dias parados, pois se negociasse o piso haveria uma alta possibilidade de não necessitarmos fazer greve mais no governo dela. O problema é como a Rosane disse em seu texto de domingo: o governo dá todas as condições para a greve acontecer. É uma comédia dos erros. Penso que isso entra no rol dos diversos erros deste governo. A sucessão de crises e de enfrentamentos do governo atual os está levando para aquilo que alguns autores chamam de cegueira de perspectiva. E a excessiva arrogância da governadora se manifesta cotidianamente. Isto é que está por acabar.

Muito Obrigado por tua preciosa atenção

Sem mais

Daniel Adams Boeira
São Leopoldo

21 de novembro de 2008

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